Caso Isaltino: juiz ofereceu-se para fiscalizar listas eleitorais em Oeiras

Nuno Tomás Cardoso é magistrado em Sintra. Mas disponibilizou-se para fazer os turnos relativos ao processo eleitoral em Oeiras.

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Isaltino na apresentação da candidatura à Cãmara de Oeiras Miguel Manso

O juiz Nuno Tomás Cardoso é magistrado em Sintra, mas foi um dos que se disponibilizaram para trabalhar nos turnos relativos ao processo eleitoral autárquico. Podia ter dito que não queria ou devia fazer, podia ter escolhido qualquer um dos municípios que fazem parte da comarca – Sintra, Mafra, Amadora, Cascais e Oeiras – mas escolheu fiscalizar o processo eleitoral num dos concelhos onde tem ligações próximas ao actual autarca que se recandidata: Paulo Vistas foi padrinho de casamento do juiz que recusou as listas do candidato adversário Isaltino Morais.

Também se terá disponibilizado para Cascais, mas não foi preciso. De qualquer forma, a preferência inicial foi Oeiras. A razão do juiz, que não tem estado disponível para declarações, prender-se-à com a proximidade à sua residência. Apesar de também ter assegurado turnos eleitorais na Amadora e em Mafra, tal não aconteceu por se ter oferecido. Acabou por fazê-los porque era suplente em outros turnos, nesses tribunais, nas jurisdições de família e menores. Os turnos relativos ao processo eleitoral são excepcionais, uma vez que acontecem de quatro em quatro anos e representam uma carga adicional no trabalho dos juízes.

Nem todos os magistrados se disponibilizam para tratar os processos autárquicos, embora no final aqueles turnos tenham de estar preenchidos, dê por onde der. No caso, faz-se uma reunião, a questão é discutida, os juízes vão escolhendo os sítios para onde querem ser destacados, pode haver preferências por antiguidade e, no final, a escala fica feita. Nuno Tomás Cardoso disponibilizou-se para fiscalizar o processo eleitoral de 1 a 8 de Agosto, embora na altura em que as listas ficaram fechadas ainda não se soubesse exactamente a data das autárquicas. O que a lei estipula é que o sufrágio deve acontecer entre 22 de Setembro e 14 de Outubro, o que significa que, quando escolheu a primeira semana de Agosto, o juiz sabia que lhe podia calhar a verificação das listas. Mas não era certo.

Ao que o PÚBLICO apurou, em nenhum momento o juiz disse que conhecia o actual presidente de Oeiras (recandidato) e que foi o seu próprio padrinho de casamento. O Conselho Superior de Magistratura não teve acesso a esta informação quando aceitou a escala que lhe chegou às mãos. Caso contrário, podia ter-se encontrado outro colega para fazer aquele trabalho extra.

Critérios diferentes

Os turnos foram organizados entre Janeiro e Fevereiro, altura em que o antigo autarca de Oeiras, Isaltino Morais, ainda não tinha assumido que se recandidataria, o que só aconteceu em Abril. Apesar disso, em Dezembro já havia um grupo de cidadãos que se mexia para voltar a pôr Isaltino na corrida, que juntou milhares de apoios. Ou seja, a expectativa já era a de que Isaltino regressaria à política. Quanto a Paulo Vistas, no início de Janeiro já assumia que se recandidataria.

O juiz Nuno Cardoso está no centro da polémica não só por ser afilhado de casamento Paulo Vistas, mas por ter rejeitado a candidatura de Isaltino Morais, detectando irregularidades. A controvérsia aumentou ainda mais depois de o PÚBLICO ter noticiado que as questões processuais detectadas na recolha de assinaturas, agora levantadas pelo juiz para rejeitar as candidaturas independentes de Isaltino Morais e também de Sónia Amado Gonçalves, foram desvalorizadas em 2013 pelo mesmo magistrado, quando recusou um pedido de impugnação contra a lista Isaltino, Oeiras Mais à Frente (IOMAF) – lista que, na altura, integrava Paulo Vistas e Isaltino Morais, respectivamente para presidentes da câmara e da Assembleia Municipal.

Se na sentença desta semana o juiz alega que as folhas das declarações de propositura “não identificam em qualquer local do seu texto os cidadãos candidatos que integram a lista” e que a “única folha existente contendo a identificação dos candidatos é a que encabeça cada pasta das declarações”, em 2013, o mesmo magistrado escrevia que a ausência dessa lista no momento da recolha de assinaturas não levantava problemas.

Recorde-se que o actual autarca, Paulo Vistas, era o vice-presidente e braço direito de Isaltino, quando este liderava o concelho, antes de ter sido preso por fraude fiscal e branqueamento de capitais. Foi, aliás, na sequência dessa condenação que Vistas subiu à liderança do município. Agora, estão os dois frente a frente na corrida autárquica – isto se Isaltino conseguir resolver o imbróglio em que se viu metido desde terça-feira. O Conselho Superior da Magistratura já abriu um inquérito ao caso.

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