Aprovada a comissão de inquérito ao Banif, começou a guerra pelo chumbo da auditoria

No debate, PSD garantiu querer investigar “tudo e todos, doa a quem doer”. Esquerda argumentou que a direita pretendia adiar e atrasar os trabalhos da comissão de inquérito à espera dos resultados da auditoria.

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Negoceiam-se novos prazos para privados injectarem 450 milhões Pedro Martinho

A esquerda chumbou o projecto de resolução do PSD que determinava a realização de uma auditoria externa e independente à gestão do Banif, às medidas de recapitalização, à resolução e venda do banco. Já a comissão de inquérito sobre o processo que conduziu à venda e resolução do Banif proposta em comum por PS, BE, PCP e PEV foi aprovada, esta quinta-feira no Parlamento, por unanimidade.

Apesar de PSD e CDS terem dado o seu acordo à proposta da constituição da comissão de inquérito da esquerda, viram chumbadas as suas propostas de inquérito em separado e PSD não gostou de ver recusada a auditoria, que usou como arma de arremesso contra a esquerda.

Ainda não começou a esgrima na comissão de inquérito, que deverá ainda levar várias semanas (a do BES demorou dois meses até à primeira audição), e já se cavou o fosso a meio do plenário entre PSD/CDS e a esquerda. Os argumentos dos dois lados já tinha sido trazidos para o plenário na discussão dos quatro diplomas – um projecto de resolução sobre a auditoria e as três propostas de comissão de inquérito -, mas os ânimos exaltaram-se a sério depois da votação, durante as declarações de voto orais, e a sala foi tomada por gritos constantes dos dois lados.

O centrista João Almeida disse ter votado a comissão da esquerda, embora o texto seja “desrespeitador” do Governo que integrou. “Confrontamo-nos hoje aqui com uma facção que só está disponível para discutir as perguntas que faz porque já sabe as respostas que lhes vai dar.” O socialista João Galamba pediu “respeito pelo Parlamento e pelo trabalho dos deputados” e defendeu a recusa da auditoria com o facto de não querer “substituir a comissão de inquérito por uma avaliação externa”.

Para António Leitão Amaro (PSD) a esquerda começa de forma “arrogante”, com “sectarismo e manchando a imagem do Parlamento”, e receia que “não seja o princípio de um processo sério, mas antes de um exercício de manipulação em que as respostas querem ser dadas antes das perguntas serem feitas”. O comunista Miguel Tiago devolveu as acusações e acusou o PSD de pretender condicionar os temas da comissão, ao passo que a bloquista Mariana Mortágua defendeu o âmbito “mais abrangente” da proposta da esquerda, disse que a direita queria manipular a comissão com a auditoria e apagar toda a história do anterior Governo com o Banif, fazendo-se de “vítima”.

Antes, na apresentação da proposta do PSD de criação da comissão de inquérito, Leitão Amaro defendeu que a comissão de inquérito ao Banif “possa investigar tudo e todos, sem tabus e sem reservas, doa a quem doer” – “e ninguém compreenderia que alguém a recusasse, como se tivesse algo a esconder”. O PSD quer escrutinar a “actuação das administrações do Banif, dos supervisores, em especial o Banco de Portugal (BdP), dos governos sem excepção, e das instituições europeias”.

“Queremos investigar todos os factos relevantes, nada deve escapar ao escrutínio e nenhuma responsabilidade pode ser abafada”, defendeu o deputado que deixou uma longa lista de dúvidas a que a comissão deve responder – da resolução à factura, do funcionamento da supervisão às ordens das instituições europeias. Pediu um “esforço total de esclarecimento e de cooperação institucional acima dos interesses partidários”.

O comunista Miguel Tiago encontrou, no entanto, uma lacuna na intervenção e nas dúvidas de Leitão Amaro: “Omitiu de forma deliberada que o antigo Governo deu aos banqueiros do Banif mais de mil milhões de euros, nada fez para reaver uma parte, e demitiu-se de acompanhar o banco.” Aproveitou para insistir que a solução é “o controlo público da banca”.

O socialista João Galamba seguiu-lhe o caminho: PSD/CDS “empurraram o caso com a barriga durante três anos, aumentando os custos e desvalorizando os activos”, “meteram lá o dinheiro e esconderam o processo negocial com a Comissão Europeia e os prazos que esta foi definindo”. “Ficava-lhe bem reconhecer esses factos.”

A bloquista Mariana Mortágua pegou nas perguntas de Leitão Amaro e devolveu-lhas, acrescentando todos os passos dados ou que o deveriam ter sido durante o Governo PSD/CDS, apontando: “Às perguntas deste debate quem tem que responder são vocês.”

“Propõe uma auditoria externa que não tem tempo para chegar ao fim durante o prazo da comissão, para a esvaziar e adiar à espera das conclusões”, acusou a deputada, prometendo que uma auditoria será a primeira proposta do BE na comissão. “Não podemos continuar a assistir ao jogo infantil de ver o BdP atirar culpas para a Comissão Europeia, esta para o antigo Governo, este para o actual Governo, o Banif a dizer que a culpa é do BdP. É um passa-culpas que, quando chega ao fim, ninguém dá a cara.”

O social-democrata Duarte Pacheco pegou na recusa à auditoria externa independente para dizer que os partidos que suportam o Governo não ver as responsabilidades políticas. “De que têm medo? O que querem esconder ou salvaguardar?”, questionou. Também defendeu que os deputados que já têm conclusões devem pedir escusa de participar na comissão de inquérito, apontando o dedo ao socialista Carlos Pereira, que fizera duras críticas ao anterior Governo, incluindo a de que PSD e CDS “esconderam o apodrecimento do Banif”.

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