Um lema para mim

Nós humanos temos a habilidade espantosa de criticar os outros como se fôssemos perfeitos.

 

O latim dos lemas - veritas lux mea - destina-se a esconder a gabarolice. Em português convida-se o escárnio: "ai, a verdade é a tua luz? É esse o princípio que guia todas as tuas acções? Olha que sorte para ti".

Os lemas servem para dar força e para inspirar. O conselho até pode ser tacanho: in nocte consilium é "estuda à noite". Por outro lado pode ser "a noite é boa conselheira" ou até "dorme uma noite bem dormida antes de tomar uma decisão".

Os lemas são flexíveis. É esse um dos problemas que têm. Per aspera ad astra significa que é preciso fazer-se um esforço para chegar às estrelas (e áspero, ainda por cima). Para quem, sendo pouco dado às coisas difíceis, prefere ficar cá em baixo, um lema mais apropriado seria ignim mittite in terram: deita fogo à terra. Metaforicamente, claro? O lema não diz.

Não sabendo eu latim preferia um lema mais prático e menos fanfarrão, um que me fizesse bem ler duas ou três vezes por dia.

Como se diz, em latim, "tu também não és pera doce"? Ou, puxando para a primeira pessoa, "eu também não sou fácil". Eis uma modesta recordação que não exorta nem humilha. Só chateia, que é o que estas frases têm de fazer.

Nós humanos temos a habilidade espantosa de criticar os outros como se fôssemos perfeitos. A perfeição destas críticas muitas vezes obnubila as nossas limitações pessoais - sobretudo as intransponíveis.

Ser pêra doce no universo das pêras também não é um feito por aí além. Não é caso para alertar toda a feira. Mas mesmo assim...

 

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