Em Paris, a Festa dos Vizinhos regressa em força: uma ideia de uma porteira portuguesa

A festa tomou tais proporções, que a rua é fechada ao trânsito, há patrocínios, entre os quais muitas empresas detidas por portugueses, e foi criada a associação Village Gauthey para gerir o evento.

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Reuters/GONZALO FUENTES

Lourdes Fernandes, porteira e eleita local no 17.º bairro de Paris, vai voltar a organizar nesta sexta-feira a sua emblemática Festa dos Vizinhos, a maior de França, num evento que vai reunir mais de 1000 pessoas e é tão aguardada como as festas da aldeia em Portugal. “É uma data que toda a gente está à espera. Como nas aldeias em Portugal, quando há festa. [...] Estes últimos anos fizemos de uma forma mais moderada, por causa da pandemia e fizemos sempre em Setembro, com as medidas necessárias, mas toda a gente se portou bem. Este ano estamos mais à vontade e vamos voltar como nos anos anteriores”, conta à Lusa.

Instalada há quase 30 anos na rue Gauthey, no 17.º bairro de Paris, Lourdes Fernandes tornou-se conhecida a nível nacional em França por organizar a maior Festa dos Vizinhos do país. Começou por ser um magusto para se apresentar aos moradores do prédio e em três décadas tornou-se numa festa que atrai mais de 1000 pessoas, com actuações musicais e actividades para as crianças.

“Toda a gente me via a varrer todos os dias, toda a gente me falava, com as crianças começámos a conhecer-nos e toda a gente quis começar a vir. Então disse a toda a gente para vir para a rua, num ano fiz uma exposição de fotografias de cada prédio e a festa foi crescendo”, recorda.

Após dois anos de pandemia, esta é uma data muito aguardada na capital francesa. Normalmente, todos os prédios organizam um convívio na mesma noite em Maio, mas no caso da rue Gauthey, a festa tomou outras proporções, com a rua a ser fechada ao trânsito, patrocínios, entre os quais muitas empresas detidas por portugueses, e até foi criada a associação Village Gauthey para gerir o evento.

Mais do que este convívio, Lourdes Fernandes disse que se criou na sua rua, onde é a única porteira, uma rede de vizinhos solidários que estão sempre dispostos a ajudar, algo que foi extremamente útil durante os confinamentos dos últimos dois anos. “Temos um grupo de WhatsApp com vários vizinhos de diferentes prédios, organizamos jantares e damos apoio às pessoas mais idosas. Durante o confinamento ajudámos 17 pessoas em permanência. Se eu não puder vir, há sempre alguém que vai. Criou-se uma rede de voluntários entre os vizinhos.”

A notoriedade desta porteira ganhou uma nova dimensão em 2020 quando foi eleita conselheira municipal no 17.º bairro, tendo a pasta da Sociedade Civil. Lourdes Fernandes já estava envolvida em iniciativas para dar a conhecer às porteiras os seus direitos como a Rede de Porteiras Solidárias de França, mas agora pode organizar eventos e chegar a todo o bairro.

Esta portuguesa, que chegou a França com 15 anos, constata que há um aumento de jovens portugueses que actualmente chegam a França para fazer este trabalho. “Na semana passa organizámos a Festa das Porteiras, com mais de 300 porteiras. Cerca de 20% das pessoas que lá estavam eram jovens portugueses e eu questiono-me, o que é que faz com que estes jovens qualificados venham para França ser porteiros e porteiras? É uma profissão ainda com algum preconceito. Talvez seja porque a vida é difícil em Portugal”, reflecte.

Para que mais ruas possam fazer a Festa dos Vizinhos, Lourdes Fernandes disponibiliza na Câmara Municipal do 17.º bairro todos os materiais necessários, como cartazes, toalhas, pratos ou copos de forma a promover o convívio intergeracional na capital francesa.

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