Chega propõe referendo sobre a legalização da eutanásia

Proposta deverá ser discutiva e votada no dia 9, no debate potestativo marcado pelo PS. “É uma decisão que não pode ser tomada apenas nos corredores da Assembleia da República”, defende o partido de Ventura.

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André Ventura insiste num referendo LUSA/RODRIGO ANTUNES

“Concorda que a morte medicamente assistida de uma pessoa, a seu pedido, ou a ajuda ao suicídio, devem continuar a ser punidas pela lei penal?” Esta é a pergunta que o Chega defende que se deve fazer aos portugueses sob a forma de referendo para que sejam os cidadãos a decidir sobre a legalização da morte medicamente assistida em vez de esse passo pertencer apenas aos 230 deputados à Assembleia da República. Porque se trata, justifica, de “uma questão de relevante interesse nacional”.

A frase e a argumentação para a proposta de realização de um referendo estão no projecto de resolução que o partido liderado por André Ventura entregou nesta sexta-feira no Parlamento. “É uma decisão que não pode ser tomada apenas nos corredores da Assembleia da República: ela deve ser aberta à participação de toda a sociedade, ela deve ser devolvida ao povo”, defendem os 12 deputados do Chega que subscrevem o documento.

O projecto de resolução deverá ser discutido em conjunto com os projectos de lei sobre a legalização da eutanásia cujo debate potestativo foi marcado pelo PS para dia 9 de Junho. Só uma interpretação muito restrita do regimento poderá levar a que os socialistas considerem que a proposta do Chega, ainda que seja sobre o mesmo tema, não tenha conexão material por se tratar de um referendo.

O PS permitiu que os restantes partidos “arrastassem” projectos com temática conexa e já existem outros dois projectos de lei: um do Bloco entregue logo no final de Março (e o líder parlamentar Pedro Filipe Soares congratulou-se, há dias, com o debate marcado pelos socialistas) e outro do PAN que entrou nesta sexta-feira. Também a IL ainda deverá entregar um diploma - foram estes partidos (a par do PEV) que há dois anos viram os seus projectos aprovados na generalidade e que depois juntaram num texto comum que acabou por ser chumbado pelo Tribunal Constitucional.

Citando as propostas do Bloco e do PS, o Chega afirma que “admitir que uma alteração legislativa deste teor ganhe forma, independentemente de quais forem os pressupostos e requisitos que estão consignados naquelas iniciativas, é o equivalente a dizer aos cidadãos que a protecção que o Estado e o ordenamento jurídico que o sustenta concedem à vida humana lhes pode ser retirada pelos deputados à Assembleia da República, desde que a maioria de que dispõem, ou que conseguem concitar, o permita”.

O partido realça que “não só em Portugal a eutanásia é crime: é-o também num conjunto de outros ordenamentos jurídicos, nomeadamente europeus”, como a Alemanha e a Áustria. E afirma que” apenas três ordenamentos a admitem abertamente na União Europeia - Países Baixos, Bélgica e Luxemburgo” - o que não é verdade, uma vez que a Espanha já despenalizou a eutanásia no ano passado.

“O Chega não quer um Estado que mate, antes, um que cuide. O Chega quer um Estado para o qual a vida humana tem igual valor em todas as circunstâncias e por isso merece protecção em todas elas: não compreendemos nem aceitamos que circunstâncias indesejadas como a doença, a deficiência ou o sofrimento humano, seja físico ou existencial, retirem valor ao ser humano”, escrevem ainda os deputados.

André Ventura reuniu-se nesta sexta-feira à tarde com a direcção da Federação Portuguesa pela Vida, liderada por Isilda Pegado. No final, em declarações aos jornalistas, o líder do Chega defendeu que há uma “questão de falta de legitimidade por parte do legislador” por considerar que os deputados “não estão mandatados para votar sobre esta matéria porque nos programas eleitorais, sobretudo do PS, não é colocada a questão da legalização da eutanásia”, noticiou a Lusa. Ventura desejou que o referendo se possa realizar “mais para o fim do ano”. “Este é um tema demasiado importante para ser feito em cima do joelho, de forma atabalhoada e sem critério. Portanto, os meses que podemos perder para organizar um referendo certamente se justificarão pela importância que o tema tem”, defendeu.

A última proposta de referendo à eutanásia discutida no Parlamento, no final de Outubro de 2020, foi da iniciativa do CDS e foi chumbada com os votos contra do PS, BE, PCP, PEV e PAN, e de nove deputados do PSD e das duas deputadas não inscritas (Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira). Na bancada social-democrata, os restantes deputados votaram a favor ao lado do CDS e do deputado único da Iniciativa Liberal. Na altura, André Ventura não votou por se encontrar em campanha eleitoral nos Açores. Não foram registadas abstenções. Já nessa altura, os partidos defendiam que o Parlamento tinha legitimidade para tomar a decisão sobre a legalização ou não da morte medicamente assistida.

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