Das 9h às 21h, seis dias por semana. Morte de funcionário expõe cultura de excesso de trabalho na China

Trabalhador do portal de vídeos Bilibili morreu por hemorragia cerebral. Empresa nega que cansaço e horas extras tenham sido o motivo.

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EPA/RITCHIE B. TONGO

Mais um trabalhador de uma gigante tecnológica na China foi alvo de morte súbita na semana passada, voltando a trazer para cima da mesa a discussão sobre a cultura de horas extra que é ainda praticada em várias empresas do sector no país.

O jovem de 25 anos, que trabalhava como moderador de conteúdos no portal de vídeos Bilibili, morreu de hemorragia cerebral na semana passada. Em reacção, várias vozes se têm levantado nas redes sociais chinesas a partilhar a sua experiência pessoal e a denunciar a “cultura 996” – referência a um horário laboral que se prolonga das nove da manhã às nove da noite, ou vice-versa, seis dias por semana – que, dizem, ainda persiste na China.

Colegas de trabalho não identificados garantiram mesmo que o jovem foi forçado a fazer horas extraordinárias, conta a Lusa. O jovem encontrava-se a trabalhar durante a festa do Ano Novo Lunar – altura em que muitos chineses pedem férias.

“São muitas as pessoas que se demitem [da empresa] porque a Bilibili se recusou a pagar mais pelos turnos que são feitos em tempos de férias e por lhes ter recusado pedidos de folgas durante a festa do Ano Novo Lunar”, escreve na rede social chinesa Weibo um ex-trabalhador desta empresa, citado pelo site de notícias independente SupChina, baseado em Nova Iorque. Este ex-trabalhador acusa ainda a empresa de estar a tentar encobrir a morte do trabalhador e de ter eliminado o seu perfil da base de dados o quanto antes.

A tecnológica chinesa nega que o cansaço excessivo tenha sido a causa principal da morte do trabalhador, defendendo que a lista de presenças dessa semana comprova que o trabalhador de 25 anos trabalhou durante o período considerado “normal” (das 9h30 às 18h30).

Segundo o SupChina, o facto de haver grandes possibilidades de se vir a ter de trabalhar horas extras não é novidade para quem se quer candidatar à Bilibili. Na descrição de emprego, a empresa não omite que os candidatos devem estar dispostos a trabalhar “durante a noite” e ser capazes de suportar “altas pressões”.

Reagindo à acesa discussão que tem estado a ocorrer na Weibo sobre a “cultura 996”, e particularmente sobre o caso do jovem, a Bilibli decidiu proibir a conversa, tanto no seio da empresa como na própria rede social, segundo o SupChina, que cita a China Youth Daily.

Para acompanhar o caso do jovem, a Bilibili criou “uma equipa de trabalho específica” e tem estado “a trabalhar com a polícia e com a sua família”. Citada pelo Guardian, a firma deu garantias que vai “expandir o recrutamento de auditores”, contratando mais mil pessoas ainda este ano, e que “prestará mais atenção à saúde física dos seus trabalhadores”.

Depois de uma série de mortes ligadas ao excesso de trabalho na China, especialmente ao longo de 2020, o governo chinês aboliu, em Setembro do ano passado, este sistema de trabalho “996”, proibindo as empresas de continuar a exigir horas extras aos seus trabalhadores. Estes últimos acusam o governo, porém, de ter “ignorado” o que veio depois: ainda é normal que “empregados das grandes empresas trabalhem durante 12 horas”, critica-se na rede social Weibo.

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