Na Venezuela, os media pró-Maduro são fundamentais para a perseguição dos seus opositores

Um relatório da Amnistia Internacional analisou campanhas mediáticas dirigidas contra críticos do regime e a sua posterior detenção, notando uma forte correlação.

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Desde 2019 foram contabilizadas mais de 1200 detenções de críticos de Maduro MIGUEL GUTIERREZ / EPA

A estigmatização pública por parte dos meios de comunicação próximos do regime venezuelano tem uma parte fundamental no processo de perseguição dos críticos e adversários políticos do “chavismo”, de acordo com um relatório publicado esta quinta-feira pela Amnistia Internacional.

Baseando-se em dados de duas organizações não-governamentais que documentam actos de repressão e detenções de activistas políticos, a Amnistia conseguiu estabelecer uma forte correlação entre a estigmatização de certas personalidades em órgãos de comunicação alinhados com o Governo de Nicolás Madura e a sua detenção posterior. “Esta correlação é um novo indicador de uma política sistemática de repressão e aponta para crimes contra a humanidade por perseguição, que devem ser investigados pelo sistema internacional de justiça”, diz a directora para as Américas da organização, Erika Guevara-Rosas.

Entre Janeiro de 2019 e Junho de 2021, a Amnistia documentou mais de 1200 detenções arbitrárias de pessoas críticas do regime “chavista” e concluiu que muitas delas foram precedidas de campanhas públicas de difamação por parte dos media pró-Maduro. Essa tendência acentuou-se ao longo dos últimos anos: em 2019, a correlação entre as duas variáveis foi de 29%, em 2020 subiu para 42% e no primeiro semestre do ano passado alcançou 77%.

“Há uma relação directa entre a estigmatização e o discurso de ódio nos media com ligações ao Governo ou ao Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e as detenções arbitrárias politicamente motivadas, que se complementam e alimentam uma à outra”, concluem os investigadores.

Os autores do relatório identificam três fontes principais nas quais tem origem grande parte das campanhas de difamação. A principal é o programa “Con el Mazo Dando”, transmitido desde 2014 pelo canal público de televisão, apresentado pelo vice-presidente Diosdado Cabello, em que frequentemente são identificados e criticados violentamente opositores do regime e organizações não-governamentais, acusadas de quererem derrubar o Governo.

Os outros dois meios de comunicação a partir de onde são lançadas as campanhas de estigmatização são o blog “Misión Verdad”, alimentado por vários dirigentes do PSUV, incluindo o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, Jorge Arreaza, e o portal de notícias Lechuguinos.

“As provas obtidas fornecem a confirmação de que estes órgãos publicam conteúdos coordenados, com ligações inegáveis aos media estatais e ao partido governamental. Todos estes elementos indicam que a propaganda política faz uso da estigmatização contra pessoas vistas como críticas do Governo de Nicolás Maduro”, nota a Amnistia.

Os autores do estudo apelam directamente ao gabinete do procurador do Tribunal Penal Internacional para que inclua na investigação sobre crimes contra a humanidade na Venezuela os dados recolhidos que aparentam indicar possíveis crimes de perseguição política e detenção arbitrária.

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