Rússia já tem as garantias que queria para permitir conclusão do acordo nuclear com o Irão

Departamento de Estado norte-americano confirma que os EUA não tencionam punir a participação russa em projectos nucleares iranianos. Últimos pontos estão a ser “polidos”, diz Serguei Lavrov.

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O ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Hossein Amirabdollahian, foi recebido por Lavrov em Moscovo EPA/MAXIM SHEMETOV / POOL

Afinal, tudo não terá passado de um susto e a guerra da Rússia na Ucrânia não deitará por terra onze meses de negociações para um novo acordo internacional sobre o programa nuclear iraniano. O ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, afirmou ter recebido garantias escritas de Washington de que as sanções ocidentais contra Moscovo por causa do conflito não afectam a cooperação russa com o Irão.

Em Washington, o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, confirmou que os Estados Unidos não tencionam punir a participação russa em projectos nucleares iranianos previstos na nova versão do acordo, avisando, ao mesmo tempo, que não vão permitir que a Rússia use este acordo para “fugir” as sanções impostas por causa da Ucrânia. E apesar da pausa imposta nas negociações pelas exigências russas, Price assegurou que houve “progressos significativos” nos últimos dias.

Há uma semana, o acordo parecia quase fechado, com o chefe da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), Rafael Grossi, a visitar Teerão para resolver questões de última hora. Depois, na quinta-feira, Moscovo exigiu saber que as suas relações comerciais com Teerão não seriam afectadas pelas sanções de que está a ser alvo por causa da invasão – algo que, num primeiro momento os EUA disseram ser impossível de considerar, até porque as sanções têm sido anunciadas em pacotes sucessivos e haverá novas. Ao mesmo tempo, não seria de todo previsível que fossem decididas medidas com consequências para os laços entre a Rússia e o Irão.

De qualquer maneira, surgiram receios que a invasão russa da Ucrânia, e a tentativa em curso para isolar a Rússia, levasse o Kremlin a não ceder, deixando estas conversações reféns do conflito (isto quando a guerra só sublinha a urgência das negociações, num momento de subida de preços do petróleo, e quando o acordo significa a entrada do petróleo iraniano no mercado). Um medo que as afirmações desta terça-feira parecem afastar.

Depois de receber o ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Hossein Amirabdollahian, Lavrov disse mesmo que os pontos do acordo que ainda estão por fechar estão a ser “polidos”, sugerindo que as delegações de negociadores podem estar quase de regresso a Viena. As garantias entretanto dadas por Washington, disse Lavrov, estarão a ser acrescentadas ao tratado. “Recebemos garantias escritas. Estão incluídas no texto do próprio acordo”, esclareceu Lavrov.

Teerão recusa pressões

Sublinhando que o Irão é uma parte “forte e independente” das conversações, e que não admitirá pressões para impedir a sua cooperação com qualquer país, Amirabdollahian garantiu que “não haverá nenhuma relação entre os desenvolvimentos na Ucrânia e as negociações de Viena”. Teerão tem-se afirmado contra a guerra na Ucrânia, mas aponta o alargamento da NATO como raiz do conflito, como argumenta Moscovo.

O acordo histórico de 2015 permitiu introduzir um sistema de monitorização do programa nuclear iraniano, afastando assim os temores de que a República Islâmica se aproximasse da capacidade para obter a bomba atómica, em troca do levantamento de sanções económicas. Foi assinado entre o Irão e o chamado grupo dos 5-1 (os membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas – para além dos EUA e da Rússia, a China, o Reino Unido e a França – e a Alemanha). Em 2018, Donald Trump decidiu retirar os EUA do acordo, levando o Irão a deixar de o cumprir.

Com a chegada de Joe Biden à Casa Branca, em Janeiro do ano passado, voltou a ser possível admitir um diálogo entre Washington e Teerão. Em Abril, as conversações retomaram em Viena, com os iranianos e os norte-americanos a interagirem através da mediação da União Europeia. O novo texto, negociado ao longo destes meses, não oferece as mesmas garantias que o de 2015 – entretanto, as capacidades nucleares do Irão avançaram demasiado. Mas continua a ser o melhor caminho para evitar um potencial conflito entre os EUA e o Irão ou uma guerra que oponha iranianos e israelitas.

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