3x6=18, Guterres fora, nada

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É um homem que continua a fazer brilharetes com os seus números. Pouco antes de ser primeiro-ministro, em 1995, pôs o país em modo de alerta Nuno Crato (salvo seja) ao explicar os 6% que ia reservar para a Saúde [segue transcrição expressiva do vídeo original]:

— Ahhh... O Produto Interno Bruto são cerca de três mil milhões de contos, seis por cento de três mil milhões são... três vezes seis, 18... [tu aí ao lado, confirmas-me que é 18?] ahhh... um milhão e... ahhh um milhão e... [eu disse um milhão para quê, se já me perdi?] portanto, enfim, o melhor é... é fazer a conta.

Até hoje não sabemos o que ele queria dizer com isto. Nem interessa, o passado e o futuro de um homem não são favas contadas, não se joga a feijões. Sabemos que nasceu em Lisboa a 30 de Abril de 1949, que tem 65 anos. Foi militante do PS desde o ano da fundação, 1973, mas não se meteu em lutas políticas directas contra o regime, apenas na Acção Social Católica. Depois da revolução, fez-se secretário de Estado da Indústria logo no I Governo Provisório, e no II e no III. Naturalmente, a seguir viria o IV, só que este executivo provisório era já chefiado pelo Vasco Gonçalves das nacionalizações e ahhhh... é fazer as contas. Guterres foi-se embora.

Quarenta anos depois — mais exactamente, na semana passada — Guterres escreve no quadro de honra da carreira um dos seus números mais impressionantes, uma equação ao quadrado: visita “o amigo” José Sócrates na prisão e a única declaração que faz à porta é a única que importa: definitivamente, não é candidato a Presidente da República, deixando-nos a pensar se também visitaria o “preso 44” se agora fosse candidato pelo PS, ahhh... é só fazer as contas. Foi aí, numa cela limpa de botas proibidas, que os dois falaram de homem para homem. De engenheiro electrotécnico do Instituto Superior Técnico para engenheiro técnico formado a um domingo numa universidade manhosa entretanto extinta por falta de qualidade e fraudes em barda. Sócrates poderá ter-lhe explicado a importância de um perseguido político só usar envelopes com dinheiro porque os bancos não são de confiança, enquanto Guterres lhe diria quantos quilos de farinha cabem num saco de juta para alimentar refugiados políticos a sério.

Mas foi com estes números rabiscados num muro de Évora que Guterres obrigou António Costa a somar, a multiplicar-se em iniciativas para menorizar as presidenciais. A falar mais alto sobre a importância das legislativas. E a fazer de conta que não está preocupado com a pasmaceira em que deixou cair a oposição do Partido Socialista desde que chegou à liderança, mais uma vez é fazer as contas.

António Manuel de Oliveira Guterres foi eleito primeiro-ministro em 1995, ganhando ao candidato do PSD, Fernando Nogueira. Não foi assim tão difícil, uma vez que o antecessor de Nogueira, Cavaco Silva, já tinha reduzido a zero o valor político do seu mais fiel sucessor, desprezando publicamente Nogueira. (A explicação para tão simpática traição é que Cavaco Silva nunca foi político em mais de 35 anos de política activa. Cavaco, no entanto, parece que sabe fazer contas. Menos quando se trata de explicar como é que se troca uma casa de cerca de 300 mil euros por outra que vale cerca de dois milhões, sem se ganhar nada com isso. Ou como é que um futuro Presidente ganha dinheiro com a venda de acções de um banco de bandidos e, quando a coisa se sabe, e o resgate do banco é pago pelo país, o Presidente não devolve o dinheiro ao país, mas estamos aqui para falar de quem?, ordem nesta biografia!)

As conta mais apetitosas de António Guterres foram quando, no segundo mandato (sem maioria absoluta por um triz) do PS, comprou uma grande bola de queijo do Minho: Daniel Campelo, do CDS e de Ponte de Lima, o “deputado do queijo limiano”. Aprovou-se o Orçamento do Estado vendendo um pacote de promessas como a manutenção de uma fábrica em Ponte de Lima — ahhhh... é fazer as contas —, mas, desde então, o poder de Guterres começa a ser cortado às fatias. Derrete como fondue de queijo. E dessa pasta derretida nascerá o célebre “pântano democrático”. Nas eleições autárquicas de 2001, o primeiro-ministro aparece em directo na televisão para dizer que se vai embora nessa mesma noite porque o partido perdeu muitas câmaras municipais, uma versão guterriana de qual é a relação entre a feira de Borba e o cu das calças. E deixava, no coração dos socialistas, a sensação duradoura de que ele deixava o país entregue aos bichos e aos santanas. E aos durões que amolecem o biscoito do seu amor à pátria logo que os convidam para beber chá no estrangeiro.

António dedicou estes últimos anos à protecção dos refugiados na ONU. Mas os socialistas continuaram à espera, de malga estendida, sem tenda para se abrigarem nas últimas noites do cavaquismo e coelhismo. Nada feito: a Belém, Guterres prefere o Corno de África... Tem a possibilidade de chegar a secretário-geral da ONU. E de não mais aturar pântanos molhados ou secos em Portugal.

Ahhh... e há as variáveis como a embaixadora Angelina Jolie, que tem 91-68-91, ora três vezes seis, dezoito, ahhh, é só fazer as contas humanitárias.

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