Alemanha espera “solidariedade” dos países menos dependentes do gás russo

Em Berlim há uma expectativa de que países como Portugal e outros que importem menos gás da Rússia sejam “solidários” com os mais dependentes. Espanha já recusou a proposta: “Ao contrário de outros países, nós espanhóis não vivemos acima das nossas possibilidades do ponto de vista energético.”

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A Alemanha espera para ver se a estatal russa Gazprom recomeça a fornecer gás esta quinta-feira através do Nord Stream 1 ANATOLY MALTSEV/EPA

Na Alemanha, a notícia do plano da Comissão Europeia para a redução do uso de gás foi dada com uma palavra a ter especial destaque: solidariedade. Ao explicar na emissora pública ARD as medidas apresentadas em Bruxelas, a correspondente Katharina Wallrafen notava que a ideia era que os países fossem solidários e trabalhassem em conjunto, “tal como na covid”, quando esta estratégia funcionou, comentou. Se um país ficar sem reservas de gás, outros poderão ajudar e compensar. “Um por todos, e todos por um”, comentou a pivot.

“Mas todos estão de acordo?”, perguntou a pivot. Ainda não é certo, explicou a correspondente, notando que a “solidariedade é voluntária”, e que a situação dos países da União Europeia em relação ao gás russo é muito diversa, entre países muito dependentes, como a Alemanha, e outros menos. “Mas espera-se que países como Portugal, que não é tão dependente do gás russo, e que outros países na mesma situação também apoiem esta medida e sejam solidários.”

Uma das primeiras reacções veio de Espanha, onde a ministra para a Transição Ecológica, Teresa Ribera, recusou a ideia: “A nossa solidariedade seria muito mais útil se podermos usar as nossas infra-estruturas para levar gás ao resto dos europeus”, declarou, citada pelo jornal espanhol El País, numa referência à ambição ibérica de concluir a construção da rede de interconexões energéticas.

Ribera também se queixou de o governo espanhol não ter sido ouvido e não deixou de lançar uma farpa à Alemanha: “Ao contrário de outros países, nós espanhóis não vivemos acima das nossas possibilidades do ponto de vista energético.”

"Ameaça nos dois próximos invernos"

O responsável pelo organismo regulador de energia da Alemanha, Klaus Müller, disse numa entrevista publicada no domingo pelo jornal Bild am Sonntag que o país “irá provavelmente ter de viver com a ameaça de ficar sem gás durante os dois próximos invernos”. Müller acrescentou que países como a Noruega, Bélgica ou Países Baixos poderiam ajudar a compensar uma falta de gás na Alemanha, e fez ainda um apelo a que as pessoas não ficassem em pânico com esta possibilidade.

O responsável sublinhou que muito depende do que vai acontecer com as importações de gás russo através do Nord Stream 1.

A estatal russa Gazprom começou a reduzir o fluxo de gás no Nord Stream 1 a meio de Junho, dizendo que a razão era manutenção – algo que foi recusado desde a primeira hora pelo ministro da Economia e Clima da Alemanha, Robert Habeck, que apontou outros motivos a Moscovo: “é obviamente uma estratégia para desestabilizar e aumentar os preços” do gás.

Foi nessa altura que o governo de Berlim elevou para o nível dois o seu plano de alerta de gás, aconselhando os consumidores (quer particulares, quer industriais) a reduzir ao máximo o seu consumo de energia. O plano tem três níveis; o mais grave prevê racionamento.

O fluxo de gás através do Nord Stream 1 está actualmente interrompido para uma manutenção anual de dez dias, que chega ao fim esta quinta-feira (dia 21), e levou a muita especulação sobre se o fornecimento seria retomado e se sim, em quanto. A Rússia já cortou, em Abril, o fornecimento de gás à Polónia e Bulgária.

O presidente russo, Vladimir Putin, comentou esta quarta-feira que é possível que haja “problemas” no gasoduto que obriguem a reduzir o fluxo para metade – e acrescentou que “temos uma via construída, o Nord Stream 2”, que poderia ser posta em funcionamento.

O Nord Stream 2 está concluído, mas não certificado. O governo alemão anunciou que não iria continuar o processo de certificação em Fevereiro, quando se tornou claro que a Rússia iria mesmo invadir a Ucrânia, o que foi visto como o sinal de que a Alemanha estava pronta a admitir pagar um preço significativo por sanções à Rússia.

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