Médicos dizem que Plano Nacional Saúde 2021-2030 está incompleto

Doença renal crónica e patologias reumáticas musculo-esqueléticas são duas áreas onde documento peca por omissão, diz Miguel Guimarães.

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Rui Gaudencio

A Ordem dos Médicos considera que o Plano Nacional de Saúde (PNS) 2021-2030 está incompleto e aponta omissões nas áreas da doença renal crónica, que atinge 10% a 20% dos portugueses, e das doenças reumáticas musculo-esqueléticas.

A Ordem dos Médicos diz também que o PNS “ignora o enorme peso dos problemas referentes ao sistema nacional de saúde e, em particular, ao Serviço Nacional de Saúde”, sublinhando que “a ausência de um diagnóstico quanto às próprias estruturas do sistema faz com que o plano elaborado esteja incompleto e impossibilita o cumprimento de outros objectivos na próxima década”.

Para o bastonário Miguel Guimarães há várias questões importantes que “não foram devidamente avaliadas” naquilo que se pretende num Plano Nacional de Saúde para os próximos 10 anos. “Vamos ter alterações nos fluxos migratórios - já estamos a ter e vamos ter ainda em maior escala - e isso não está previsto no Plano Nacional de Saúde”, exemplifica, insistindo em que “estes planos obrigam a determinado tipo de opções e, se calhar, a algumas intervenções para que essas pessoas possam ter acesso a cuidados de saúde, para que possam ser integradas. E nada disso está previsto”.

Na posição que emitiu na consulta pública do PNS 2021-2030, a Ordem diz que não é dada a devida relevância à doença renal crónica, recordando que é “muito prevalente” -- atinge 10% a 20% da população portuguesa e “deverá aumentar nas próximas décadas”. Estima-se que em 2040 seja a quinta causa de anos de vida perdidos.

“A doença renal crónica está ligada a uma parte daquilo que são os custos que o Estado tem nas parcerias que faz para assegurar serviços, como é o caso da hemodiálise”, sublinha o bastonário, destacando igualmente o “enorme esforço” que o país tem feito na área da transplantação.

“Não se enquadrando exactamente nos indicadores definidos pela Direcção-Geral de Saúde para o Plano Nacional de Saúde, a verdade é que nós temos uma posição dominante a nível internacional na área da transplantação, estamos no top 3 mundial, mas ninguém liga”, acrescenta o mesmo responsável, considerando que esta era “uma boa oportunidade de associar a doença renal crónica e ter uma boa estratégia para a área da transplantação”.

A Ordem sublinha que as despesas com os doentes renais crónicos representam cerca de 2% do orçamento da Saúde, correspondendo o custo com hemodiálise a mais de 35% de todo o sector convencionado do Estado, o que equivale a um aumento de quase 15% na última década. Considera, por isso, essencial a inclusão de estratégias de prevenção, diagnóstico precoce e a criação de condições para aumentar as modalidades domiciliárias de terapêutica de substituição da função renal e optimizar a articulação entre a Rede de Cuidados de Saúde Primários, o sector social, a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e de Cuidados Paliativos e as unidades responsáveis pelo tratamento dos doentes renais crónicos terminais.

Diz ainda que o PNS também “não valoriza as doenças reumáticas musculo-esqueléticas”, uma das patologias crónicas do adulto “mais dominantes em Portugal”, com “uma prevalência de 53% na população e um impacto social e laboral significativo - superior a mil milhões de euros de despesa”.

“O absentismo resultante destas patologias custa ao Estado português aproximadamente 204 milhões de euros por ano. Já as reformas antecipadas custam 910 milhões de euros por ano”, recorda a Ordem dos Médicos, acrescentando: “Questões como o diagnóstico precoce, a acessibilidade às especialidades as co e multimorbilidades estão omissas na estratégia”.

O bastonário insiste: “Se eu tiver um Plano Nacional de Saúde e definir determinado tipo de estratégias, sem falar nas alterações que têm de acontecer nos serviços de saúde para que elas sejam concretizáveis, é curto”.

Diz ser essencial ter orçamentos plurianuais e uma “lei de meios” que defina estritamente parcelas para determinadas áreas, “como o investimento em equipamentos, ou em prevenção, protegendo o investimento nestas áreas”.

“Neste momento, não temos um fio condutor. Temos parcelas no orçamento, mas não são estanques, o dinheiro circula, há cativações, há suborçamentação dos hospitais (...) e estamos sempre em prejuízo”, acrescenta. A Ordem dos Médicos lembra igualmente que não concorda com a posição assumida no documento relativamente aos problemas da mortalidade materna, cuja taxa, segundo os últimos dados divulgados, subiu em 2020 para 20,1 óbitos por 110 mil nascimentos, o nível mais alto dos últimos 38 anos.

“A mortalidade materna tem de ser explicada pela DGS. As questões da mortalidade materna têm sofrido algum desgaste e isto leva-nos a pensar no que não estamos a fazer bem. Tem de ser avaliado”, preconiza Miguel Guimarães.

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