Faróis: um bem cultural

O leitor Camilo Sequeira visitou o Farol da Barra, em Ílhavo, o mais alto de Portugal, e lamenta o estado em que se encontra. Degradado, mal aproveitado e ignorado como potencial gerador de benefícios financeiros e culturais.

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O farol da Barra, em Ílhavo Nelson Garrido
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O farol da Barra, em Ílhavo M.M. Camilo Sequeira

O Farol da Barra, no município de Ílhavo, é o mais alto de Portugal. Está funcional, tem visitas grátis, é uma obra notável da engenharia do século XIX e oferece uma magnífica vista aérea da área envolvente. Mas está degradado, mal aproveitado turisticamente e ignorado como potencial gerador de benefícios financeiros e culturais.

Fui visitá-lo nos 99 anos da minha sogra (que não o pôde subir) para me deleitar com a experiência e saber em que teria sido beneficiado nos últimos dez anos. Percebi com tristeza que nada se fez. O edifício continua a mostrar-se por si, a valorizar-se por si, a ser procurado pelo seu original de dimensão e localização e a ser socialmente integrado pelo empenho dos seus faroleiros. Mas é um bem patrimonial a que se não deve ser indiferente porque nos honra ao ser o segundo maior da Península Ibérica, porque continua a ser útil à navegação marítima e porque pode ser, se se quiser, auto-suficiente financeiramente.

É um prazer olhá-lo, perceber o simbolismo social deste tipo de construções e ficar-se surpreendido por não se pagar a entrada com um valor, pequeno que fosse, que poderia aliviar os custos de obras de manutenção e de recuperação do elevador, permitindo a inválidos fruir uma notável experiência visual. Estou habituado a pagar tudo que visito fora de Portugal, pelo que me parece óbvio que quer portugueses quer turistas aceitariam pagar para subir o farol e, depois de admirarem o seu magnífico exterior, verem o rio, as praias, as estruturas urbanas e industriais que o cimo do mesmo oferece de forma única.

Claro que o farol continua a funcionar, pelo que esta sugestão poderá não ser uma prioridade. Porque o corpo está a degradar-se mas mantém-se de pé, porque o elevador não funciona mas podem-se subir sem excessiva dificuldade os quase 300 degraus da escada, enfim, porque um investimento, mesmo que se possa pagar a si mesmo, para permitir a sua visita apenas num dia por semana será difícil de justificar no todo das necessidades culturais de Portugal. E, sim, quem o queira visitar e não tiver deficiências continua a poder fazê-lo livremente.

Talvez esta argumentação seja adequada aos tempos que vivemos mas o que o visitante percebe é abandono, é até ignorância sobre o simbólico do edifício e é falta de vontade de aceitar o seu autofinanciamento, parcial ou total, como apoio às suas protecção e valorização. Porque este farol é um bem patrimonial único na sua dimensão que merece apoio e divulgação, podendo o pagamento da entrada ser um desses apoios.

E o mesmo se pode dizer sobre o desuso cultural do Bugio e sobre o encerramento a visitas de curiosos de outros faróis onde as vantagens da tecnologia substituíram o homem faroleiro. Mas este profissional poderia, num circuito turístico especializado, ser um guia local que, com competência, paixão e muitas vezes vivência, honraria a Marinha portuguesa ao dar a conhecer a história, as utilidades, e as muitas curiosidades de um sistema de comunicações que tantas vidas salvou e continua a salvar ao longo da nossa existência como sociedades complexas organizadas.

M. M. Camilo Sequeira

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