Vinagre não é um milagre para a diabetes, nem para emagrecer, como diz o TikTok

O consumo de vinagre ajuda a retardar o esvaziamento gástrico, promovendo a saciedade. Mas o seu consumo em excesso tem perigos, avisa a endocrinologista Carolina Neves.

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O vinagre, especialmente se for de maçã, pode atrasar o esvaziamento gástrico Towfiqu barbhuiya/Unsplash

No TikTok, milhares de utilizadores mostram aquele que acreditam ser um dos segredos para uma vida mais saudável, longe da diabetes. É, nem mais, nem menos, do que beber vinagre. Esse hábito ajuda o emagrecimento, baixando igualmente a glicemia, o nível de açúcar no sangue, justificam. Esse facto é verdadeiro, reconhece a endocrinologista Carolina Neves, da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP), mas tem perigos associados, alerta. Além disso, “não substitui a terapêutica da diabetes”, avisa.

“Não é uma novidade usar o vinagre como estratégia para perder peso. Nem é baseado numa mentira. Há estudos que demonstram alguma evidência ainda que não sejam robustos”, confirma a especialista ao PÚBLICO. O vinagre, especialmente se for de maçã, pode atrasar o esvaziamento gástrico, explica. Isto é, torna a digestão dos alimentos mais lenta, promovendo a saciedade.

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Desta forma, também torna mais estável a glicemia, controlando sobretudo os picos de açúcar no sangue que acontecem naturalmente cerca de uma hora a duas horas após as refeições. “Embora esse efeito não seja muito exuberante. Não é suficiente para se recomendar a sua utilização”, defende a endocrinologista.

Para haver algum efeito na glicémia, observa Carolina Neves, o vinagre tinha de ser consumido antes das refeições. Nunca como uma terapêutica, mas, sim, parte de “uma dieta equilibrada”. Afinal, é só mais um dos alimentos que devem constar na alimentação de uma pessoa com diabetes ou de quem quer prevenir a doença. “Também conhecemos outros alimentos que ajudam a controlar a glicemia, como o consumo de hidratos de carbono complexos, fibras como a aveia, ou leguminosas.”

Mas atenção, pede a endocrinologista da APDP, o abuso do consumo tem malefícios associados. “É uma substância ácida irritativa para as mucosas do estômago, pode causar lesões no esófago, náuseas, mal-estar. Além disso, promove a erosão da arcada dentária”, enumera.

Em excesso, no limite, o vinagre pode levar uma redução dos níveis de potássio no sangue, potencialmente perigosa. “Não pode ser recomendado como terapia, mas só usado numa dieta”, assevera. Quanto à quantidade, não podem ser ultrapassadas as duas colheres de sopa por dia. Um hábito que já muitos têm, por exemplo, para temperar uma salada.

Além disso, quem não tem pré-diabetes, nem predisposição genética, não deve estar preocupado em controlar os valores do açúcar no sangue. A glicemia tem picos durante um dia normal, “é fisiológico”, diz. “Não têm de estar preocupados com isso, só em investir num estilo de vida saudável”, exorta Carolina Neves. O valor de referência da glicemia é inferior a 100 em jejum e, duas horas após as refeições, deverá ser menos de 140.

Como prevenir a diabetes (sem vinagre)

O principal factor de risco para desenvolver diabetes tipo 2 — cujo diagnóstico está relacionado com o estilo de vida — é o excesso de peso. “Podemos evitar o processo que leva à diabetes, a resistência à insulina”, lembra a endocrinologista. “Actualmente, as directrizes focam-se na perda de peso nos indivíduos com mais risco. Quem tem excesso de peso deve perder pelo menos 7% do peso corporal”, aponta.

Reduzir o peso deve estar ligado à promoção da actividade física e uma dieta equilibrada, com o apoio de um nutricionista. Carolina Neves evoca também outros hábitos que são aliados na prevenção da diabetes: reduzir o stress e dormir bem, pelo menos sete horas em cada noite.

O stress, um dos males do século, aumenta a inflamação no corpo e está associado à hipertensão, reforça a especialista. Além disso, muitas vezes tem por consequência comportamentos alimentares de risco, como consumo de alimentos ricos em açúcares e calorias. “É, sem dúvida, um factor de risco para diabetes tipo 2”, diz, sem rodeios.

E ainda há esperança para quem tem um diagnóstico recente, já que “evidência recente” prova que é possível entrar em remissão da doença — uma em cada 20 pessoas consegue. Como? Uma vez mais, controlando o peso corporal: “Uma perda de peso superior a 10 a 15% pode inverter o processo.” Tal proeza é conseguida com orientação multidisciplinar, com endocrinologista e nutricionista, um apoio que a APDP presta.

É provável que o nutricionista o aconselhe a temperar a salada com vinagre de maçã, mas nunca lhe dirá para o beber em jejum, como propõe o TikTok. “Jamais vai substituir uma terapêutica”, termina Carolina Neves.

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