Emigrantes qualificados preferem países do Norte da Europa e Países Baixos

Da “emigração pouco qualificada” para países como França à “emigração qualificada” que prefere “Reino Unido, Países Baixos ou nórdicos”, já não se pode falar de um perfil do emigrante português.

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O valor das remessas aumentou ligeiramente: quase 2% face ao ano anterior, num total de 3,6 mil milhões de euros, ou 1,7% do PIB português daniel rocha

Em 2021, 60 mil portugueses decidiram sair do país. Depois de um 2020 atípico – com a pandemia a ditar uma queda abrupta nas saídas —, 2021 continua uma tendência já antes identificada: cada vez menos portugueses emigram, de acordo com os dados do Observatório da Emigração ​apresentados esta quarta-feira no Ministério dos Negócios Estrangeiros, em Lisboa. Dos que escolhem sair, uma grande parte fica pela Europa.

De acordo com o relatório, o Reino Unido liderou os destinos dos emigrantes portugueses (12.000 entradas), seguindo-se Espanha (8000), Suíça (8000), França (6000) e Alemanha (6000). Os números globais de emigração mostram que há mais de dois milhões de portugueses emigrados em todo o mundo — valor que se mantém estável há vários anos.

Em 2021, migraram metade dos portugueses que saíram do país em 2013. Longe desses números (com a crise da dívida soberana a ditar que muitos portugueses abandonassem o país em 2013), os valores actuais da emigração reflectem uma tendência geral de queda, fruto da “melhoria dos indicadores económicos”, referiu o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, na sessão de apresentação do estudo do Observatório da Emigração.

Países Baixos são um dos destinos que mais cativa

Já não se pode falar do perfil do emigrante português. De acordo com Rui Pena Pires, investigador do Observatório da Emigração e um dos autores do estudo, “há vários perfis”, desde “a emigração pouco qualificada para países como a França, a Suíça ou o Luxemburgo” à “emigração qualificada para o Reino Unido, Irlanda, Países Baixos ou países nórdicos”. Se “há uns seis ou sete anos, entre os portugueses que emigraram para a França, 90% não tinha uma licenciatura”, a verdade é que “hoje temos dois mundos de emigração bastante diferentes e com pouca comunicação entre si”, especifica o sociólogo.

A Europa continua a ser o maior pólo de atracção. Entre os países que actualmente recebem mais emigrantes contam-se os que sempre receberam mais emigrantes portugueses. Tal como na década de 1960, países como a Alemanha, França ou o Luxemburgo continuam a atrair portugueses, ainda que “em menor número” do que antes. Em paralelo, a diáspora portuguesa nesses países está a envelhecer.

Os jovens, esses, preferem países como o Reino Unido (ainda que tenha saído "duplamente afectado pela pandemia e pelo 'Brexit'"), Espanha ou Suíça. Em 2021, “os países nórdicos, como a Suécia, Dinamarca e Noruega”, e os países do Benelux, foram os que mobilizaram mais pessoas. “Dois blocos em que a emigração cresceu muito e a pandemia parece ter sido indiferente”, analisa Rui Pena Pires. Na Dinamarca, a emigração portuguesa cresceu muito durante a pandemia, mas é nos Países Baixos que “mais cresce a emigração em números absolutos significativos": de acordo com os dados do relatório, 3406 portugueses emigraram para o país em 2021.

Os Países Baixos, aventa Rui Pena Pires, “tem crescido muito com o crescimento da emigração qualificada portuguesa. Tem um mercado de trabalho relativamente dinâmico e isso tem permitido que essa emigração portuguesa mais qualificada se concretize num país como a Holanda. Depois, também tem a vantagem de ser um país em que uma boa parte do emprego qualificado se pode fazer em inglês, o que significa que não há o obstáculo da língua que existe noutros países.

O perfil do emigrante para o continente americano também se alterou, com os EUA a destacarem-se como país que mais doutorados recebe. João Peixoto, professor catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão (​ISEG)​, que falou num curto debate à margem da apresentação, alerta para a possibilidade de se perderem profissionais altamente qualificados nestas novas vagas de emigração, sob pena de se ver sair “as classes média e alta” do país. Os mais qualificados, avisa, podem nem querer voltar.

Remessas aumentaram ligeiramente

O valor das remessas aumentou ligeiramente, embora “não seja o mesmo do que há algumas décadas”, refere João Gomes Cravinho. 2021 foi o ano em que os emigrantes enviaram mais dinheiro para Portugal nas últimas duas décadas – um aumento de quase 2% face ao ano anterior, num total de 3,6 mil milhões de euros, ou 1,7% do PIB português, de acordo com o ministro.

Durante a pandemia, a emigração baixou “muito, em todo o mundo” e baixaram também as remessas. “Em 2021, houve a recuperação da emigração”, mas não aos níveis anteriores, de acordo com Rui Pena Pires. “Não foi só a crise económica. Durante a pandemia não houve voos, houve obstáculos físicos à emigração”. Isso notou-se particularmente em locais como Macau e a Austrália, por conta das “restrições prolongadas”.

No que toca ao dinheiro enviado pelos emigrantes, em 2021 o valor cresceu e continua a ser muito importante para Portugal. “Há anos em que nós recebemos mais remessas do que transferências da União Europeia”, afirma o investigador. “Portanto, continua a ser um valor bastante importante, embora com condições de utilização diferentes dos fundos europeus. Os fundos europeus podem sustentar políticas. As remessas sustentam sobretudo a concessão dos investimentos particulares”, explica.

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