Vale a pena apostar no sal dos Himalaias?

É importante perceber que a luta contra a hipertensão se faz perdendo peso, praticando mais exercício, ingerindo mais hortifrutícolas e encontrando estratégias para reduzir o sal da alimentação sem que isso a torne desenxabida.

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O sal dos Himalaias não tem nenhum efeito detox no nosso organismo DR

O sal dos Himalaias é extraído das minas de Khewra, no Paquistão, e tem uma coloração rosada que lhe confere uma aura mais “mística” e saudável. Se fizer uma breve pesquisa online por sal rosa dos Himalaias, vai encontrar alegações de que é o “sal mais puro do mundo”, tem “mais de 84 minerais diferentes”, para além de uma miríade de efeitos positivos na saúde como “detox” de metais pesados, diminuição da pressão arterial, aumento da libido, “anti-aging”, melhoria da saúde cardiovascular, etc.. É engraçado verificar que para além de não existirem provas científicas para estas alegações, elas são, inclusivamente, contraditórias!

Este sal é cor-de-rosa precisamente por não ser “puro”! É o óxido de ferro (vulgarmente conhecido como “ferrugem”) e outras impurezas que lhe conferem essa coloração, uma vez que o sal mais refinado é justamente branco, dada essa maior “pureza” de outros componentes que vão para além do cloreto de sódio. Para além de não ter nenhum efeito detox no nosso organismo, dos “84 minerais” que este “completíssimo” sal possui fazem parte alguns desses metais pesados como o chumbo, cádmio, titânio e alumínio (presentes em quantidades demasiado baixas para exercer algum efeito nefasto no nosso organismo).

Quanto aos minerais que realmente interessam do ponto de vista nutricional, a média de 31 amostras de sal rosa dos Himalaias disponíveis comercialmente verificou que comparativamente com o sal de mesa tradicional, o sal rosa possui maiores níveis de cálcio, ferro, magnésio e potássio e sobretudo menores níveis de sódio (39,5% vs. 42,8%). Se isto até parece positivo, são diferenças totalmente irrelevantes quando se ajusta às quantidades de sal recomendadas diariamente. Traduzindo para as recomendações da OMS (5g/dia), a quantidade de sódio ingerida caso consumíssemos sal dos Himalaias em detrimento do sal de mesa tradicional seria, no limite, 0,165g inferior. Relativamente aos restantes minerais cuja concentração é superior no sal dos Himalaias, o mesmo raciocínio pode ser aplicado e facilmente se percebe que, apesar de possuir uma maior concentração por quilograma de sal, o impacto que o consumo do sal dos Himalaias teria na nossa ingestão de minerais seria praticamente nula na alimentação quotidiana.

Existe até um trabalho recente de 2021 que comparou o impacto da ingestão de sal dos Himalaias e de sal de mesa na pressão arterial e na concentração urinária de sódio de 17 mulheres hipertensas. Sem surpresa, não se observaram diferenças significativas na pressão arterial nem na excreção urinária de sódio entre os grupos que receberam sal dos Himalaias e sal de mesa.

Outra das modas é a utilização de candeeiros de sal dos Himalaias para fins estéticos e “anti-stress”, que não trará logicamente nenhum risco para a saúde, mas apenas ajudará à exploração crescente destas minas com todo o problema de sustentabilidade ambiental e exploração laboral associado. Para quem tem cães e sobretudo gatos em casa, é necessária atenção redobrada, pois a atracção pela luz e cor do candeeiro pode causar uma intoxicação por excesso de sódio, se lamberem o material de que o candeeiro é feito.

Voltando ao essencial, é importante perceber que a luta contra a hipertensão se faz perdendo peso, praticando mais exercício, ingerindo mais hortifrutícolas (o seu teor em potássio é muito importante) e encontrando estratégias para reduzir o sal da alimentação sem que isso a torne totalmente desenxabida:

— Não comprar para casa snacks salgados (frutos gordos com sal, batatas fritas, pretzels, enchidos, pickles);

— Minimizar o número de refeições fora de casa durante a semana e fazer a melhor escolha possível dentro dos “pratos do dia” existentes (mesmo a sopa de grande parte dos restaurantes tem um teor muito alto de sal);

— Não abusar do sal, mesmo nas refeições “sociais” do fim-de-semana (é melhor comer um ou dois salgadinhos do que cinco ou seis, tal como também é melhor partilhar uma porção de batatas fritas do que comer uma inteira).

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Não houve diferenças significativas na pressão arterial nem na excreção urinária de sódio entre os grupos que receberam sal dos Himalaias e sal de mesa para fazer um estudo Pixelbay

Em boa verdade, quem está preocupado em trocar o sal “normal” por sal dos Himalaias já são, por norma, as pessoas mais conscienciosas com a sua saúde e eventualmente quem menos precisa. A opção por este sal cor-de-rosa não acarreta nenhuma vantagem e sobretudo não pode existir uma desresponsabilização no seu consumo por ser um sal mais “saudável” ou “natural”.

Sem ainda assim, gostar de incorporar na sua alimentação coisas “diferentes” do convencional, aqui ficam alguns exemplos de alimentos com provas científicas no que à diminuição da pressão arterial diz respeito: beterraba (existem já sumos de beterraba ricos em nitratos que possuem um efeito adicional); chá (sobretudo chá verde); infusão de hibisco; cacau (com algum cuidado, pelo seu elevado teor calórico); e sumo de romã (também já disponíveis comercialmente, quando a romã está fora de época).

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