Taxe bem!

O Eléctrico 28 é um dos ex-líbris de Lisboa. Está sempre cheio e não chega para todos os turistas, que o adoram. Daí o brilhantismo da nova taxa turística. António Costa transformou Lisboa num gigantesco Eléctrico 28: o turista já não precisa de viajar no famoso amarelo para lhe irem à carteira, basta chegar à cidade. Cria-se uma identificação perfeita entre a cidade e o seu símbolo. Isto é marketing do bom.

António Costa quer reposicionar Lisboa no circuito turístico europeu. O forte da capital tem sido a mistura equilibrada entre civilização europeia e exotismo terceiro-mundista. Sucede que Lisboa está a ficar demasiado sofisticada. Há um excedente de hotéis de charme, hostels com estilo, restaurantes gourmet e lojas de luxo. Se é para isso, os turistas vão a Paris. O presidente da câmara percebeu que era preciso fazer alguma coisa para baixar o nível e instituiu a figura típica dos destinos tropicais, que é o pedinte maçador que se alapa ao turismo mal este põe o pé fora do avião. Passámos a ter o nosso crava de mão estendida. Usa é gravata.

Agora, confesso que tive receio. Quando li, na fundamentação económica, que a taxa serve para acautelar “um acréscimo de pressão no espaço urbano, nas infra-estruturas e equipamentos públicos, reivindicando maior limpeza, (…) sob pena da excessiva ocupação/lotação e precoce degradação colocar em causa a sustentabilidade do crescimento do destino turístico”, achei que o imposto ia ser desperdiçado a limpar o cocó dos cães, nomeadamente dos cães que os turistas trazem, que são dos que fazem mais cocó, ainda por cima cocó estrangeiro. Ou a pagar a mais cantoneiros para recolher o lixo que os turistas trazem de propósito do seu país só para deixar nas nossas ruas. Ou a substituir pavimentação por causa de turistas que, por não terem pressa, arrastam os pés e desgastam a nossa calçada portuguesa (já para não falar de quando puxam malas de rodinhas pelo chão, os alarves).

Felizmente, António Costa já disse que não é para isso. O dinheiro vai para construir esse clássico chamariz de turistas que é um Centro de Congressos. O slogan: “Come to Lisbon and visit our Congress Center! Oh, and if you have time, stop by the Jeronimos. It’s also nice, although a little bit old.”

Ah! A quantidade de turistas que, ao decidirem o destino de um city break, vão optar pela cidade com o melhor Centro de Congressos. Os Canais de Amesterdão? A Sagrada Família em Barcelona? Nã, o Centro de Congressos de Lisboa. Vamos deixar de ler comentários desagradáveis no TripAdvisor, como este: “Great food, great weather! Shame about the lack of a proper Congress Center.” Se os egípcios tivessem construído um Centro de Congressos em vez da Esfinge, sabe-se lá os turistas que teriam hoje.

Só que a câmara foi pouco ambiciosa. Taxar as dormidas é boa ideia, mas porquê limitar-se às dormidas em hotel? Há imensos turistas que dormem a sesta nos relvados do Jardim da Estrela. Taxe-se qualquer cochilo. Na dúvida, se tem ramelas, paga. Mesmo a taxa de desembarque é mal aproveitada. Antes de desembarcar, há aquele tempo de espera em que o avião está parado na pista. Destaquem-se dois fiscais da EMEL para a Portela e taxe-se o estacionamento.

Mas há mais taxas a cobrar. Quando chove, taxa de desportos aquáticos. Uma taxa por ver mapas na rua. Uma taxa por pedir indicações a transeuntes. Outra por observar a luz de Lisboa. E, para não ser repetitivo, uma multa para cada estrangeiro que disser “bácálao” em vez de bacalhau.

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