NAV quer voos nocturnos excepcionais em Lisboa. Zero diz que é “expansão encapotada”

Entidade pública responsável pela gestão do espaço aéreo diz que a ideia é distribuir os voos ao longo de mais horas, entre 18 de Outubro e 29 de Novembro.

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Aeroporto tem um regime de restrição de voos nocturnos, que estabelece um limite de 91 voos semanais patricia martins

A associação ambientalista Zero considera que a actualização do sistema de controlo de tráfego aéreo do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, visa adequá-lo “à nova capacidade aeroportuária”, sendo por isso uma “expansão encapotada”.

A NAV quer o alargamento do horário dos voos em Lisboa durante a noite, entre Outubro e Novembro, para a implementação do novo sistema de controlo Top Sky, disse fonte da empresa à Lusa.

De acordo com uma fonte oficial da NAV, trata-se de alargar o horário dos voos para o período nocturno, não para aumentar o volume de tráfego, mas sim para distribuir os voos ao longo de mais horas, permitindo, assim, a actualização do sistema de controlo tráfego aéreo, a partir de 18 de Outubro e até 29 de Novembro, ao abrigo de um regime excepcional.

No entender da Zero, ainda que “temporariamente”, estarão abertas as portas para aviões sobrevoarem a capital 24 horas por dia sem quaisquer restrições, “com impactos devastadores em mais de 150.000 cidadãos afectados por níveis de ruído insalubres e fora da lei com origem no tráfego aéreo”.

A par da criação de duas pistas rápidas, a associação acredita que a actualização do sistema de controlo de tráfego aéreo servirá para o adequar à nova capacidade aeroportuária prevista para a Portela, que prevê passar de 38 para 46 voos por hora — ou seja, quase um voo por minuto —, ainda antes da criação de um novo aeroporto.

E admite ainda que “este conjunto de acções deveria constar de um plano de expansão da capacidade aeroportuária do Aeroporto Humberto Delgado submetido a um procedimento de Avaliação Ambiental, conforme a legislação”. E, acrescenta, “com esta prática de dividir o projecto em pequenas fatias – designada de salami slice –, a ANA Aeroportos, com a conivência do Governo, visa precisamente evitar a realização do obviamente necessário Estudo de Impacto Ambiental”, diz a Zero, considerando ser uma prática “ilegal”.

O aviso para a consulta de interessados foi publicado na quarta-feira, para dar início ao procedimento para aprovar uma portaria que permita um regime excepcional relativo à operação de aeronaves no Aeroporto Humberto Delgado.

Para a associação ambientalista, os documentos colocados agora à disposição para que os cidadãos e entidades se possam constituir interessados são “extremamente parcos na sua fundamentação”, lendo-se apenas que a abolição das restrições aos voos nocturnos se justifica com a “necessidade de actualização do sistema de controlo tráfego aéreo por razões de segurança operacional da aviação civil”, sem dar nenhum contexto ou justificação técnica e sem nunca referir quanto tempo durará essa actualização.

E critica ainda que a constituição de interessados para esta consulta pública seja feita em pleno período de férias de verão, por duas semanas, “propiciando que passe despercebida e tenha fraca participação”.

Regime de restrição não é cumprido

O aeroporto de Lisboa está sob um regime de restrição de voos nocturnos, que estabelece um limite de 91 voos semanais entre as 00h00 e as 6h00, devido ao ruído. Por isso, é expectável que durante a implementação do novo sistema de tráfego, este valor venha a ser ultrapassado.

Em Julho, a Zero denunciou também que os níveis de ruído no aeroporto de Lisboa ultrapassam os limites legais e alertou que o regime de restrição de voos nocturnos também não é cumprido, citando medições feitas na semana iniciada a 11 de Julho e que apontavam para um total de 140 movimentos entre as 00h00 e as 6h00.

O projecto Top Sky, comum a mais outros seis países e coordenado pelo Eurocontrol, foi apresentado pela NAV em 2019 e prevê um investimento de 103,8 milhões de euros, até 2023.

O secretário de Estado das Infra-estruturas, Hugo Mendes, assinou o documento publicado na quarta-feira, para publicitação do início do procedimento para a criação do regime excepcional, tendo agora os interessados dez dias para se pronunciar, período após o qual o diploma entrará em consulta pública e será conhecido em maior detalhe.

A portaria está a ser preparada pelo Ministério das Infra-estruturas e da Habitação e pelo Ministério do Ambiente e da Acção Climática e, segundo fonte ligada ao processo, vai contemplar medidas de mitigação.

A Zero apela à participação nesta consulta pública e pede ainda à Câmara de Lisboa que tome uma “posição firme” sobre esta situação.

Texto actualizado às 18h30: Inclui reacção da Zero

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