“Não há uma comunidade portuguesa no Luxemburgo, há muitas”

Francisco Sassetti trabalhou no CCB com Mega Ferreira, e dali seguiu para a Filarmónica Jovem de Viena. É programador musical da Philharmonie Luxembourg para as áreas do Jazz e Músicas do Mundo desde 2015. Tem 34 anos.

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Viveu quase metade da sua vida no Luxemburgo (dos 4 aos 17 anos). Estudou Musicologia, Gestão de Artes e Política Cultural em Londres, e fez o mestrado em Estudos Europeus na Suíça. Viveu em Portugal “por absoluta convicção” entre 2006 e 2012, trabalhou no CCB com Mega Ferreira, e dali seguiu para a Filarmónica Jovem de Viena. É programador musical da Philharmonie para as áreas do Jazz e Músicas do Mundo desde 2015. Tem 34 anos.

“Eu sei que não sou o único a dizê-lo: há um clima positivo, optimista em Portugal que é alimentado pela vitória no Europeu de futebol e na Eurovisão, todo o sucesso económico dos últimos meses, pela eleição do secretário-geral das Nações Unidas.

Vivemos um período em que o país estava desanimado, fizemos uma travessia do deserto muito complexa – todos conhecemos alguém que ficou em situação muito difícil -, anos em que houve imensa emigração. Agora, é impossível não estarmos entusiasmados com esta dinâmica e este ambiente muito mais positivo em Portugal e entre os portugueses. Se calhar isso fomenta os sucessos, mas temos também alguma tendência para ser um bocadinho eufóricos.

Não há uma comunidade portuguesa no Luxemburgo, há muitas comunidades diferentes. Tenho conhecido muitas pessoas que vieram nos últimos cinco anos, algumas nos últimos dois anos, e que não tinham qualquer ligação anterior ao Luxemburgo. Vieram trabalhar. E não é porque não tivessem trabalho em Portugal, mas porque era mais vantajoso, fazia sentido para as suas carreiras. Trabalham nas instituições europeias, em bancos, têm formação superior, pessoas na casa dos 30 e 40 anos.

Hoje a emigração portuguesa é muito mais diversificada, tanto é a pouco qualificada como a altamente qualificada, e isso também dá uma imagem muito diferente do país.

Na Philharmonie defendemos que temos de mostrar aquilo que se faz de bom em português, devido à amplitude das comunidades de língua portuguesa no Luxemburgo. Não só o que se faz em Portugal, mas também no Brasil, em Cabo Verde, países dos quais também há grandes comunidades.

Claro que temos de ter um bom espectáculo de fado, porque atrai muito público – e não só português -, mas também integrar outros géneros menos conhecidos, dentro destas áreas do Jazz e das Músicas do Mundo. Por isso organizámos em Outubro passado – e vamos repetir este ano – o festival Atlântico. É possível que um dia traga Salvador Sobral ao Philharmonie. A irmã, Luísa Sobral, já cá esteve, em 2014, e teve imenso sucesso.

Temos um foco muito específico em alargar a outros públicos, não apenas da música clássica. Mas esse é o lado mais complicado desta actividade: conseguir chegar a pessoas que não têm prática cultural. Não temos ilusões, sabemos que não é por trazer o António Zambujo que todas essas pessoas vêm. A diversificação de oferta procura esbater estas fronteiras psicológicas.

Mas há alguns fenómenos. O Caetano Veloso esteve cá há 15 dias – foi daqui, aliás, que gravou a mensagem de apoio a Salvador Sobral – e a sala estava cheia. O concerto que a Mariza deu em Janeiro esgotou em 40 minutos! Claro que não eram só portugueses, havia muitos luxemburgueses e muito público internacional.

A cidade do Luxemburgo tem 74% de estrangeiros. Os luxemburgueses vivem bem com essa realidade. O país precisa deste input regular [de estrangeiros], por vários motivos e a vários níveis. E não é só mão de obra sem qualificações. Perceberam que isso é a riqueza do país.” 

A fotografia neste Primeira Pessoa é uma Cortesia Pippa Herbert / City Savvy Luxembourg

 

 

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