Finalmente! Trump provoca-me CAPS LOCK feelings

Donald Trump é uma maiúscula, de facto. Prepotente, mal-educada mesmo, porque nos grita aos ouvidos sem termos culpa nenhuma daquela fúria infantil. Ninguém o ensinou a escrever mais baixo?

Já tinha escrito antes sobre isto, ainda o senhor não era Presidente dos Estados Unidos da América. O fenómeno emocional não é novo, ele expressa-se em abundância nas redes sociais, existe de cabelos em pé e letras garrafais, a diferença é que agora nos chega pela pena virtual do Presidente dos Estados Unidos da América.

Já tinha escrito antes sobre isto, ainda o senhor não era Presidente dos Estados Unidos da América (BONS TEMPOS!!!). Já nessa altura me causava espanto que algumas pessoas expressassem as suas exaltações nas redes sociais com maiúsculas e vários pontos de exclamação, que expressassem as inquietações com muitos pontos de interrogação seguidos (porque assim, percebe-se logo, as dúvidas são três vezes maiores). Com muitas reticências. Reticências em vez de vírgulas, por exemplo, porque assim as frases ficam suspensas, as reticências estão ali como uma piscadela de olho, um intervalo que não se soube expressar. São frases preguiçosas. Enfia-se a reticência e o leitor que adivinhe que há ali uma dobra, uma luz que só não ilumina a frase porque está escondida e por dizer.

Mas as maiúsculas são uma praga. Podem existir, pelo menos, de duas formas: só no início das palavras ou estendendo-se à palavra toda, à ideia (que normalmente é tão profunda e elaborada que cabe num tweet, não é preciso andar ali às voltas, vai-se directo ao assunto e aos berros. CAPS LOCK, curto e grosso como deve ser, mas só nas redes sociais).

No início das palavras, as maiúsculas já são praga que chegue, porque são, mais uma vez, preguiçosas e, pior, pedantes. Dividem as letras em castas, como se uma maiúscula tivesse direito a um trono, estivesse mais alto na hierarquia social dos vocábulos. Como o amor é difícil de expressar, pumba, espeta-se ali com um Amor e está feito. O A diz tudo da sua grandeza e, já agora, nobreza. Um amor com A grande é especial, é o Amor a sério. Um amor com minúscula até pode ser mais redondo, mais sussurrado, mas não serve. Só falta mesmo o engenheiro ou doutor antes (um eng. Amor, um dr. Amor) para lhe dar o devido estatuto. Porque as maiúsculas também são uma forma de respeitinho: escrevemos a Escola, escrevemos os Médicos ou os Professores quando queremos elogiar alguém. Estamos a teclar a maiúscula e a tirar o chapéu ao mesmo tempo. Dizer, por exemplo, “a minha amiga” não serve. Se for uma amiga a sério, daquelas para a vida, tem de ser uma Amiga ou, pior, A AMIGA.

Aqui entramos no domínio dos berros, da gritaria, mesmo se estivermos a dizer que gostamos de alguém. E ainda acrescentamos os pontos de exclamação. Acrescentamos não, porque eu não acrescento nada. Eu fico só zonza quando abro o Facebook ou o Twitter e vejo gritaria. Calma, eu percebo na mesma se mo disserem num volume aceitável. A indignação pode expressar-se de muitas formas, credo.

Mas gosto de ser uma rapariga dos meus tempos. E, por isso, ando seriamente a pensar em aderir à moda. Se o Presidente dos Estados Unidos pode, eu também posso (e reparem que escrevo Presidente com maiúscula, quero dar-lhe a solenidade institucional que o cargo tem e que Donald Trump roubou).

Donald Trump é uma maiúscula, de facto. Prepotente, mal-educada mesmo, porque nos grita aos ouvidos sem termos culpa nenhuma daquela fúria infantil. Ninguém o ensinou a escrever mais baixo? Para se ser uma maiúscula esbelta é preciso uma certa elegância, uma subtileza, uma educação, uma cultura que Trump não tem. Existem essas maiúsculas, são raras, mas já houve Presidentes assim. Há pessoas que são essas maiúsculas, na maior parte das vezes até se apresentam com letra pequena, mas nós vemos logo que são maiúsculas, daquelas escritas à mão, desenhadas. Não é o caso de Trump. Trump faz parte de uma maioria (ou minoria, não sei) nada silenciosa. São as maiúsculas a negrito, grossas e grosseiras.

Mas eu quero aderir à moda das maiúsculas descabeladas e, por isso, vou começar a escrever também assim. Não precisam de ser fúrias, podem ser sentimentos solares, que sirvam até para me auto-ajudar, uma maiúscula é outro ânimo. Vou escrever pela manhã: “Acordei e abri a janela. Está um lindo dia. SINTO-ME BEM!!!” Mas depois de me sentir tão bem, de cheirar o ar perfumado dos tempos, vou fechar a janela, abrir o Twitter, ver que Trump deambula por lá de megafone em punho, e vou ter de elaborar outro sentimento, um sentimento que é também um pensamento. Profundo. E vou escrever, consternada: SAD! VERY SAD!!!

 

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