Comité Olímpico de Portugal: “Política e desporto nunca deixaram de estar misturados”

Em conversa com o PÚBLICO, o presidente do Comité Olímpico de Portugal disse concordar com a mobilização do desporto mundial contra a Rússia, tanto que é impossível separar o desporto do seu “enquadramento político”.

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José Manuel Constantino é presidente do COI desde 2013 DIOGO VENTURA

O desporto mundial tem vindo a reagir pronta e duramente contra a Rússia perante a invasão na Ucrânia. Na quinta-feira, o Comité Paralímpico Internacional reverteu a sua decisão inicial no que toca à participação dos atletas russos e bielorrussos nos Jogos de Inverno, que começaram na sexta-feira, ficando estes afinal proibidos de competir. Para José Manuel Constantino, o presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP), “os atletas não são excepção” neste conflito, pelo que as sanções são justificadas pela gravidade da situação. A política e o desporto não estão, nem nunca estiveram, separados um do outro, explica.

Concorda com esta mobilização conjunta que se tem vindo a verificar contra a Rússia ao nível desportivo?

Houve a invasão num país soberano e a gravidade da situação decorrente deste envolvimento da Rússia e da Bielorrússia no ataque à Ucrânia justifica que o movimento desportivo tenha tomado as decisões que tomou e com esta dimensão.

O COP tem assumido uma posição clara nesta questão dos boicotes?

Não estamos envolvidos do ponto de vista organizativo nessa matéria, mas naturalmente que concordamos e acompanhamos aquele que é o posicionamento do movimento olímpico internacional.

Como interpretou a alteração da decisão da parte do Comité Paralímpico Internacional relativamente à participação dos atletas russos e bielorrussos nos Jogos de Inverno?

Ela decorre da verificação por parte dessa organização do clima que se criaria junto das outras ligações se os atletas russos e bielorrussos pudessem ainda competir sob uma participação neutra, sem representarem o país. Na minha interpretação, a organização arrepiou caminho e tomou uma decisão mais conforme com aquilo que é o sentimento geral da comunidade desportiva.

Uma participação sob bandeira neutra não seria então uma hipótese a considerar?

Face à gravidade da situação, não havia ambiente do ponto de vista desportivo para encontrar uma excepção que permitisse que os atletas bielorrussos e russos participassem, quando muitos dos ucranianos estão nas barricadas a lutar contra o país que os invadiu.

O Comité Paralímpico Internacional afirmou que esta mudança de decisão foi motivada por pressões políticas. Devem a política e o desporto misturar-se?

Nunca deixaram de estar misturados. Toda a história do desporto está contaminada por aquilo que é o seu enquadramento político. Seria pouco compreensível se, face ao quadro internacional que estamos a viver, as autoridades desportivas não tomassem estas medidas.

Faz sentido que atletas sejam banidos apesar de não terem culpa das acções dos países que representam?

Todas as pessoas, quer do país invasor quer do país invadido, estão a sofrer as consequências da situação. Os atletas não são excepção, não há como evitar essa situação. Os atletas não vivem num mundo à parte, vivem num mundo real que neste momento está em situação de conflito gravíssimo. Pior ainda vão ser as consequências daqueles que, sendo atletas, vão desaparecer, porque estão em situação de batalha.

Estas decisões não mancham o espírito olímpico?

Quem não respeitou a carta olímpica e a trégua olímpica foi quem invadiu a Ucrânia. As responsabilidades não podem ser assacadas a outros que não àqueles que tomaram a iniciativa de invadir um país soberano.

Dados os princípios éticos em que assenta, o desporto não poderia funcionar como um exemplo para o mundo sociopolítico nos tempos de guerra que decorrem?

Precisamente por isso é que o desporto tomou a decisão de não conviver com uma situação que é, do ponto de vista da opinião pública, profundamente reprovável. O desporto tomou a primeira linha de combate à denúncia desta situação.

Sente que as sanções de agora contra o desporto russo podem vir a ter repercussões no futuro ou o tempo curará as relações de hostilidade?

É uma incógnita, ninguém sabe responder quando é que a guerra vai acabar. Espero que seja encontrada rapidamente uma solução que evite o agravamento da situação para além dos limites que já são conhecidos e que são gravíssimos.

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