Habitação (jovem) em Portugal: até quando se vai adiar esta geração?

Como é que um jovem pode solicitar um crédito para habitação quando apresenta pouca fiabilidade de cumprimento para com a instituição financeira?

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LUSA/JOÃO RELVAS

Poderá um jovem comprar uma casa? Poderá um jovem arrendar uma casa? Ou continuar-se-á a adiar esta geração?

Esta é a primeira questão que devemos levantar, aprofundando de seguida os porquês. Os trabalhos são extremamente precários, um flagelo que urge combater se efectivamente pretendemos capitalizar o nosso país e dar oportunidade a esta nova geração de puder vingar onde nasceu e não onde foi compelido a ir, construindo-se um novo contrato social. É imprescindível combater o desemprego jovem que atingiu, em 2021, 23% entre os 15 e os 24 anos. Como combater o desemprego jovem? Oferecer bons vencimentos, contratos de trabalho justos e que garantam a estabilidade financeira e emocional, proporcionando-se a escolha entre um home office ou um modelo híbrido ou totalmente presencial.

À luz de um estudo da Fundação Francico Manuel dos Santos, que teve por base um universo de 2,2 milhões de jovens entre os 15 e os 34 anos de idade, os rendimentos de três quartos dos jovens (72%) não ultrapassam os 950 euros líquidos por mês. Quantos anos é que um jovem demorará a juntar os 10% de entrada para uma casa? 100 anos? 50? Demorará talvez um, se viver a pão e água. O preço das casas subiu 50% nos últimos cinco anos e o valor mediano das casas em Portugal ultrapassou os 2400 euros por metro quadrado em Outubro de 2022. Somente 12% dos jovens pretendem viver em casas arrendadas; e os restante 88% que pretendem ter casas próprias? A solução da habitação tem de abranger ambas as escolhas.

Como é que um jovem pode solicitar um crédito para habitação quando apresenta pouca fiabilidade de cumprimento para com a instituição financeira? É-lhe exigido fiador, contratos “seguros”, garantias. Portugal é o país da União Europeia (UE) onde os jovens mais tarde voam e se emancipam, saindo de casa dos pais aos 33,6 anos, sendo que a média comunitária é de 26,5 anos. Medidas relevantes para superar esta adversidade seriam o Estado, através da Caixa Geral de Depósitos, financiar a 100% os créditos aos jovens até aos 35 anos na compra da primeira habitação própria permanente, bem como, através de um mecanismo de garantia mútua pública, o Estado passava a ser o fiador do jovem.

É fundamental isentar o IMT e o imposto de selo na compra da primeira habitação própria permanente do jovem, bem como isenção de IMI nos primeiros cinco anos. Por outro lado, o Estado português apresenta actualmente um parque habitacional de 2%, valores muito baixos quando comparamos com outros países da UE: a Holanda, por exemplo, apresenta um parque habitacional entre os 20 e os 30%, sem esquecer que a média comunitária se fixa nos 12%. Para tal, deve ser aumentado pelo menos 5% por ano até se atingirem valores que nos permitam combater naturalmente a especulação imobiliária.

Neste parque público de habitação, uma percentagem deve ser exclusiva para jovens, existindo imóveis para venda a custos controlados/não especulativos para jovens, uma outra fatia deve ser destinada a arrendamento jovem, assegurando a liberdade de escolha entre os preferem a instalação permanente e os que elegem a mobilidade geográfica. Uma outra parte deve ser alocada a habitação social pulverizada, acabando-se com a “guetização”. Paralelamente, as cooperativas de habitação devem ser “acreditadas” novamente, não as deixando cair em desuso, impulsionando-as, garantindo um maior apoio financeiro, jurídico e técnico. Devem ser criadas e estimuladas cooperativas de habitação jovem.

Deve isentar-se o IVA sobre todos os materiais de construção da primeira habitação própria permanente dos jovens e para as cooperativas de habitação. Todavia, toda e qualquer estratégia de habitação pública deve priorizar os imóveis devolutos pertencentes ao erário público, asseverando uma optimização e não desperdício de recursos públicos. Em relação ao mercado do arrendamento, deve existir uma limitação do aumento mediante as condições económico-financeiras dos jovens, assim como um limite mínimo temporal no vínculo contratual nesta senda, apostando-se ainda em estratégias de subarrendamento. É igualmente importante realizar um estudo sobre o impacto das parcerias público-privadas em matéria de construção de habitação pública.

O futuro depende de todos nós, do Estado, do sector privado e da sociedade civil. Cumpriremos o nosso papel? Estará o direito à habitação a ser efectivado? Ou o artigo 65 da nossa Constituição é “letra morta”? Os jovens não querem casas de lego, querem casas reais.

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