Executivo do Porto unânime em adiar transferência de competências de acção social

Todos os partidos quiseram adiar a passagem de competências para a autarquia, por considerarem que cheque passado pelo Governo é insuficiente. Em Braga, transferência também foi adiada

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Câmara e Assembleia Municipal recusaram já por duas vezes a transferência de competências na área da acção social Adriano Miranda

O executivo da Câmara do Porto aprovou esta segunda-feira, por unanimidade, o adiamento da transferência de competências em matéria de acção social até Janeiro de 2023, por considerar que não existem condições para assumir o envelope financeiro.

A proposta de adiar até 1 de Janeiro de 2023 o prazo para a transferência de competências na área da acção social, no âmbito da descentralização administrativa, foi aprovada por unanimidade na reunião privada do executivo da Câmara do Porto.

À margem da reunião, a vereadora com o pelouro da Acção Social, Cristina Pimentel, reforçou, em declarações aos jornalistas, que “neste momento não existem condições para que o município assuma com o envelope financeiro a descentralização de competências”.

Também o vereador social-democrata Alberto Machado defendeu que os municípios continuam “sem ter por parte do Governo uma proposta séria que vá ao encontro dos reais custos da transferência de competências”.

“Há que descentralizar, sim. Há que transferir competências para os municípios e freguesias, mas há que atribuir o correspondente pacote financeiro e não, como é o caso, transferir muito menos dinheiro do que é necessário para as coisas funcionarem”, referiu.

Para a vereadora da CDU, Ilda Figueiredo, a transferência de competências na área da acção social e outras “são fundamentalmente transferências de custos e encargos para o município”. “Desde o início temos estado contra esta lei que foi aprovada pelo PS e pelo PSD de transferência de responsabilidades e encargos para os municípios, ainda por cima sem as respectivas contrapartidas financeiras”, salientou a vereadora, considerando que o processo da descentralização administrativa vai gerar “muitas desigualdades e assimetrias no país”.

Já o vereador socialista Tiago Barbosa Ribeiro destacou que o adiamento será “uma janela de oportunidade para que o município possa, sem desculpas, concretizar este pacote ao serviço dos portuenses”. “Acompanhamos essa possibilidade, reiterando a necessidade de concretização com a maior brevidade possível”, salientou, acrescentando que a descentralização de competências permitirá ao município “ter instrumentos que até hoje não tem nas mais diferentes áreas como a saúde e educação”.

Por sua vez, o vereador do BE, Sérgio Aires, defendeu que o partido “mais do que reconhecer a insuficiência dos recursos que são transferidos”, está preocupado com “o modelo de transferência de competências e o que ele pode representar em termos de desigualdades de oportunidades”.

“É verdade que a questão dos recursos é importante, mas não deve ir à frente de tudo, nem tudo é dinheiro, é o modelo de transferência que está também em causa. Este adiamento é bom porque julgamos que é uma oportunidade para todos conjuntamente reflectirmos sobre isso e encontrarmos uma alternativa que seja exequível”, acrescentou.

O Governo aprovou a 3 de Fevereiro a possibilidade de os municípios requererem a prorrogação até 1 de Janeiro de 2023 do prazo para a concretização da transferência de competências na área da acção social.

Estado dá 1,8 milhões, Câmara precisa de 8,8

O estudo de avaliação do impacto financeiro da transferência de competências, encomendado pela Câmara do Porto à Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho a que a Lusa teve acesso, indica que o aumento estimado nas despesas decorrente da transferência de competências em matéria de acção social é superior a 8,8 milhões de euros, valor que os autores sublinham ser “manifestamente superior à verba prevista pela administração central”, que ronda os 1,8 milhões de euros.

A Câmara e a Assembleia Municipal do Porto recusaram já por duas vezes a transferência de competências na área da acção social. A transferência de competências em mais de 20 áreas da Administração Central para os municípios decorre desde 2019.

A transferência definitiva e obrigatória de competências nas áreas da Educação, Saúde e Acção Social para os municípios estava prevista acontecer a partir de 1 de Abril de 2022, após vários adiamentos, devido ao atraso na publicação de alguns diplomas sectoriais, nomeadamente naquelas três áreas, mais complexas e que envolvem também a transferência de montantes financeiros do Estado para os municípios.

Braga também adia

Também em Braga, o executivo deliberou no mesmo sentido, adiando a transferência de competências para o início do próximo ano com o argumento de ser necessária a “clarificação” de várias questões relacionadas com a operacionalização do processo.

Na proposta de adiamento que foi aprovada com a abstenção do PS e o voto contra da CDU, a câmara refere ainda que, para o exercício e prestação de um serviço de qualidade, “é imperativo que haja um domínio claro dos instrumentos regulatórios, associado ao conhecimento no terreno e a uma efectiva e cuidada preparação e adaptação a vários níveis, como os recursos humanos, os recursos financeiros e os sistemas de informação”.

A proposta lembra ainda que o próprio decreto-lei que possibilita aos municípios a prorrogação do prazo reconhece que se trata de um processo de grande complexidade, agravada pelo quadro pandémico de covid-19 e pela publicação tardia (Março de 2021) dos instrumentos regulatórios do processo.

O PS absteve-se, argumentando que, apesar de haver arestas por limar, a transferência de competências é necessária. Já a CDU justificou o seu voto contra dizendo que as respostas na área da Acção Social, assim como na Educação e na Saúde, devem ser dadas pela Administração Central.

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