2016: um ano de despedidas e mudanças

Cavaco Silva e Paulo Portas deixam a ribalta. PSD e PCP também têm debates internos importantes. Nos próximos meses, a justiça vai ter vários encontros com a política.

Com a despedida de Portas e Cavaco, Passos torna-se no último resistente dos exigentes anos da troika Daniel Rocha

Quis o destino que dois dos mais persistentes políticos da nossa era, Aníbal Cavaco Silva e Paulo Portas, se afastassem na mesma semana. O Presidente – aconteça o que acontecer nas eleições de 24 de Janeiro – passa o testemunho no dia 9 de Março. O histórico líder do CDS, que esteve à frente do partido 16 anos, entrega o gabinete do Largo do Caldas quatro dias depois, no dia 13, o último dia do 26º congresso.

Só a história que Cavaco e Portas protagonizaram já seria suficiente para sublinhar este duplo “adeus”. Nas várias personagens públicas que interpretaram desde os anos 80 – Portas como director do Independente, primeiro, e como líder de uma direita anti-cavaquista depois; Cavaco como primeiro-ministro e líder de um PSD hegemónico no centro-direita – os dois ajudaram a definir o panorama político actual. Sobretudo depois do entendimento que os uniu, nos últimos tempos.

Com a despedida de ambos, Pedro Passos Coelho torna-se no último resistente dos exigentes anos da troika. A sua liderança do PSD, até aqui pouco questionada, pode ser a principal incógnita do ano.

O resultado das presidenciais, que é o primeiro dos grandes acontecimentos deste ano, pode ditar alguma agitação no partido que tem o maior número de deputados no Parlamento. Vários analistas têm sublinhado que existe uma convergência estratégica entre o candidato do centro-direita, Marcelo Rebelo de Sousa, que lidera as sondagens, e o primeiro-ministro socialista António Costa. A ambos pode interessar uma mudança no PSD que privilegie um maior “centrismo”.

Para já, as presidenciais são um teste, sobretudo, a António Costa. Ao querer manter-se “equidistante” numa eleição de primeira linha, o primeiro-ministro arrisca talvez demasiado. Se nenhum dos candidatos, Nóvoa e Belém, entre quem o PS divide os apelos ao voto e os suportes de outdoors espalhados pelo país, conseguir forçar uma segunda volta, Costa torna-se automaticamente num dos derrotados da noite de 24 de Janeiro.

A “equidistância”, para mais, é vista como retórica. As principais figuras do Governo e da direcção de Costa estão com Sampaio da Nóvoa. O que deixa o primeiro-ministro duplamente em risco, caso Maria de Belém seja a candidata preferida dos eleitores de esquerda.

A solidez do apoio parlamentar ao Governo é, apesar de tudo, a mais evidente das medidas do êxito, ou do fracasso, de Costa. São vários os sinais de que o problema pode estar onde menos se esperava. Não na relação do PS com os seus parceiros, mas entre o PCP e o BE. O debate entre os candidatos à Presidência apoiados por estes dois partidos, Edgar Silva e Marisa Matias, deixou transparecer que já vão longe os tempos da troca de elogios e de uma cordialidade quase indiferente. Desta vez, até houve comunicados do PCP a lembrar votações dos eurodeputados do BE sobre a Líbia.

António Costa e o seu secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, terá um exercício diplomático difícil, ao longo de 2016. Porque além das (muitas) interrogações económicas que o ano promete, existe uma marcação cerrada entre os partidos que têm na mão a possibilidade de fazer cair o Executivo.

O Orçamento do Estado será o primeiro teste a sério, depois de uma partida em falso da nova maioria, que se desentendeu no rectificativo que possibilitou a ajuda do Estado ao Banif.

No final do ano, em Dezembro, o PCP também terá o seu congresso. Existem alguns sinais de que este pode ser também o ano em que Jerónimo de Sousa se despede da liderança. O secretário-geral, de 68 anos, que sucedeu a Carlos Carvalhas em 2004, tem repetido nos últimos dias que se sente com vontade de continuar. Mas dentro do partido, o próximo ano pode trazer clivagens quanto à avaliação dos benefícios de um apoio ao Governo minoritário do PS.

Desse ponto de vista, Catarina Martins e o BE têm a vida mais facilitada. Desde logo porque a situação interna, depois de um 2015 agitado, se estabilizou com os bons resultados eleitorais.

No ano em que se comemoram 40 anos da Constituição da República e 30 anos da integração europeia, estas são algumas das interrogações que se colocam à política portuguesa e à sua capacidade de regeneração. Sobretudo quando, em paralelo, vários “casos de regime” se acumulam nos tribunais. A acusação prometida ao ex-primeiro-ministro José Sócrates é, talvez, o principal desses casos. Não esquecendo, também, os vários processos resultantes da “bancocracia”, em que Ricardo Salgado é o principal rosto sob escrutínio. 

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