Polónia resiste e deixa UE a lutar pela unanimidade para o IRC mínimo

Varsóvia quer aprovação conjunta dos dois pilares da nova reforma internacional. Directiva que transpõe um deles — o IRC de 15% para multinacionais — fica dependente de um consenso entre os 27.

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A reforma da OCDE abrange as grandes multinacionais Reuters/REGIS DUVIGNAU

Ainda não foi desta vez que os ministros das Finanças dos 27 países da União Europeia (UE) aprovaram a nova directiva que vai coordenar as novas regras de tributação de IRC das multinacionais, através de uma taxa mínima de 15% a nível global.

A União Europeia apoiou a reforma fiscal internacional alcançada em Outubro no âmbito da OCDE e do G20, mas a forma de passar os dois pilares do acordo da teoria à prática ainda não convenceu todos os governos europeus.

A Polónia é favorável à reforma, mas entende que as novas regras devem ser aprovadas em conjunto e não de forma separada e, com base nesse argumento, está a bloquear uma aprovação imediata da nova proposta de directiva que transpõe essa parte da reforma.

Sob proposta da Comissão Europeia, os 27 governos estão a discutir a criação de uma nova directiva que implementará um dos dois pilares da reforma da OCDE — o chamado “pilar dois”, que define o patamar mínimo de IRC de 15% a nível global para as multinacionais presentes no mercado único europeu através de uma casa-mãe ou de uma filial.

O “pilar um”, que se refere à distribuição dos direitos de tributação dos países sobre uma parte dos lucros obtidos pelas multinacionais nos países de consumo dos produtos e serviços digitais, será tratado à parte. Mas é essa divisão que desagrada ao Governo de Varsóvia, para quem a resposta deve passar por uma solução juridicamente vinculativa que envolva as duas vertentes.

Como se trata de uma matéria fiscal, a União Europeia só poderá aprovar a directiva se chegar a um consenso, porque as matérias da fiscalidade só avançam se existir unanimidade. E, para isso, precisa de ter a Polónia no barco.

As reticências polacas obrigarão, por isso, os 27 a continuarem a debater o assunto e a estabelecerem pontes até encontrarem uma solução que envolva todos. Só assim transporão as regras em relação às quais, por sua vez, já chegaram a acordo na OCDE. Nada indica, por ora, que a transposição da reforma ficará em causa; apenas que a sua aprovação demorará mais tempo.

Os países devem transpor a directiva para as suas legislações nacionais até 31 de Dezembro deste ano, para as regras estarem de pé em 2023.

Na reunião dos ministros das Finanças desta terça-feira em Bruxelas, a representante polaca, a secretária de Estado com o pelouro da administração fiscal, Magdalena Rzeczkowska, justificou-se: “Não apoiamos a separação dos dois pilares na União Europeia. Os pilares um e dois são elementos de uma só reforma das regras tributárias internacionais”. Para a Polónia, disse, a directiva do segundo pilar só deve avançar “com a garantia de que o ‘pilar um’ vai ser aplicado”.

“Não estamos a pôr em causa o projecto da OCDE de forma alguma. O nosso objectivo é o de garantir que a reforma dos dois pilares é introduzida e que entra em vigor. Estamos confiantes de que vincular juridicamente os dois pilares é possível e estamos disponíveis para trabalhar em relação às garantias necessárias em termos jurídicos”, sustentou.

Portugal lamenta espera

A posição de Varsóvia mereceu críticas de outros parceiros, a começar pela França, que tem neste momento a presidência rotativa do Conselho da União Europeia.

Depois de Magdalena Rzeczkowska falar, o ministro das Finanças francês, Bruno Le Maire, disse não perceber a posição polaca. “Lamento [a decisão] depois de cinco anos de trabalho, quando todas as dificuldades técnicas foram resolvidas e temos 26 Estados que apoiam esta tributação mínima, que é um progresso em matéria de justiça e simplificação fiscal considerável, que coloca a Europa na frente dos demais continentes em matéria de tributação mínima e de justiça fiscal”, notou.

Portugal também lamentou a inexistência de unanimidade neste momento, embora espere que o bloqueio não dure. No final da reunião, à imprensa, o novo ministro das Finanças, Fernando Medina, afirmou que Portugal tem a “expectativa” de que a medida possa ser aprovada “num outro momento”.

O texto da directiva já foi discutido este ano em três reuniões do Ecofin (em Janeiro, em Março e no encontro desta terça-feira). Os ministros voltam a reunir-se em Maio.

Inicialmente, durante as discussões na OCDE, três parceiros europeus colocaram resistências durante as negociações do acordo — a Irlanda, a Hungria e a Estónia —, mas todos acabaram por abraçar o resultado final.

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