Dono do grupo Impala detido pela PJ por corrupção e fraude

Uma queixa-crime apresentada por um antigo trabalhador deu origem a esta investigação da PJ, confirmou fonte policial ao PÚBLICO.

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Jacques Rodrigues, o proprietário do grupo Impala, foi detido na manhã desta quinta-feira pela Polícia Judiciária DR

Jacques Rodrigues, o proprietário do grupo Impala foi detido, juntamente com mais três pessoas, na manhã desta quinta-feira pela Polícia Judiciária, noticiou a CNN Portugal e confirmou o PÚBLICO. Inspectores da Judiciária continuam neste momento a realizar buscas na sede daquele grupo de comunicação que é dono de títulos da imprensa escrita como as revistas Nova Gente, Maria e TV 7 Dias.

Em causa estará uma fraude com montantes avultados. O empresário, com mais de 80 anos, é suspeito de crimes de corrupção, fraude e insolvência dolosa relacionada com as sociedades de que era dono. Entre dívidas a credores, entre eles trabalhadores do grupo e Estado, estará em causa um valor que pode chegar aos 100 milhões, segundo um comunicado da PJ que sublinha que a investigação criminal "visa um plano criminoso traçado para, entre o mais, ocultar a dissipação de património, através da adulteração de elementos contabilísticos de diversas empresas" e do "desvio de valores com origem nas estruturas societárias, para fora do território nacional".

Ao que o PÚBLICO apurou, o empresário tem uma sociedade em Gibraltar e várias empresas no Brasil. Há suspeitas de que seriam desviados montantes da empresa em Portugal que detinha as revistas para estas sociedades.

Por exemplo, no caso da sociedade em Gibraltar, uma offshore com o nome Dampier, sabe-se que durante anos facturou todas as revistas da Descobrirpress que eram vendidas para o estrangeiro, assumindo aquela os custos de produção e de transporte dessas revistas para os seus destinatários, recebendo o produto dessas vendas sem nunca dele ter pago qualquer parte e/ou contraprestação à Descobrirpress.

Outra situação que está a ser investigada é o facto da empresa Impalagest ter uma dívida de cerca de 27 milhões para com outra empresa do grupo, nomeadamente a que detinha as revistas e de ter pago essa dívida com a dação de uma participação de uma outra empresa do grupo. Acontece que a Impalagest tinha adquirido essa participação semanas antes por pouco mais de dois milhões de euros.

Uma queixa-crime apresentada por um antigo trabalhador deu origem a esta investigação da PJ que, em comunicado, informou que através da Unidade Nacional de Combate à Corrupção e no âmbito de inquérito titulado pelo DIAP de Sintra, procedeu esta quinta-feira à realização de uma operação policial visando a execução de trinta e dois mandados de busca, designadamente, oito buscas domiciliárias e vinte e quatro buscas não domiciliárias.

Nessa queixa-crime a que o PÚBLICO teve acesso são mencionados também indícios de que foi a Descobrirpress que financiou a construção do próprio edifício sede do Grupo Impala, sito na Abrunheira, Ranholas, no concelho de Sintra, e a construção do hotel Ondamar, localizado na Urbanização das Areias de São João, no concelho de Albufeira.

No entanto, contabilisticamente, não há indícios de que a Descobrirpress tenha sido ressarcida do valor despendido nas construções e os edifícios também estão registados em nome de outras sociedades.

Também terá sido através de uma empresa a Actitur - Arquitectura e Engenharia, mas mais uma vez com dinheiro da Descobrirpress, que foram construídos imóveis que serviram e ainda servem de residência para Jacques Rodrigues e familiares.

Segundo a PJ, durante a acção policial que se desenvolveu em Lisboa, Sintra, Cascais, Oeiras, Amadora, Santo Tirso, Porto, Matosinhos e Funchal, foram executados ainda o cumprimento de quatro mandados de detenção fora de flagrante delito e à constituição de dez arguidos.

"A operação em causa, designada 'Última Edição', contou com a colaboração de diversas Unidades Nacionais, o Departamento de Investigação Criminal da Madeira e, ainda, com o apoio pericial da Unidade de Perícia Tecnológica e Informática e da Unidade de Perícia Financeira e Contabilística, da Polícia Judiciária, integrando mais de uma centena de investigadores criminais e peritos, para além de Magistrados Judiciais e do Ministério Público", lê-se no comunicado que sublinha que "as buscas realizadas visaram a recolha de elementos probatórios de diversa natureza relacionados com suspeitas de actividades criminosas fortemente indiciadoras da prática dos crimes de corrupção passiva, corrupção activa, insolvência dolosa agravada, burla qualificada e falsificação ou contrafacção de documentos".

Foram realizadas seis buscas em empresas com actividade no domínio da Comunicação Social, quatro em Sociedades/Gabinetes de Revisores Oficiais de Conta e uma em escritório de Advogado.

Reclamam salários desde 2011

Os detidos serão presentes no Tribunal de Instrução Criminal de Sintra para serem ouvidos por um juiz em primeiro interrogatório, após o qual deverão ser conhecidas as medidas de coacção a que ficarão sujeitos enquanto aguardam o desenrolar da investigação.

Há muito que antigos trabalhadores lutam em tribunal contra a Impala e os seus administradores para recuperar o dinheiro a que dizem ter direito.

Os trabalhadores reclamam salários em atraso desde 2011 e a situação agravou-se com um despedimento colectivo de 54 trabalhadores feito em Maio de 2020, aos quais também não terão sido pagas as respectivas indemnizações.

Ainda no final do ano passado o Expresso noticiou que os trabalhadores iam avançar com um incidente de qualificação da insolvência para que fosse declarado pelos tribunais que os responsáveis pela empresa, em especial o proprietário do grupo editorial, Jacques Rodrigues, é que terão de pagar do seu próprio bolso os créditos reclamados no âmbito da declaração de insolvência de uma das empresas do grupo, a Descobrirpress — Serviços Editoriais e Gráficos.

A empresa andou anos a apresentar processos especiais de revitalização (PER) que foram sendo chumbados. Uma lista de credores, publicada em Outubro do ano passado, dava conta de um total de 98,3 milhões de euros em dívidas.

Ainda de acordo com o Expresso, o administrador de insolvência avaliou os bens na posse da Descobrirpress e concluiu que, tirando quatro veículos de passageiros e de mercadorias e dois motociclos sem valor comercial, havia participações em três empresas cujo valor ainda ia ser apurado. Porém, o total dos bens inventariados apontava para um valor de apenas 243,8 mil euros.

Suspeita-se que foi durante os anos em que foram sendo feitas tentativas de fazer aprovar os PER que os responsáveis pela Descobrirpress, nomeadamente o seu proprietário, promoveram várias alterações com transferência de activos entre empresas, de forma a evitar que a Impala cumprisse as suas obrigações para com os credores, dissipando bens e dinheiro.

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