Palavras, expressões e algumas irritações: manipular

Diz o dicionário que “manipular” significa “controlar, condicionando a opinião ou o sentido, manobrar”. E dá um exemplo: “O vício de manipular as estatísticas.” Na Venezuela, os votos.

O primeiro registo da palavra “manipular” fala de práticas manuais. “Mover ou utilizar com as mãos, manobrar, manejar, manusear.” Exemplo: “Para abrir, basta manipular uma alavanca.” Outro sentido positivo, digamos assim: “Confeccionar manualmente juntando os vários ingredientes.” Exemplo segundo: “Observava a cozinheira a manipular os alimentos.”

Só mais um, enquanto nos vamos aproximando do sentido pejorativo: “Ter autoridade e controlo sobre.” Exemplo terceiro: “O gestor tem de manipular recursos materiais e humanos.” Agora é que é: “Controlar, condicionando a opinião ou o sentido, manobrar.” Exemplos quarto e quinto: “Mais do que informar, certos órgãos visam manipular o público” e “o vício de manipular as estatísticas”.

Na quarta-feira, ficou a saber-se que na Venezuela, nas eleições para a Assembleia Constituinte, convocadas por Nicolás Maduro, “a diferença entre a participação real e a anunciada pelas autoridades é pelo menos de um milhão de votos”. Quem o declarou foi Antonio Mugica, fundador da empresa Smartmatic, que gere sistemas de voto electrónico em vários países e ali desde 2004.

“Sabemos sem qualquer dúvida que a participação na eleição recente para a Assembleia Constituinte foi manipulada”, afirmou o empresário, explicando que o sistema foi concebido para “detecção imediata e muito fácil” em caso de manipulação dos resultados.

A oposição boicotou a votação por entender que esta assembleia pretende entregar a Maduro todos os poderes, “pelo que os 545 delegados eleitos pertencem às fileiras bolivarianas”. Nesse sentido, a participação era a principal medida do sucesso das eleições. O Conselho Nacional Eleitoral assegurou que tinham votado 8,1 milhões de pessoas (mais do que os 7,5 milhões que a oposição diz terem participado numa consulta contra a eleição), os restantes partidos apontam para não mais de 2,5 milhões.

A União Europeia afirmou que “não pode reconhecer a Assembleia Constituinte”. O ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, assumiu posição idêntica, dizendo que a votação foi um “passo negativo” para a resolução da crise política no país. O PCP emitiu um comunicado que, segundo Elíseo Estanque, “é um hino a Maduro, exaltando este ‘acto de afirmação democrática’ contra ‘o ataque ao povo venezuelano pelos Estados Unidos e União Europeia’”.

A líder do Bloco disse: “O BE nunca confundiu a democracia com o acto formal de voto.” Mas estamos com alguma dificuldade em escutar daqui a voz de Catarina Martins. Ou temos problemas auditivos ou o BE sobre este assunto fala mais baixinho.

A rubrica Palavras, expressões e algumas irritações encontra-se publicada no P2, caderno de domingo do PÚBLICO

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