Padre denunciou 12 sacerdotes por suspeitas de pedofilia. Metade ainda está no activo

Uma reportagem do Expresso expõe o caso de um sacerdote que denunciou outros 12 por suspeitas de pedofilia. Alguns dos casos remontam aos anos 90. Várias testemunhas dizem que os abusos ocorreram em casas paroquiais e em carros. Uma das vítimas, na época com 15 anos, suicidou-se.

Foto
O sacerdote que avançou com as denuncias encheu vários dossiers com informações ao longo dos anos SANDRA RIBEIRO

Um padre denunciou 12 sacerdotes por suspeitas de pedofilia no seio da Igreja Católica. A informação é avançada pelo jornal Expresso que dá ainda conta de que metade dos visados permanece no activo. Alguns dos casos remontam aos anos de 1990.

De acordo com a reportagem, há cerca de dois meses, o padre (que acompanha estes casos desde os anos de 1980) deu “todas as informações de que dispunha” à Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja. O sacerdote, apelidado ficticiamente de “Cardoso”, encheu vários dossiers com informações que foi recolhendo durante vários anos. Dois desses dossiers contêm informações de dois casos de pedofilia que terão começado nos anos 90, um deles já afastado da Igreja e o outro ainda no activo numa capital europeia.

“Eles estiveram juntos pelo menos dois anos em meados da década de 90. E protegeram-se das sucessivas acusações que os jovens alegadamente abusados por eles lhes iam fazendo. Fizeram um pacto de silêncio e ameaçavam quem pretendesse fazer queixas a outras instâncias na Igreja”, revela citado no mesmo jornal.

O padre terá reunido vários testemunhos de vítimas que afirmam ter sido assediadas e abusadas em casas paroquiais, carros, numa casa junto à praia e até num apartamento turístico em Armação de Pêra. ​Um dos casos agora noticiados diz respeito a um padre que teria abusado sexualmente de um jovem de 15 anos no final da década de 1990 na paróquia da Cruz Quebrada, no concelho de Oeiras.

Caso arquivado

Na altura, a família apresentou uma denúncia formal ao Patriarcado de Lisboa. Mas o rapaz de 15 anos acabou por se suicidar, presumivelmente devido aos abusos sexuais sofridos.

O padre foi transferido para uma outra paróquia em Lisboa, onde surgiram mais denúncias de abusos sobre menores. Mais tarde viria a ser colocado numa paróquia numa capital europeia, onde continua em funções.

O Patriarcado de Lisboa revela ao Expresso que abriu uma investigação ao clérigo em Maio de 2013, quando também era alvo do Ministério Público (MP), depois de uma denúncia sobre abusos sexuais a menores ter chegado à Rede de Cuidadores, liderada por Catalina Pestana. O padre suspeito foi ouvido, mas o caso acabou por ser arquivado, tanto pela Igreja como pelo MP.

O segundo padre terá deixado um rasto de vítimas no Vimeiro (Alcobaça) e em duas paróquias em Lisboa. “Segui-o de muito perto. E fiz a primeira queixa contra ele ao então patriarca José Policarpo, em 1997. Mas que de nada serviu”, avança o padre denunciante citado no mesmo jornal, que revela ainda que pelo menos um dos ex-acólitos que assistiu aos avanços do sacerdote também já testemunhou na Comissão Independente. A lista de alegadas vítimas foi crescendo e chegou a ultrapassar a dezena, até 2012 e 2013. Foi este o padre que terá convidado um grupo de quatro jovens para “uma semana de férias no Algarve”, em Armação de Pêra.

“Um dia, convidou-me e a três amigos para irmos passar uma semana de férias no Algarve. Numa noite entrou no quarto onde dormíamos. Acordei quando me apalpava e tentava beijar-me no escuro”, relata uma das alegadas vítimas ao Expresso. “Gritei e empurrei-o da cama. Alguém acendeu a luz e vi o padre a fugir dali para fora. No dia seguinte agiu como se nada fosse.”

Ao todo, o padre denunciante relatou 12 casos de abusos sexuais contra menores praticados por membros da Igreja Católica, metade dos quais ainda permanece no activo. Um dos sacerdotes acusado de pedofilia chegou a ser alvo de extorsão por parte dos pais de uma das vítimas, tendo a família exigido dinheiro em troca do silêncio. Este caso aconteceu em 2002 e nunca chegou ao MP. O padre em questão já não pode ser investigado, uma vez que morreu há dois anos.

Face às mais recentes informações, o Presidente da República afirmou que é “incumbência das autoridades públicas prosseguirem com a sua investigação”.

Marcelo Rebelo de Sousa apelou ainda “a todos aqueles que podem participar e denunciar [casos de pedofilia] independentemente da iniciativa das entidades públicas”. Depois de as denuncias serem avançadas, “compete ao Ministério Público prosseguir a investigação ou não, conforme os elementos que tem. O papel da Justiça é investigar”, concluiu.

Sugerir correcção
Ler 21 comentários