O impacto das alterações climáticas na saúde mental

Viver com a constante ameaça do clima no horizonte vai obrigar-nos a repensar a nossa existência e os nossos estilos de vida. O stress, a ansiedade, a depressão e o stress pós-traumático aumentarão com os impactos físicos das alterações climáticas.

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Sernancelhe Miguel Manso

A pandemia trouxe a sustentabilidade e as alterações climáticas para a actualidade. A necessidade de proteger as pessoas das alterações climáticas deixou de ser longínqua, adoptando um estatuto iminente de catástrofes em propagação. Os próximos episódios climáticos extremos, apesar de imprevisíveis em termos regionais e de magnitude, são incontornáveis. Vão acontecer. Já ninguém duvida.

À medida que lidamos com o aumento da temperatura global e com este clima tão instável e incerto, há algo que também não podemos ignorar: a saúde mental. Viver com a constante ameaça do clima no horizonte vai obrigar-nos a repensar a nossa existência e os nossos estilos de vida. O stress, a ansiedade, a depressão e o stress pós-traumático aumentarão com os impactos físicos das alterações climáticas. Deixam de ser riscos. Constituem, sim, uma realidade que temos de encarar, prevenir e mitigar.

É de certeza devastador vermos parte da nossa casa ou propriedade ficar inundada ou ardida. É igualmente devastador sermos obrigados a abandonar o local onde vivemos devido à seca que impede a criação de culturas e gado ou porque a água do mar vai deixar a nossa comunidade submersa. Sabemos que isto vai acontecer, contínua e severamente, por esse mundo fora e também em Portugal.

As alterações climáticas representam alguns tipos de ameaças: existencial, física, patrimonial e psicológica. Para não falar na cultural ou ética. Todas elas com impactos imediatos e de médio e longo prazo na saúde mental, que se podem estender ao longo de várias gerações.

O conhecimento científico produzido à volta do trauma climático ainda é muito reduzido, mas já há alguns estudos que comprovam que temos muito trabalho a fazer. Vejamos. As tempestades e inundações podem aumentar o risco de depressão em 50%. As ondas de calor são casualmente ligadas ao aumento de transtornos de humor. As pessoas directamente expostas a incêndios florestais têm cerca de 75% mais sintomas graves de stress pós-traumático e 50% mais ansiedade do que aquelas que não passam por estas situações. No ano de 2020, 98% das mais de 30 milhões de pessoas deslocadas em todo o mundo, fizeram-no devido ao impacto das alterações climáticas nos seus territórios – os refugiados climáticos têm cinco vezes mais probabilidade de precisar de apoio à saúde mental do que a população em geral.

O que há a fazer? Intervir com apoio psicológico junto dos mais afectados pelas alterações climáticas e junto daqueles que sabemos que em breve serão também afectados. Exigir que o combate às alterações climáticas seja uma prioridade máxima na agenda dos líderes políticos, empresariais, académicos e das comunidades. Perceber que sem protegermos a natureza e os recursos naturais não conseguimos dar tempo ao planeta para regenerar. Mudar estilos de vida – se é o ser humano que está a causar as alterações climáticas, terá de ser o ser humano a querer inverter este problema.

Tal como a saúde pública, a saúde mental implica-nos a todos. O pouco que pudermos fazer à nossa volta para combater as alterações climáticas impactará muito e positivamente as comunidades onde nos inserimos, os mais vulneráveis e o planeta. Deixámos de ter desculpas para não tomarmos opções sustentáveis no nosso dia-a-dia. Pela nossa saúde mental e pela saúde do planeta.

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