Analistas de Angola dizem que não há nenhuma crise bilateral com Portugal

"Portugal e Angola não estão de costas voltadas", considera o analista político Belarmino Van-Dúnem. O brigadeiro Correia de Barros acredita que os dois Estados vão "chegar a uma plataforma".

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Cavaco Silva e José Eduardo dos Santos juntos em Lisboa em 2009 Enric Vives-Rubio

A suspensão da construção da parceria estratégica com Portugal, anunciada terça-feira em Luanda pelo Presidente José Eduardo dos Santos, não vai afectar as relações bilaterais, que continuam bem, defenderam analistas angolanos contactados pela Lusa.

Para o analista político Belarmino Van-Dúnem, as relações entre os dois povos e entre os dois Governos, do ponto de vista institucional, "nunca estiveram tão boas como agora". "O actual Governo português é um dos que melhor relacionamento tiveram com o executivo angolano", defendeu.

Belarmino Van-Dúnem destacou ter sido com o Governo de Pedro Passos Coelho que foi feito um acordo de facilitação de entradas de cidadãos em ambos os países, que enfrentou a crise na Guiné-Bissau, e garante apoios para o lugar de membro não-permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas e nas relações coma União Europeia. "Portugal e Angola não estão de costas voltadas", frisou.

A mesma opinião tem o brigadeiro Correia de Barros, vice-presidente do Conselho Executivo do Centro de Estudos Estratégicos de Angola (CEEA), que frisou o facto que José Eduardo dos Santos não ter anunciado o fim da parceria estratégica, mas sim a suspensão da sua construção. "Estou convencido que vai atrasar algum bocado, mas tenho esperança que os dois Governos consigam chegar a uma plataforma e andar para a frente com isto. É bastante importante para ambos, com benefícios para os dois lados", considerou. Todavia, Correia de Barros defende a "urgência" da resolução dos problemas que existem para se avançar na parceria.

"Não acho que [os problemas] sejam ao nível das populações. Antes pelo contrário, há uma amizade muito grande entre angolanos e portugueses. A forma como convivem, como pensam. Há muita coisa em comum, apesar do passado histórico que foi dramático, isso está perfeitamente ultrapassado", adiantou. Afirmando-se "optimista" na continuidade do relacionamento bilateral, Correia de Barros diz não ver "razões nenhumas para que possa descambar, porque não é do interesse de ninguém".

Belarmino Van-Dúnem acredita existir "uma desvantagem, do ponto de vista da imagem", de Angola em Portugal, com os investimentos angolanos a sofrerem os efeitos de vários tipos de discriminação negativa em Portugal, fruto de campanha deliberada de uma parte da cúpula portuguesa".

Por essa razão, "não é aconselhável manter a parceria estratégica porque ela não o é de facto", mas as relações políticas, culturais, económicas e diplomáticas devem continuar, com as duas partes a deverem trabalhar em conjunto, encontrando os mecanismos e as estratégias "eficientes e eficazes para retomar" a parceria. Quanto às fugas no segredo de justiça em Portugal, Belarmino Van-Dúnem lamenta, mas relativiza-as, por ser uma situação que se verifica noutros países.

"Há outro investimento estrangeiro maior que o angolano em Portugal, como o brasileiro ou o chinês, e ninguém fala desses", acentuou. "É normal os portugueses preocuparem-se mais com os angolanos e vice-versa, o que demonstra os laços de afinidade entre os dois povos. O português não quer saber dos outros, mas sim de Angola", salientou. Por essa razão, defende, os dois Governos "têm de aproveitar esta empatia mútua para desenvolver as relações a todos os níveis".

Terça-feira, no discurso sobre o Estado da Nação, o Presidente José Eduardo dos Santos lamentou as "incompreensões ao nível da cúpula", pelo que, dado o "clima político actual" na relação bilateral, "não aconselha a construção da parceria estratégica antes anunciada".
 

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