Há que “educar as gerações pequeninas” para o que é a Europa — a Geração KNow Junior responde à chamada

Participantes na primeira edição da formação europeia Geração KNow querem partilhar o “bichinho da Europa” com crianças e vão lançar projecto piloto para falar sobre a União Europeia nas escolas.

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Reuters/YVES HERMAN

Vários meses de formação, nove sessões sobre temas de peso como o futuro digital, a transição ecológica ou os direitos humanos, um grupo de 27 pessoas com muita vontade de aprender mais sobre a União Europeia (UE). No final da primeira edição da Geração KNow, que acaba de encerrar trabalhos, o entusiasmo dos primeiros participantes desta formação sobre assuntos europeus parece ser tão difícil de conter que agora querem ajudar a criar “uma nova geração de heróis da Europa”: a Geração KNow Junior.

A Geração KNow é um programa de formação gratuita dirigido a pessoas portuguesas de diferentes quadrantes e idades, promovido pela eurodeputada Maria Manuel Leitão Marques e apoiada pelo grupo dos Socialistas e Democratas (S&D) do Parlamento Europeu. A primeira edição começou em Janeiro de 2021; a segunda acabou de arrancar com uma sessão a 19 de Março, em Coimbra, onde os e as participantes da “primeira geração” fizeram a passagem de testemunho, anunciando a ideia de um projecto-piloto que adapta ao público escolar os temas que aprenderam ao longo da formação.

Claudia Mendes Silva, de 45 anos, foi uma dessas participantes. É gestora de projecto numa grande empresa tecnológica e embaixadora portuguesa da rede internacional Women in Tech. Desde o momento em que foi seleccionada para a primeira edição da Geração KNow, assumiu como missão encontrar uma forma de ser uma espécie de “cola” para “não deixar morrer esta formação”. Em conjunto com a colega Sílvia Ferreira, apresentou a ideia: “ir às escolas levar aquilo que aprendemos” para “educar as gerações pequeninas”, que, esperam, também possam levar a mensagem aos pais.

Com a Geração KNow Junior, querem sublinhar “a importância de que outros percebam melhor o que é a Europa”. “A democracia dá trabalho”, nota Sílvia, ligada à área da educação. As pessoas estão longe da política, acredita, porque “envolvê-las demora tempo e é mais difícil”.

Afonso Borga, de 26 anos, é consultor na área da sustentabilidade. Foi outro dos elementos do grupo que já decidiu juntar-se à equipa da Geração KNow Junior. Com experiência anterior de voluntariado em campos de refugiados, já deixou o seu contributo: que a questão das migrações e asilo fosse um dos pontos fortes incluídos no programa.

Para Claudia Mendes Silva, ir às escolas falar sobre estas questões é essencial para contrariar a ideia de que “a UE parece distante”. Muito ligada aos temas da igualdade de género na tecnologia, nota que as “mulheres estão afastadas da política, das leis europeias.” Mas não será o desinteresse pelos assuntos da Europa algo mais geral? “Sim, mas há mais assimetria do lado das mulheres”, reforça, dando o exemplo dos obstáculos que as mulheres encontram na participação política, que “exige alguma exposição, exige tempo”.

“A própria informação também não chega às pessoas”, considera Claudia Silva, para quem os políticos tendem muitas vezes a “debater entre políticos”, ao invés de abrir um verdadeiro diálogo com os cidadãos, numa linguagem mais simples.

“Todos temos uma história”

O mote dado pela Geração KNow, “todos temos uma história”, deixa logo antever um dos desafios que esta formação propõe responder: como é que se torna a União Europeia em algo pessoal?

“A riqueza da KNow é conhecer pessoas muito diferentes”, sugere João Filipe Marques, 35 anos, biólogo de formação que trabalha em divulgação de ciência. Ao longo da formação, as pessoas puderam “aprender com especialistas mas também umas com as outras”.

A terminar uma pós-graduação em gestão política na área da Ciência e Tecnologia, João candidatou-se devido ao interesse — correspondido, garante — em conhecer o funcionamento das instituições europeias em áreas como o Pacto Ecológico Europeu. “[Mas] As coisas que ganhei ao redor foram tão boas ou melhores”, garante, referindo a sessão em que ouviram histórias de bastidores sobre como funcionam “os meandros das instituições”.

Daniela Azevedo, de 44 anos, concorda com João Marques — uma das grandes mais-valias da formação, diz, foi “a informalidade dos oradores, a forma como se despiram do papel de ‘sr. deputado’ ou ‘sr. chefe de gabinete’”.

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O primeiro grupo da Geração KNow DR

Foi jornalista durante 25 anos (os colegas de grupo que ainda não a conheciam pessoalmente reconheceram-na pela voz radiofónica) e hoje trabalha numa câmara municipal. Quando enviou a candidatura, o principal tema que queria explorar era a transição digital, vista ainda por muitas pessoas como “um bicho-de-sete-cabeças”. Sentia que o município para o qual trabalha ainda é “muito fechado sobre a sua tradição, voltado para o Ribatejo”, havendo uma “falta de ligação com assuntos europeus”. E sente, ainda mais agora que terminou a “primeira geração”, que é preciso quebrar a “noção de que a UE está lá muito longe.”

Em 2013, já tinha ido a Bruxelas enquanto jornalista. “Fiquei com o bichinho da Europa desde essa altura”, comenta, adivinhando a pergunta apontada no nosso bloco de notas: como nasce esse bichinho da Europa? “Foram três dentadinhas”, diz, a rir-se, dando o exemplo de três temas que a marcaram ao longo da Geração KNow: além da inovação tecnológica, também ficou impressionada com o trabalho abrangente a nível europeu em matéria ambiental e em questões humanitárias no acolhimento de refugiados.

À entrada da sala para a sessão de passagem de testemunho, que contou com a participação da (ainda) secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, metemos conversa com Sónia Andrade, de 48 anos, militar da Força Aérea. Está a terminar o mestrado em Estudos Europeus, onde tem aprofundado os temas da defesa das fronteiras externas da UE, e vem juntar a estes conhecimentos outros mais abrangentes sobre como funcionam as instituições europeias. Foi há poucos anos que resolveu retomar os estudos e concluir a licenciatura. “As mulheres têm tendência a pôr tudo à frente da carreira”, comenta. Agora que começou, não quer parar. E a oportunidade chegou mesmo na altura certa para se juntar a um novo grupo deste “belo tubo de ensaio”.

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