Depois de Abril

1. Passaram estas semanas diferentes, em que as comemorações dos 40 anos da Revolução dos Cravos e a sinalização do 1.º de Maio ocuparam as notícias. Voltámos ao quotidiano, tão difícil para muitos portugueses. E regressaram os temas do momento: a “saída limpa” (termo horrível), as eleições para a Europa, os impostos, os mercados, os problemas com os professores… uma série de questões que, infelizmente, dizem muito pouco à maioria dos cidadãos.

Abril de 2014 mostrou como a revolução de há 40 anos pouco interessa aos jovens de hoje. Por isso, importa pensar no futuro sem, no entanto, deixar apagar a memória.

Em primeiro lugar, devemos lutar para que a abstenção não seja a vitoriosa nas eleições europeias de 25 de Maio. Infelizmente, o desinteresse é grande e os portugueses parecem resignados, como se a velha frase “para pior já basta assim” voltasse à ordem do dia. No trabalho, a discussão viva sobre política desapareceu. Na campanha que oficialmente começa amanhã, ouviremos os ataques pessoais que nada mobilizarão e os portugueses, mais uma vez, continuarão a tratar os políticos como “eles”.  

Têm razões para isso. Uma promessa de um político agora no activo pouco vale. A frieza do Governo, que tudo faz para nos demonstrar a bondade das suas políticas, serve para apagar qualquer espécie de emoção que porventura ainda possa restar no íntimo de quem nos governa. Linhas que não podiam jamais ser ultrapassadas – como a subida da TSU e o aumento dos impostos – são agora transpostas com a ligeireza de quem não valoriza, de facto, os sentimentos dos outros. É assim que este Governo desconhece, por completo, o valor da palavra “empatia”, como nunca aconteceu no pós-Abril.

Vai-se embora a troika, é verdade, mas com que custo? As contas estão mais equilibradas, mas o empobrecimento é real e vai manter-se por muitos anos. Aqueles que perguntam se o 25 de Abril valeu a pena deveriam antes questionar-se se esta política europeia vale a pena e ter essa noção antes de votar. 

2. Regressa a polémica sobre a prova de avaliação dos professores. O Ministério da Educação (ME) deveria ter presente o que aconteceu quando a tentou marcar no passado: greves, polícia à porta da escola, estabelecimentos de ensino sem funcionar, estudantes e pais perplexos com tudo o que se passava. Como já tive ocasião de escrever nesta coluna, a prova está morta: poderá realizar-se, mas os resultados dessa avaliação ficarão para sempre ensombrados por toda a série de confusões resultantes da sua realização. Os sindicatos também deveriam meditar nesta luta, que a nada conduzirá: protegida por várias decisões judiciais favoráveis, a tutela realizará a prova, porque sempre existirão muitos professores incapazes de faltar. E embora sem grande efeito prático, o ME reivindicará para si uma vitória.

3. Há dois anos, almocei com Vasco Graça Moura no CCB. Estávamos a preparar a comemoração dos 150 anos da publicação do Amor de Perdição, de Camilo, através de uma iniciativa nas escolas secundárias, que veio a realizar-se com êxito. Falámos de poesia, dos nossos romances favoritos e do ensino do Português. Ofereceu-me, “com um abraço cordial”, o seu livro Os Lusíadas para Gente Nova, uma obra que deveria ser de leitura obrigatória para os alunos do 9.º ano. Senti muito a sua morte e aqui quero deixar uma simples homenagem.

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