Bruxelas poderá ter uma palavra a dizer no negócio Altice-TVI

Autoridade da Concorrência pode ter que passar o dossier para a direcção-geral europeia se for tida em conta a dimensão do grupo Altice. ERC ficará apenas com a análise da venda das licenças de TV e rádio, sem fazer análise do mercado.

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Nelson Garrido

Os números da facturação ou a quota de mercado, mas também o perímetro das empresas do grupo Altice que se considera envolvidas no negócio são critérios fundamentais que irão determinar se a operação de compra da Vertix/Media Capital pela Meo/PT/Altice vai ser analisada pela Autoridade da Concorrência (AdC) e pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC). Ou se, pelo contrário, o dossier segue para Bruxelas para o crivo da Direcção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DG-COMP).

Nem Bruxelas, nem a Autoridade da Concorrência nem a ERC se querem pronunciar sobre quem tem competência para analisar o dossier. Se o negócio for para Bruxelas, a avaliação da ERC limitar-se-á ao domínio da transmissão das licenças de televisão e de rádio, sem fazer a análise quantitativa e qualitativa de mercado nem o parecer vinculativo que tem quando o negócio é analisado pela Concorrência nacional. Ao grupo que detém a plataforma de TV, net e telefone Meo e explora a Televisão Digital Terrestre, juntam-se agora o canal de TV de maior audiência (cliente da PT na TDT), meia dúzia de rádios, publicações digitais e em papel e uma produtora de audiovisuais.

O PÚBLICO sabe que na Autoridade da Concorrência há a forte expectativa de que o negócio vá mesmo para Bruxelas, tendo em conta que a compra da PT pela Altice, há dois anos, acabou por ser da total competência da Concorrência europeia. Na altura, a Altice considerou que o negócio tinha dimensão europeia e notificou a DG-COMP. A Concorrência portuguesa considerou que era responsabilidade sua, pediu a Bruxelas a remessa do processo, mas esta recusou e foi lá que acabou por ser decidido o aval.

O primeiro passo deste processo de escrutínio não é dos reguladores. O porta-voz da DG-COMP disse ao PÚBLICO que é a empresa compradora que analisa, prepara o dossier e notifica o regulador. Porque “a obrigação de notificação está dependente dos tais critérios do volume de negócios e da quota de mercado das empresas envolvidas e esses são dados que nem sempre são públicos”.

Não há prazos para a notificação mas se esta não for feita e o regulador entender que se trata de empresas que encaixam nos critérios, estas serão notificadas e multadas. Para as empresas que iniciam o processo, terão que esperar até à decisão do regulador para concretizar as concentrações.

Para ser classificada como tendo “dimensão comunitária”, o negócio tem que envolver um “volume de negócios total realizado à escala mundial pelo conjunto das empresas em causa superior a 5 mil milhões de euros”. E, ao mesmo tempo, “o volume de negócios total realizado individualmente na EU por pelo menos duas das empresas em causa ser superior a 250 milhões de euros, a menos que cada uma das empresas em causa realize mais de dois terços do seu volume de negócios total na UE num único Estado-membro”, descreveu ao PÚBLICO a AdC. A outra forma de calcular se o negócio tem dimensão europeia envolve a presença das empresas em pelo menos três Estados europeus, que é algo aqui fora de causa.

A questão fundamental será saber se a Altice, que apresentou a “oferta vinculativa” à Prisa, como esta última comunicou à CMVM, é considerada ou não como estando no âmbito das “empresas em causa”. No contrato de compra e venda está definido que a Prisa vende à Meo os 94,69% do capital que detém na Media Capital. Se a Altice for incluída neste perímetro, então Bruxelas fica mesmo com o dossier porque o grupo facturou 23,5 mil milhões de euros em 2016; se a DG-COMP considerar que as empresas envolvidas são apenas a Meo e a Media Capital, então os cerca de mil milhões de euros de facturação da primeira e os 174 milhões da segunda não chegam para cumprir os critérios europeus.

Há vários anos que o mercado falava na possibilidade de venda da Media Capital. Em 2010, a Autoridade da Concorrência opôs-se ao negócio de compra de 35% da Media Capital pela Ongoing, depois deste grupo não ter conseguido vender a participação que detinha na Impresa. Esta venda tinha sido a condição exigida pela ERC antes de a Ongoing entrar na Media Capital. Neste mesmo ano, a Assembleia da República fez uma comissão de inquérito ao negócio de compra (não anunciado) da TVI pela PT que envolveu acusações de controlo político da estação.

Depois de ter lançado a actual TVI (depois da versão católica inicial) em 1998 e de ter vendido a Media Capital à Prisa faseadamente entre 2005 e 2007 (num encaixe total de 308 milhões de euros), o empresário Miguel Pais do Amaral voltou a comprar 10% da empresa no início de 2011 por 35 milhões de euros com a opção de comprar mais 20%. Dois anos depois, preferiu voltar vender a sua quota mas manteve-se na administração. Com Ana Brito

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