Líder republicano britânico detido antes da coroação: “Algo que esperaríamos ver em Moscovo, não em Londres”

Organizações de direitos humanos denunciam e criticam detenção de vários participantes nos protestos antimonarquia na capital britânica. Polícia justifica detenções com “suspeitas de violação da paz”.

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Uma pessoa levanta um cartaz enquanto o grupo antimonárquico Republic protesta no dia da coroação do rei Carlos III EPA/Cathal McNaughton
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A Polícia Metropolitana de Londres deteve 52 pessoas envolvidas na preparação e participação nos protestos antimonarquia que tiveram lugar neste sábado na capital do Reino Unido durante as cerimónias de coroação de Carlos III.

Um dos detidos foi Graham Smith, director executivo do Republic – a maior organização republicana do país, com mais de 80 mil membros, e que defende a abolição da monarquia e um novo sistema constitucional com um chefe de Estado democraticamente eleito.

O activista político e outras cinco pessoas do Republic foram interceptados pela polícia ainda antes do início das celebrações, no momento em que retiravam de um veículo algum material para distribuir pelos participantes na manifestação.

“Eles estavam a juntar cartazes e a transportá-los quando a polícia os parou. Perguntaram porquê e disseram-lhes: ‘Dir-vos-emos quando revistarmos o veículo’. Foi então que prenderam os seis organizadores [dos protestos]”, contou Harry Stratton, dirigente do Republic, citado pelo Guardian.

“Perguntámos qual a justificação para estarem a ser detidos, mas [a polícia] não disse”, continuou. “Foi uma surpresa, uma vez que tivemos uma série de reuniões com a polícia [antes do evento].”

A organização ambientalista Just Stop Oil também denunciou a detenção de 13 membros, “apenas por terem T-shirts e bandeiras” antimonárquicas.

Com centenas milhares de pessoas nas ruas de Londres a celebrar a coroação do rei, cerca de duas mil pessoas juntaram-se na Trafalgar Square, junto à estátua de rei Carlos I – condenado por traição e executado em 1649 –, vestidas de amarelo e munidas com cartazes com frases e palavras de ordem como “abolição da monarquia”, “privatizem-nos” ou “não é o meu rei”.

Também houve protestos republicanos em Cardiff, no País de Gales, e em Edimburgo e Glasgow, na Escócia.

Fotografias partilhadas pelos media britânicos e por várias organizações de protesto mostram agentes da polícia a confiscar cartazes, mas a Met informou que encontrou material que diz que poderia vir a ser utilizado pelos manifestantes para se prenderem a estruturas ou edifícios no espaço público.

Este dado é particularmente relevante no contexto da aprovação e entrada em vigor, há poucos dias, da nova polémica lei da ordem pública, que, entre outras disposições, prevê uma pena máxima de seis meses de prisão para quem se “amarrar ou prender a outros, a objectos ou a edifícios para causar perturbações graves”.

A legislação, que foi descrita pela ONU como “desproporcional” e “profundamente perturbadora”, também dá poderes reforçados à polícia para parar e revistar manifestantes, e facilita a emissão de ordens judiciais para proibir determinadas pessoas de estarem em determinados sítios a determinada hora ou dia – o Republic acredita que a detenção de Smith foi feita nestes termos.

Num comunicado, a Polícia Metropolitana – que na véspera já tinha prometido “pouca tolerância” para quaisquer “perturbações” das celebrações – explicou que “realizou uma série de detenções” de pessoas sobre as quais havia “suspeitas de violação da paz”, “suspeitas de conspiração para causar transtornos públicos” e “suspeitas de posse de objectos para causar danos criminais”.

A actuação da polícia motivou, no entanto, muitas críticas das organizações republicanas e de direitos humanos e até de políticos, como o deputado trabalhista Richard Burgon.

“Estou profundamente preocupado por saber que houve pessoas que foram detidas enquanto se preparavam para expressar pacificamente o seu apoio a uma república, uma posição defendida por 25% da população”, escreveu no Twitter. “Isto tem de parar. As pessoas terem o direito a manifestar pacificamente as suas opiniões é um princípio democrático básico.”

Yasmine Ahmed, directora da Human Rights Watch no Reino Unido, comparou as detenções deste sábado com o “modus operandi” das forças de segurança da Federação Russa, um país onde a liberdade de manifestação e de reunião é bastante reprimida.

“As notícias sobre pessoas a serem detidas por protestarem pacificamente contra a coroação são incrivelmente alarmantes”, afirmou, num comunicado. “Isto é algo que esperaríamos ver em Moscovo, não em Londres.”

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