Menos equilíbrio, mais risco de morte. Mas é possível prevenir, garantem especialistas

Com a idade, a capacidade de equilíbrio vai diminuindo naturalmente. É possível contrariar essa tendência com exercícios simples, aconselham as especialistas em fisioterapia e medicina desportiva.

Foto
A incapacidade de nos equilibrarmos está associada a um aumento de 84% do risco de morte Paulo Pimenta

Equilibrar-se numa só perna durante pelo menos dez segundos pode parecer um exercício banal, mas trata-se, afinal, de uma questão de sobrevivência. O equilíbrio ou controlo postural é fundamental para a saúde e perdê-lo aumenta o risco de morte, avisa um estudo recente publicado na revista científica de medicina desportiva britânica British Journal of Sports Medicine. É possível começar a prevenir desde cedo a perda de equilíbrio e com exercícios simples, aconselham as especialistas, em conversa com o PÚBLICO.

Publicado no início deste ano, o estudo, feito com 1700 indivíduos de meia-idade ao longo de uma década, dá conta de que a incapacidade de nos equilibrarmos está associada a um aumento de 84% do risco de morte por qualquer causa. “É um estudo de associação, não podemos relacionar causalidade”, avisa Monserrat Conde, fisioterapeuta e investigadora na área do envelhecimento e longevidade na Universidade de Oxford, no Reino Unido.

A académica reconhece, contudo, a importância das conclusões para o alerta do risco de quedas, especialmente importante entre as pessoas com mais de 60 anos. A médica especialista em Medicina Desportiva do Instituto CUF do Porto, Maria João Sá concorda: “A partir de certa idade, começamos a perder algumas das capacidades somatossensoriais, a perder força e controlo postural, faz parte do processo de envelhecimento.”

Maria João Sá prefere falar de controlo postural em vez de equilíbrio, por ser uma definição mais abrangente, que “envolve a capacidade que temos, por exemplo, ao recebermos informações visuais” de adaptarmos a postura. Esse controlo engloba os músculos posturais, o aparelho vestibular e compreender “a posição relativa a esses objectos”.

Já Monserrat Conde define o equilíbrio como “a capacidade que temos em manter o centro de gravidade projectado sobre uma base de sustentação”. “O bom equilíbrio permite que consigamos manter a estabilidade sem cair, mesmo que a base seja mais reduzida ou aumentada”, explica a fisioterapeuta, presidente do grupo de interesse em envelhecimento da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas. Quando damos conta de que nos podemos desequilibrar, acrescenta, tentamos aumentar a base de sustentação, nomeadamente “afastando os braços do corpo”. “Todas essas reacções naturais vão ficar mais lentas com a idade”, nota.

Essa diminuição na capacidade de resposta a alterações no controlo postural é uma das principais responsáveis pelo aumento do risco de quedas, que Maria João Sá não tem receio de classificar como “um flagelo”, com implicações não só a nível da saúde física, mas também mental. A Organização Mundial de Saúde estima mesmo que 684 mil quedas fatais ocorram todos os anos — esta é a segunda principal causa de morte acidental.

É claro que o problema não afecta só idosos e a especialista em medicina desportiva exemplifica: “Há atletas que se lesionam mais do que outros e tem que ver com o sistema somatossensorial. O atleta, se sentir que o tornozelo não está na posição correcta, consegue evitar a lesão ao corrigir essa postura.”

Ou seja, observa a médica da CUF, “o mesmo se aplica aos mais velhos”. “Quanto mais conseguimos optimizar essa capacidade [de reacção] e mantê-la ao longo da vida”, menos quedas vão acontecer na idade sénior. Perder o equilíbrio tem por principal culpado, acusa Maria João Sá, o sedentarismo e a consequente obesidade, que limita a locomoção.

“Passamos 40% da nossa marcha apoiados numa perna. A capacidade de nos mantermos equilibrados é fundamental e interfere com todas as áreas da nossa vida”, alerta, também, Monserrat Conde. A fisioterapeuta defende que a avaliação do equilíbrio deverá fazer parte do controlo de rotina por parte das equipas de saúde, sobretudo em momento de transição no ciclo da vida adulta, como depois da gravidez, uma forma de prevenção, já que “o envelhecimento saudável é feito ao longo da vida”.

Exercícios para melhorar o equilíbrio

As duas especialistas concordam que para manter o equilíbrio durante o mais tempo possível é fundamental começar a treiná-lo desde cedo. “O bom é inimigo do óptimo. Temos uma população muito sedentária. Se aplicarmos algo tão simples como caminhar regularmente, vamos melhorar. Vai ter menos peso e melhorar a densidade óssea. Logo, será fisicamente mais capaz”, defende Maria João Sá. “É que depois não há medicamento que devolva o equilíbrio, nem a força”, avisa.

Monserrat Conde aconselha, por seu lado, a prática de alguns exercícios funcionais que “desafiam o equilíbrio” e são uteis do ponto de vista da prevenção das quedas. “Por exemplo, levantar e sentar só com um pé no ar”, sugere. Tente também dar passadas mais largas e manter a estabilidade. Pode, igualmente, andar como se tivesse uma linha imaginária que tem de seguir, mantendo um pé sempre em frente ao outro. “Independentemente da nossa idade, são coisas que podemos ir introduzindo. Por exemplo, enquanto estou a lavar os dentes, manter só um pé no chão”, propõe.

Para quem preferir algo mais divertido, a fisioterapeuta sugere dançar como uma actividade que desafia o equilíbrio, ao mesmo tempo que se associa ao lazer. Seja como for, assevera Maria João Sá, importa é “incluir o exercício nas nossas rotinas”. A médica termina com o alerta de que “a perda de equilíbrio súbita” não é normal e, nesses casos, deve procurar ajuda imediata.

Sugerir correcção
Comentar