Mostrar gratidão é bom. Então, porque é que não agradecemos mais?

Muitas pessoas não percebem o quanto um simples gesto de agradecimento pode significar, segundo as investigações mais recentes.

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Priscilla du Preez/Unsplash

Agradecer é bom tanto para quem agradece, como para quem recebe o agradecimento. Então, por que não expressamos gratidão com mais frequência?

A investigação indica que muitas pessoas não percebem o quanto um simples gesto de agradecimento pode significar. Num estudo de 2018 publicado na Psychological Science, foi pedido a mais de 300 participantes que escrevessem uma carta de agradecimento a alguém que tivesse tido um impacto positivo nas suas vidas – pais, amigos, treinadores ou professores.

Foi também pedido aos autores das cartas que previssem o quão surpreendidos, felizes e envergonhados os destinatários se iriam sentir depois de a receberem. Os investigadores acompanharam depois os destinatários para ver que sentimento diziam ter experienciado.

Os autores das cartas subestimaram, de forma consistente, o quanto as pessoas gostam de ser apreciadas. E os destinatários das cartas acharam o gesto menos estranho do que aquilo que os escritores previram. Resumindo, há uma probabilidade muito maior de um gesto de gratidão contribuir para melhorar o dia de alguém do que aquilo que as pessoas que agradeciam esperavam.

“No dia-a-dia, parece que não compreendemos totalmente a magnitude do impacto do que fazemos nas outras pessoas”, diz Amit Kumar, professor de Marketing e Psicologia da Universidade do Texas em Austin e autor do estudo.

Essa expectativa mal calibrada pode ajudar a explicar por que não expressamos a nossa gratidão com mais frequência, explica Kumar. “Essencialmente, se a pessoa acha que não vai ter muito impacto, pode não se preocupar em fazê-lo”, disse.

Por que razão não agradecemos tanto como devíamos

Subestimar o impacto de um gesto de gratidão no destinatário pode dever-se também a um desencontro nas perspectivas entre o dador e o receptor. As palavras não ditas e os agradecimentos não feitos podem ser devido a esses equívocos.

Kumar e seus colegas chegaram à conclusão de que os participantes que escreveram as cartas de agradecimento estavam concentrados na forma – será que a carta foi articulada e eloquente o suficiente?

Mas as pessoas que receberam essas cartas importaram-se mais com os sentimentos de cordialidade interpessoal e não com a forma como a carta de agradecimento estava escrita: ficaram felizes simplesmente por receber a carta em primeiro lugar.

“Em alguns casos, essa preocupação exagerada com a competência pode, na verdade, dificultar este tipo de iniciativa, diz Kumar.

Os participantes neste estudo, curiosamente, disseram que desejam realizar essas iniciativas pró-sociais com mais frequência. Todavia, ao subestimar os benefícios de partilhar um gesto de gratidão com o destinatário, construímos barreiras tanto para o nosso próprio bem-estar, como também para o daqueles com quem nos importamos.

Infelizmente, não há muitas oportunidades para recalibrar a noção de como o nosso apreço teve impacto no dia de alguém, o que pode tornar mais difícil superar essa “barreira mal colocada”. Isso também significa perder os benefícios de expressar gratidão; estudos mostram de forma consistente que hábitos como escrever aquilo pelo que estamos gratos melhora a felicidade e o bem-estar.

A investigação mais recente na área da cognição social atesta que temos uma tendência para a “subsocialidade”, em que subestimamos o quão positivamente os outros respondem às nossas acções. Isto estende-se a todas as formas de comportamento pró-social, seja através da realização de boas acções, pedidos de ajuda ou apenas ao iniciar uma conversa.

Mas ter a intenção de agradecer, quando nos sentimos gratos, pode fazer a diferença.

Gratidão ajuda a unir-nos

“No final de contas, tudo se resume a isto: a maioria das pessoas quer ser valorizada”, diz Sara Algoe, psicóloga que coordena o Laboratório de Emoções e Interacções Sociais em Relacionamentos da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, nos Estados Unidos. “Precisamos de relacionamentos sociais, valorizamos relacionamentos sociais, ansiamos por estar ligados a pessoas.”

A gratidão é um catalisador único, não apenas para encontrar essas conexões, mas também para as fortalecer, diz Algoe. A teoria “encontrar-lembrar-e-vincular” sugere que sentir gratidão nos ajuda a encontrar novos contactos, lembra-nos que as conexões actuais se preocupam connosco e reforça os laços que nos unem.

Num estudo de 2022 publicado no Scientific Reports que envolveu 125 casais numa experiência de campo de cinco semanas, Algoe e seus colegas descobriram que incentivar um parceiro a expressar mais gratidão levou a que o casal passasse mais tempo junto.

Na experiência, metade dos casais tinha uma pessoa que era encorajada a expressar a sua gratidão sempre que se sentia grata. Tudo foi montado para “capitalizar as oportunidades naturais das pessoas de sentir gratidão e mostrar-lhes que existem oportunidades de a expressar e, em seguida, fazer com que elas façam um plano para a demonstrar”, disse Algoe.

O parceiro que expressava gratidão também foi incentivado a manter essa tarefa extra em segredo, para que o seu apreço fosse percebido como mais genuíno. (A maioria dos parceiros manteve o segredo, mas um confessou que falaram sobre a experiência assim que saíram do laboratório, conta Algoe.)

Os que foram encorajados a expressar gratidão partilharam-na com os seus parceiros com mais frequência; o tempo que esses casais passavam juntos aumentou em média 68 minutos por dia, o que representa mais investimento social e laços sociais mais fortes.

“Acho que uma das grandes conclusões é que a gratidão pode contribuir para o bem-estar, e isso acontece, porque nos ajuda a sentirmo-nos ligados às outras pessoas”, diz Kumar.

Como expressar gratidão

Provavelmente tem pessoas na sua vida às quais está grato. Então, como expressar essa gratidão? “A primeira coisa é fazê-lo”, diz Algoe. “Não se esqueça desse passo básico. E não pense de mais.”

Também pode facilitar a expressão de gratidão. Kumar conta que, depois de ver os benefícios da gratidão no seu estudo, começou a manter um stock de cartões de agradecimento na sua secretária para se lembrar de expressar gratidão com mais frequência no dia-a-dia.

Algoe sugere repensar o objectivo da gratidão. Diz que se trata de enfatizar o outro no “obrigada”. “É subtil, apenas desviar a atenção de nós mesmos e voltá-la para os outros e para o que há de bom nas suas acções”, explica.

Por fim, lembre-se apenas de que dizer obrigado realmente faz a diferença. “Não é um grande esforço”, diz Kumar. Mas uma pequena mudança na frequência com que se expressa gratidão pode fazer uma “grande diferença, quando se trata de como nos sentimos e como tratamos os outros”.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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