As piores novidades

São detestáveis as dores novas. Aparecem de surpresa, no lugar onde menos esperamos que possa doer. Toda a minha cabeça parecia já conquistada pelas dores. Mas não: havia uma parte da nuca onde nunca me tinha doído antes. E que só ontem começou a latejar, um suplício oco, de boca aberta, como ter uma lampreia a chuchar-me na espinal medula.

Tinha 19 anos quando me doeu a mão direita pela primeira vez. O médico, trocista e farto de estudantes hipocondríacos, disse-me que era da idade, que não havia nada a fazer. E não é que tinha razão? É.

Nunca mais deixou de me doer. A única variação era na intensidade: cada vez que reaparecia estava mais forte e intratável.

Esta semana eu já tinha inaugurado uma secção do lombo que nunca me tinha dado problemas. Agora dá.  É horrível como nunca nos habituamos. Se calhar, trata-se de uma excelente preparação para a morte, isto de sermos sempre surpreendidos, como se não tivesse nada a ver connosco.

A dor vai conquistando o corpo todo, deixando alfinetes onde tenciona fazer ferroadas. Sinto-me assim detentor de um mapa do futuro desenhado na minha pele, onde estão assinaladas todas as áreas onde as dores se hão-de tornar insuportáveis.

Preferia não saber. Mas a tortura é maior quando X marca o ponto de uma aflição vindoura. Como se não bastassem as dores todas que já fruiram e que me acompanham como roedores subcutâneos com dentes descomunais que só se aparam através da constante trituração dos meus nervos. Não. Faltam sempre dores novas. E cá estão elas.

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