Autárquicas: há uma mão invisível de Jardim a abanar o PSD-Madeira?

Habituado a ganhar as 11 câmaras municipais do arquipélago, o PSD-Madeira foi surpreendido em 2013 quando perdeu sete municípios. Para Outubro, multiplicam-se as candidaturas de militantes sociais-democratas que concorrem contra o partido.

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Sombra de Jardim continua a assombrar actual liderança do PSD-Madeira e do governo regional Daniel Rocha

Quando em Janeiro deste ano, no encerramento do XVI Congresso do PSD-Madeira, Miguel Albuquerque desafiou a crítica interna a sair do anonimato e a dar a cara, estaria longe de imaginar que em Outubro teria de enfrentar tantos rostos conhecidos do partido nas eleições autárquicas.

Só na Ribeira Brava, a oeste do Funchal, um dos bastiões sociais-democratas, são três os candidatos da área "laranja". O actual presidente, Ricardo Nascimento, que foi uma escolha de Alberto João Jardim em 2013, não mereceu a confiança de Albuquerque, que avançou com Nivalda Gonçalves na corrida. Nascimento não gostou. Reuniu apoios entre os militantes locais e já formalizou uma candidatura independente.

Para complicar ainda mais esta matemática, que à partida teria naquele concelho uma conta certa e favorável ao PSD, Luís Drumond, antigo deputado regional no tempo de Jardim, entregou o cartão de militante e entrou na pré-campanha com as cores do Juntos Pelo Povo (JPP).

A Ribeira Brava é um pequeno município, com cerca de 14 mil eleitores, sete mil dos quais votaram nas últimas autárquicas, quando o PSD ganhou (41,6%) com 20 pontos de avanço sobre o PS. É pequeno, mas é sintomático do momento que os social-democratas atravessam no arquipélago em ano eleitoral, a que não será alheia a "mão invisível" de Jardim.

É que o desafio deixado por Albuquerque no congresso tinha um claro destinatário: o antigo líder madeirense, que nunca escondeu que o actual presidente do PSD-Madeira não era o nome que desejava para a sucessão.

Jardim nega qualquer interferência, e é verdade que, tirando uma ou outra intervenção pública, tem-se remetido ao silêncio sobre a vida interna do partido que liderou com mão de ferro durante quatro décadas. Mas, através de um blogue anónimo, que foi buscar o nome Renovadinhos ao lema ("Renovação") da campanha de Albuquerque nas internas de 2014, as críticas à actual liderança e ao governo regional não só são diárias, como são decalques do argumentário política usado durante anos pelo antigo presidente madeirense. As expressões utilizadas, os alvos escolhidos, a ironia… Tudo é muito familiar.

Coincidência ou talvez não, além da Ribeira Brava existem mais concelhos onde o PSD de Albuquerque concorre contra um PSD mais jardinista. No Porto Santo, uma ilha tradicionalmente incerta para o partido, liderada desde 2013 por um independente apoiado pelo PS, Filipe Menezes de Oliveira, o partido indicou o social-democrata Idalino Vasconcelos, actual presidente da junta de freguesia local. Um nome que reúne consensos e agrada à população, mas que, além de Menezes de Oliveira, vai enfrentar António Castro, figura próxima de Jardim e presença habitual nas sempre polémicas passeatas do antigo governante pelo areal da ilha.

Castro, que liderou durante o jardinismo a associação comercial daquela ilha, encabeça agora um movimento cívico, e é mais um dos rostos da divisão interna num partido habituado a ganhar as autárquicas por 11 a zero.

Existem outros. No Porto Moniz, no norte da Madeira, um ex-presidente da câmara do tempo de Jardim, Gabriel Farinha, vai avançar como independente à revelia do partido, que apostou em Rui Nélson para recuperar uma autarquia perdida há quatro anos para o PS.

Ao lado, em São Vicente, onde o PSD apoia o ex-militante José António Garcês que em 2013 conquistou a autarquia como independente, em colisão com Jardim, já se ensaiou uma candidatura ligada a outras sensibilidades do partido, que seria encabeçada por Maria João Monte, antiga administradora do Serviço Regional de Saúde.

Em Santa Cruz, casa do JPP, também apareceu uma protocandidatura, com Agostinho Alves líder da concelhia local do PSD a aparecer em vários cartazes pelo concelho, que foram entretanto retirados. Alves negou a autoria e, mais recentemente, anunciou a demissão da concelhia, dizendo que só voltaria à política activa a 2 de Outubro.

Albuquerque tem repetido, nos encontros com militantes, que o objectivo de Outubro é recuperar a maioria das câmaras municipais – em 2013 consegui apenas quatro das 11 – e voltar a liderar a associação de municípios regional. Mas seja pela sombra de Jardim, seja por não ter ainda conseguido congregar as várias fações que saíram da discussão interna à volta da sucessão, ou ainda pela erosão que o governo tem sofrido, à conta de dossiers como a saúde e os transportes marítimos e aéreos, os próximos meses vão exigir muito da máquina "laranja", que se habituou a ser um rolo compressor eleitoral nos últimos 40 anos.

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