A “transacção judicial” que se instalou na política portuense

Meio ano depois da eleição de Moreira, o diferendo entre a Selminho e a Câmara do Porto saiu dos tribunais e a sua sorte caiu num acordo extrajudicial. Com Rui Moreira dos dois lados da barricada, a polémica estalou

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Os terrenos foram expropriados pela câmara em 1949 DR

O processo da Selminho, empresa detida pela família do presidente da Câmara, Rui Moreira, entrou na actualidade em Julho do ano passado e tornou-se um eixo fundamental das movimentações políticas no Porto. Rui Moreira, sócio da Selminho e presidente da autarquia que vai ter de decidir sobre a atribuição de uma licença de construção ou de uma indemnização à sua família, considera-o “um caso típico da campanha que aos poucos se vai esgotando”, mas a Oposição manifesta uma visão diametralmente oposta. Para o PSD, o que está em causa é “uma questão política grave”. E a CDU foi mais longe, pedindo ao Ministério Público o esclarecimento de indícios de “irregularidades e/ou ilegalidades potencialmente graves”.

Depois de adquirir um terreno na zona da Arrábida, a Selminho conseguiu obter um direito de construção através de um despacho positivo a um Pedido de Informação Prévio. Nessa altura, o Plano Director Municipal, que nos seus artigos 41 e 42 proibia a construção em zonas de escarpa (o terreno da Seminho fica perto da Ponte da Arrábida), estava suspenso e quando um novo plano foi aprovado, a proibição manteve-se. Perante a negação de direitos atribuídos, a empresa avança para tribunal. A autarquia procura argumentos para manter a recusa, mas em 2012 começa a mudar de opinião. Na Primeira Alteração ao PDM de 2006, os serviços de urbanismo admitem rever a proibição de construção na escarpa. Mas essa mudança apenas poderia acontecer quando todo o plano fosse objecto de revisão.

Perante os sucessivos adiamentos, sem que se vislumbrasse uma data exacta para a revisão do PDM, o tribunal, diz Rui Moreira, forçou uma solução. E poucos meses depois de tomar posse, a Câmara (representada pela vice-presidente, Guilhermina Rego), assina uma “transacção judicial” com a Selminho que põe fim à acção no tribunal. Nessa transacção, fica estabelecido que a autarquia se “compromete” a alterar a qualificação do solo na futura revisão do PDM para poder avançar com a construção; e na eventualidade desse compromisso não ficar consagrado, seria constituído um tribunal arbitral, com um juiz nomeado pelas duas partes, para atribuir uma indemnização. Para evitar que Rui Moreira presidente e Rui Moreira proprietário escolhessem o árbitro, a Câmara anunciou que ia pedir ao Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a indicação de um magistrado para presidir ao tribunal.

Para a Oposição, esta transacção judicial é injustificada porque, diz a CDU, “confere à Selminho direitos que não tinha”. Rui Moreira explica que da parte da autarquia houve apenas a assunção de compromissos anteriores e que o acordo para uma solução extrajudicial se justifica pelo interesse de evitar o pagamento de indemnizações.

Os atrasos na aprovação de um novo PDM, que estava prevista para o final de 2016, obrigaram entretanto à redacção de adendas à transacção. O que estava estipulado na primeira versão do acordo é que o tribunal arbitral poderia ser convocado caso essa data não fosse cumprida. A Selminho, porém, preferiu congelar o pedido de indemnização e propôs o prolongamento dos prazos para Março de 2018. A carta da Selminho é enviada três dias antes da data da informação dos serviços municipais, onde se afirma que qualquer “operação urbanística” nos terrenos propostos carece da desafectação dos terrenos do domínio público. Mas a resposta da autarquia é posterior. Tem a data de 30 de Dezembro.

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