As mães têm um MBA em gestão

Como é que as mães cuja profissão é dedicarem-se à gestão desta empresa familiar continuam a ter de ouvir: “Então, conta lá, o que é que fazes todo o dia?”

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"A gestão 'doméstica' continua a ser tão pouco valorizada pela sociedade" @designer.sandraf

Querida mãe,

Sabe como se costuma dizer que quando temos filhos, a organização e o planeamento se tornam absolutamente essenciais? Até se vendem umas agendas especiais para pais, e há apps que ajudam à gestão da família? Pois, a sua querida filha, vem dizer-lhe que nem por isso!!!

Há anos que ando a tentar aprimorar os meus dotes de organização (que não me sai naturalmente, diga-se de passagem), mas quase todos os dias percebo que aquilo que me ajuda realmente, é ser flexível porque todos os dias os meus planos vão por água abaixo, e logo antes das 11 horas da manhã.

É um que fica doente, uma escola ou duas que fazem greve, alguém se esqueceu de alguma coisa essencial em casa, e é preciso voltar atrás ou, no trabalho, mudam o horário de uma reunião, ou cancelam um Zoom.

O roteiro do "uber-mãe" muda constantemente, num esforço de tomar decisões de segundo que tornem mais eficiente (e barata) a mudança de rota — se x mudou para y, então é melhor b passar para c, de maneira a poupar na gasolina, mas depois isso implica que é preciso almoçar fora porque não dá para ir a casa, e nesse caso z é a melhor solução!

Tudo isto é acompanhado, evidentemente, por uma vaga sensação de culpa, de que provavelmente havia uma solução melhor ou que se fossemos mais organizadas seria diferente. Venho dizer: não é!

Mas o que isto me fez pensar foi em como esta gestão “doméstica” continua a ser tão pouco valorizada pela sociedade. Como é que as mães cuja profissão é dedicarem-se à gestão desta empresa familiar, continuam ainda a ter de ouvir a pergunta paternalista e displicente: “Então, conta lá, o que é que fazes todo o dia?”


Querida Ana,

Tens toda a razão! Por isso é que digo sempre que as empresas devem contratar mães, porque têm um MBA em gestão eficiente, em resiliência e capacidade de trabalho! Bem como em resolução de conflitos, gestão de recursos humanos e negociações.

Para uma mãe que discute com uma adolescente ou com um miúdo de 4 anos, não há cliente ou fornecedor que a assuste. Nem sequer um chefe irascível e maldisposto.

Além de terem uma capacidade espantosa de tomar decisões rapidamente, e acatar com as consequências, têm uma noção de como cada minuto conta.

Bem, mas ao ouvir a tua descrição e mesmo concordando que é um trabalho duríssimo e complexo, não achas que, muitas vezes, exageramos, tornando-nos mães "workaholics"? Que podemos estar a dedicar demasiado tempo e energia mental a cada um dos problemas? Que é fácil viciarmo-nos na adrenalina que resolver toda essa ginástica acaba por trazer? Que acabamos por nos tornar muito omnipotentes e omnipresentes, tendo dificuldade em desligar?

Fico à espera da tua resposta.


O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam.

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