Que “estado de graça” para o ministro João Costa?

Mal se entende o facto de o Ministério da Educação ter sido amputado da sua segunda Secretaria de Estado. Oxalá que tal opção não signifique menos consideração do primeiro-ministro pelos diferentes problemas que urge resolver no setor.

Depois de o cientista Tiago Brandão Rodrigues ter batido o recorde de permanência no cargo de ministro da Educação, ainda que com parcos resultados, assistiu-se a uma certa expectativa sobre quem seria o novo titular desta área nevrálgica. Parece ter sido sondado um ex-embaixador de nomeação política, mas que não terá querido arriscar…
Nestas circunstâncias, optou o primeiro-ministro por uma solução de continuidade fazendo subir o secretário de Estado João Costa a ministro. Facto que, a avaliar pelas reações formais dos parceiros da área educativa (pais, estudantes, professores, diretores de escolas, autarcas) terá sido bem recebido.
De facto, João Costa, que apenas dois anos antes de ter sido empossado como secretário de Estado da Educação tinha sido candidato independente numa lista autárquica do Partido Comunista, desenvolveu nos últimos seis anos todo um trabalho de “formiguinha”, com a sua presença em grande parte dos agrupamentos de escolas de todo o país o que se traduziu numa governação de grande proximidade, geradora de simpatias particularmente por parte de diretores de escolas e de determinados núcleos de professores.

Enquanto estratega “de facto” do ministério de Brandão Rodrigues lançou todo um conjunto de projetos pedagógicos vincadamente de esquerda e do agrado dos partidos mais à esquerda da esquerda (após a sua indigitação como ministro, Francisco Louçã na SIC-N elogiou-o dizendo que ele teve uma ação muito aberta) como por exemplo: supressão de exames no 4.º e 6.º anos de escolaridade, autonomia e flexibilidade curricular, inclusão integral de alunos com necessidades educativas especiais e a criação de uma nova unidade curricular de “Cidadania e Desenvolvimento”. Nesta se contemplando conteúdos, para crianças e jovens, sobre determinadas práticas sexuais e de género considerados “fraturantes” e contestados por algumas associações de famílias.

Tal estratégia traduziu-se nas escolas num aumento da já grande “burocracia pedagógica” e num crescente de novas exigências ao corpo docente, não raro contribuindo para o aumento do número de reuniões escolares, situações de sobretabalho, stress e burnout que podem conduzir à doença e à necessidade de faltas prolongadas por atestado médico. Numa época em que escasseiam jovens professores para as respetivas substituições.

São estes e outros não menos complexos problemas que há muito se vêm sentido e agravando (como é o caso da indisciplina escolar) que aguardam uma intervenção inadiável do novo ministério. Razão pela qual mal se entende o facto de este ter sido amputado da sua tradicional segunda Secretaria de Estado.
Oxalá que tal opção não signifique menos consideração do primeiro-ministro pelos diferentes problemas que urge resolver neste vasto e abrangente setor da vida nacional, com cerca de 150 mil docentes, 5500 escolas e com o quarto maior orçamento ministerial para executar. Grave será se tal opção indiciar não pretenderem introduzir alterações substanciais no modus operandi do sexénio anterior e limitarem-se a gerir o status quo

A par dos alunos, que são a primeira razão de ser das escolas, são os professores o seu elemento decisivo e face à escassez dos mesmos, que se está a sentir cada vez mais, importa criar condições que tornem a carreira docente mais compensadora para quem já está na profissão e mais atrativa para os futuros professores. Tal desiderato passa, nomeadamente, pela revisão das regras de recrutamento e colocação docente e por um estatuto de carreira cuja avaliação de desempenho não bloquei as progressões, com a recuperação do tempo de serviço prestado e que permita um regime específico de aposentação a todos os seus profissionais.

Nas democracias liberais, aquando da tomada de posse de um novo Governo é costume conceder-se-lhe um período de “estado de graça”, os seus primeiros cem dias em exercício de funções, de modo a que os novos governantes se possam inteirar dos dossiês deixados pelos governantes anteriores e possam tomar as decisões que se impõem.
No entanto, já porque João Costa é membro do Governo há mais de meia dúzia de anos integrando sempre a pasta da Educação, já porque não raro preencheu o “vazio” deixado por Brandão Rodrigues, já porque, no dizer dos seus apoiantes, conhece bem as necessidades das escolas e dos professores, já porque os problemas urgem, receio bem que no seu caso não haja lugar àquela saudável praxe das democracias liberais…

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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