Paciência?

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O bispo castrense, D. Januário Torgal Ferreira, que nos tem afligido com o seu "esquerdismo" e com asneiras periódicas que esse "esquerdismo" lhe parece inspirar, comparou esta semana Pedro Passos Coelho ao dr. Oliveira Salazar. Ninguém já liga ao que D. Januário diz. De qualquer maneira, a comparação é um insulto que não ofende só Passos Coelho (se ele se dá por ofendido), mas milhões de portugueses que votaram neste Governo e, um ano depois, não deixaram de o apoiar. À primeira vista, o bispo foi inspirado por um comentário do primeiro-ministro sobre a "paciência" dos portugueses. Não me consta que essa "paciência" tenha sido obtida pelos métodos de Salazar. E, no entanto, ela está aí, para quem a quer ver, se de facto merece o nome de "paciência".

Perante a gravidade da situação é preciso explicar esta anomalia indígena. O que, em princípio, não é difícil. Para começar, a solução da crise (se há uma solução para a crise) não é principalmente interna. Com ou sem programa da troika, o que a "esquerda" possa fazer nas ruas de Portugal não vai impressionar a sra. Merkel ou forçar uma mudança política na "Europa". O sr. Seguro acha que Hollande tratará do assunto, no que se engana redondamente. Hollande talvez consiga alguns programas cosméticos (e agora menos com a Espanha) e pouco mais. Não existem milagres, mesmo do género socialista, e a impotência do PS para governar ou influenciar o Governo é uma realidade pública e notória. O próprio sr. Seguro com o seu ar de seminarista acanhado é uma desculpa viva.

E, como se isto não bastasse, a "extrema-esquerda" - o Bloco e o PC - acabaram ou, pelo menos, durante uns tempos não servem para coisa nenhuma. O sr. Louçã e o sr. Jerónimo praticamente desapareceram. Não por acaso. Ninguém no mundo, por desvairado que estivesse, iria negociar com um ou com outro o empréstimo de um cêntimo: e os portugueses sabem isso muito bem. A não ser que se proponha partir montras na Avenida da Liberdade ou deitar aí algumas bombas pela paisagem, a "extrema-esquerda" só tem a alternativa de ir berrar para a televisão, um exercício claramente improfícuo de que os putativos destinatários se começam a fartar. A "paciência" que D. Januário e Passos Coelho descobriram em Portugal é uma triste forma de resignação. Não nos devíamos gabar.

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