Comissão propõe registo de transparência obrigatório para as instituições europeias

Transparência Internacional diz que as alterações são “tímidas e de cosmética”, perdendo-se uma boa oportunidade para melhorar a ética europeia depois do caso Barroso.

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O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, quer apostar na transparência da UE Reuters/VINCENT KESSLER

A Comissão Europeia propôs esta quarta-feira criar um registo de transparência obrigatório que abranja as três instituições da UE — Parlamento Europeu, Conselho e Comissão -, endurecendo as regras de controlo do lobby e representação de interesses junto de Bruxelas. Mas a Transparência Internacional já veio considerar que as propostas são “tímidas e de cosmética” e que a CE perdeu uma oportunidade, depois do caso Barroso/Goldman Sachs.

Actualmente, a inscrição no registo de transparência é voluntário e vincula apenas a Comissão e o Parlamento europeus. E só a Comissão tinha já condicionado a realização de reuniões com os seus responsáveis políticos a quem estivesse inscrito nesse registo. Agora, apela-se a que os três pilares políticos da EU tenham normas em comum e que todas as reuniões com decisores políticos de qualquer das três instituições fiquem condicionadas à inscrição prévia no registo de transparência e, em consequência, ao respectivo código de conduta.

“As instituições da UE devem trabalhar em conjunto para reconquistar a confiança dos cidadãos. Os cidadãos têm o direito de saber quem procura influenciar o processo de tomada de decisões da UE”, justificou o primeiro vice-presidente da Comissão, Frans Timmermans. Com o registo prévio obrigatório, o comissário considera que “o público ficará a saber quem está a fazer lobby, em representação de quem e quanto é gasto nessa actividade”.

Segundo a nota da Representação da Comissão Europeia em Portugal, a proposta agora apresentada “clarifica o âmbito das actividades e dos organismos abrangidos, reforça o controlo e a aplicação efectiva do código de conduta para os lobistas e simplificará e melhorará a qualidade dos seus dados, através da racionalização das exigências em matéria de registo e de um melhor controlo da qualidade”. O não cumprimento do código de conduta por parte dos representantes de interesses terá sanções: a sua inclusão no registo poderá ser suspensa de forma temporária ou definitiva.

Em Portugal, está também em debate no Parlamento a regulamentação sobre o lobby – uma actividade que nem sequer é reconhecida no país, mas até agora apenas o CDS apresentou uma proposta concreta. Neste projecto de lei propõe-se a criação de um registo obrigatório para os representantes de interesses que queiram interagir com toda a administração central (governo e parlamento incluídos), assim como a administração regional e local. Mas o debate está ainda no início.

"Oportunidade perdida"

Para a Transparência Internacional (TI), as propostas agora apresentadas a nível europeu são “tímidas”. “Depois dos escândalos Kroes [a ex-comissária para a concorrência Neelie Kroes, que aparece referenciada no caso BahamaLeaks por ter sido directora de uma offshore quando estava em funções em Bruxelas] e Barroso, a Comissão tinha a oportunidade de provar o seu comprometimento com mais transparência e melhor ética. Apesar disso, surgem com mudanças tímidas e de cosmética”, diz Daniel Freund, chefe do gabinete jurídico europeu da TI.  

Segundo esta estrutura, a proposta da CE “falha os objectivos e é uma oportunidade perdida para aumentar a transparência do lobbying” e para tornar esta actividade mais “limpa”.

A Transparência Internacional recorda que cerca de 75 mil cidadãos assinaram a petição online a favor das propostas apresentadas por esta instituição durante o período de consulta pública e que a maioria das associações de lobistas europeus apresentou também uma carta conjunta a favor de um registo obrigatório e de uma reforma significativa que foi enviada para a Comissão em Junho.

De acordo com a TI, o Parlamento e o Conselho europeus “é onde começa a resistência à reforma”. “Até agora, os governos nacionais não aderiram ao registo voluntário e indicaram claramente que qualquer proposta que venha a incluir as representações em Bruxelas dos Estados Membros não seria motivo de debate”, acrescenta a nota da TI.

Por outro lado, acrescenta-se, “o Parlamento Europeu também optou por não tomar uma posição sobre o seu relatório de transparência”, acusando-o de “adiar indefinidamente a votação” que estava prevista para 12 de Setembro passado. Assim, “a fraca proposta da Comissão corre o risco de ser diluída ainda mais nas negociações com o Parlamento Europeu e o Conselho”.

Segundo Daniel Freund, “os cidadãos estão a exigir mais informação e fiscalização sobre a influência das empresas. Se as instituições europeias são sérias sobre a transparência, devem acender uma luz sobre o lobbying”.

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