O prazer de viver

Nascer é um bom começo. O resto é discutível.

É bom esquecermo-nos de nós próprios e não ligarmos ao que sentimos. Às vezes é melhor não pensar e só ler. Ou não fazer nada - e só assistir. É melhor não procurar - e só pertencer.

A coisa mística é quase sempre uma questão de preguiça produtiva. É deixar de fazer o esforço de participar ou de concorrer para conseguirmo-nos convencer, ludibriados com grande custo, que somos o centro do mundo.

Não somos porque não podemos ser. Nenhum de nós tem qualquer importância ou influência no mundo das coisas que importam ou influem.

Perdemos muito tempo a não vivermos no mundo a que pertencemos. Perdemos muito tempo sem olhar para tudo o que existe à nossa volta. Querermos ser importantes e influentes não impressiona ou muda nada ou ninguém. Mas tira a cada um de nós o tempo e o prazer, já de si poucos, de viver.

A sabedoria é um engano diferente dos outros: ensina-nos a ter a certeza que estamos (e somos, fundamentalmente) enganados. Mas não é por haver outros que estão ainda mais enganados ou, Deus nos livre, por haver outros que têm razão. É porque a verdade é mesmo assim: não existe.

O que existe é a avaliação da qualidade dos erros. Uns são heróicos mas estúpidos. Outros são cobardes mas convincentes. O erro mais humano é achar que um ser humano é capaz, com muito esforço e muita inteligência, de aproximar-se de uma verdade que é verdadeira para todos; quase todos ou, simplesmente, para uma triste maioria.

Nascer é um bom começo. O resto é discutível.

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