Rui Costa sobre Nélson Veríssimo: “Estou convencido de que não será só para seis meses”

Presidente do Benfica abordou os principais temas da actualidade do clube, do conflito entre Jesus e Pizzi, ao processo Cartão Vermelho.

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LUSA/MIGUEL A. LOPES

Na primeira entrevista, perante as câmaras da BTV, depois dos últimos e turbulentos dias de Dezembro, que redundaram na troca de treinador do Benfica, o presidente dos “encarnados”, Rui Costa, debruçou-se sobre o incidente entre Pizzi e Jorge Jesus, manifestou total confiança nas capacidades do actual técnico, Nélson Veríssimo, e rejeitou liminarmente alguma vez ter lesado o clube. Tal como rejeitou a ideia de que a aposta na formação tenha sido posta de lado nas duas últimas temporadas. Confira os tópicos essenciais.

O processo Cartão Vermelho

“Só quem está de má-fé pode achar que eu seria capaz de lesar o Benfica. As assinaturas? Assino eu como assina qualquer outro administrador, são procedimentos normais, não significa que estivesse em algum conluio. Se eu tivesse algo a esconder e não estivesse de consciência tranquila, que sentido faria assumir este cargo quando sabia que estaria mais exposto, que seria mais escrutinado? Jamais seria capaz de prejudicar o Benfica em questões financeiras ou legais e estarei pronto como presidente e cidadão para ajudar as autoridades e esclarecer tudo”, afirmou a respeito do processo Cartão Vermelho, que corre na justiça e que tem o ex-presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, no olho do furacão.

A escolha do actual treinador

“Faz parte escolher um treinador que se adapte ao projecto desportivo do Benfica, e essa foi uma das razões da escolha de Nélson Veríssimo. É da casa, conhece os nossos jovens e conhece o nosso pensamento sobre a formação”.

O Nélson Veríssimo é um homem da casa e nesta transição era importante mudar ali um pouco o paradigma, dar ali um choque térmico. É da casa e tem extraordinária qualidade, como estava a mostrar na equipa B. É um benfiquista ferrenho, é um jovem treinador com uma ambição enorme e, acima de tudo, já conhecia parte deste plantel. Ou seja, foi uma mudança com algum conhecimento”.

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O futuro de Nélson Veríssimo

“Acredito plenamente nas capacidades dele, tenho a maior confiança nele e sei o quanto sofre pelo clube e o quanto sofre a dobrar ao mínimo resultado que não seja positivo. E é um treinador que tem feito um trabalho fantástico em termos de formação, aposta que vamos querer sempre fazer, e por isso acredito plenamente que seja a pessoa ideal neste momento para dar a volta ao fatídico mês de Dezembro. Se não tivesse confiança nele tinha-o metido como interino e não até ao final da temporada. No Benfica tem de criar-se um projecto, obter-se resultados e dar tempo aos treinadores para trabalharem. Estou convencido de que não será só para seis meses, mas vamos ser cautelosos e esperar pelo que será o futuro do Benfica”.

O mercado de transferências

“O mercado de Janeiro oferece muita coisa, sobretudo na vida futebolística pós-covid. A preocupação neste momento até é reduzir os plantéis. Gosto de plantéis curtos mas nestes últimos dois anos não tem sido possível, não porque o treinador seja exagerado na escolha, mas por causa da covid, que nos obriga a ter um plantel mais vasto. Ainda assim, um dos objectivos agora é reduzir o plantel nesta segunda parte da temporada, até para poder criar mais espaço para os nossos jovens jogadores. Há esse objectivo de cada vez explorar mais o jogador da casa, faz parte do projecto”.

A aposta na formação

“Nós, nestes últimos dois anos, mudámos um bocado o paradigma, mas não é verdade que deixámos de apostar na formação. Temos o Paulo Bernardo a chegar, temos o Gonçalo Ramos a jogar muito mais do que no ano passado... Mas sim, fomos mais ambiciosos nas contratações, mas tudo isto trouxe uma dificuldade que é um dos pontos que quero acabar no futuro, que é a contratação de muitos jogadores. Quando se contrata muitos jogadores, entre adaptação dos jogadores, adaptação aos modelos de jogo, isso muitas vezes atrasa e prejudica quem chega. Nestes últimos dois anos, fizemos um investimento alto e diferente, é verdade, mas investimos em jogadores internacionais, com carreiras que nos davam grandes expectativas (...) A ideia é juntar este grande projecto da formação que temos no Seixal com jogadores contratados que tragam experiência”.

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A temporada 2021-22

“Até ao final da época espero a reacção natural de uma equipa com um plantel extraordinário. E repito: com um ou outro jogo menos conseguido, até Dezembro todos os objectivos estavam a ser cumpridos e as coisas a correr como planeado, mas este mês de Dezembro tirou-nos da Taça de Portugal e deixou-nos a sete pontos do líder na Liga, o que nos dificulta muito a tarefa. Mas jamais pensar que o campeonato está terminado ou a época está terminada ou que já esteja a preparar a próxima época”.

A contratação de Jorge Jesus

“Foi um ano e meio bastante difícil. Sabíamos que o regresso de Jesus, até pela condicionante de ter ido para o Sporting, obrigava quase a vitórias imediatas, o que não aconteceu e deixou o ambiente bem mais pesado em torno da equipa. Isso foi prejudicial para todos. Infelizmente, não conseguiu fazer o mesmo trabalho que na primeira passagem. É um excelente treinador, dedicou-se de corpo e alma ao projecto, mas há trabalhos que não correm como se espera. Não deixa de ser um grande treinador”.

A conversa com o Flamengo

“A questão da tal autorização [para falar com os dirigentes do Flamengo que estiveram em Portugal à procura de treinador], que tanto se fala como foi possível, foi no sentido de Jesus limpar a cabeça de uma vez por todas, libertar-se do peso e focar-se no que tinha para se focar. E esse compromisso que assumimos foi cumprido à regra”.

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A desavença com Pizzi

"Houve esse desentendimento, chamemos-lhe assim, entre jogador e treinador, e a equipa manifestou apoio a Pizzi. E quando se diz que Jorge Jesus acaba por sair porque eu intervim a favor de Pizzi e já não havia condições para ele trabalhar, quem diz isso não conhece Jorge Jesus e não me conhece a mim, porque isso seria impensável (...) Jesus pode confirmar o que digo, estou à vontade: após esse incidente, o que fiz foi coordenado com Jorge Jesus. O Pizzi não tinha sido excluído até ao final da época, foi um castigo daquele dia. ‘A equipa vai treinar, mas tu hoje não vais treinar, vai falar com o presidente’. Mas não o excluiu até final da época como se disse. Estava no Seixal, não fui chamado, estava lá, e decidimos naquele momento o que fazer para que aquele desentendimento terminasse”.

O adeus de Jorge Jesus

“O que leva Jesus a pensar durante o dia não é propriamente a questão Pizzi, que seria sempre resolvida com naturalidade. O que custa e pesa a Jesus, e pesa também a mim, obviamente, é que os jogadores ficaram do lado de lá e não do lado de cá. É isso que faz pensar que, a partir dali, o trabalho seria mais difícil. Até porque o incidente aconteceu após o jogo com o FC Porto, para a Taça, em que Jesus não estava no balneário, não presenciou. Depois surge sempre o diz que disse e criou-se um mal-estar. Foi isso que fez com que Jesus percebesse que a equipa não tinha tomado o partido dele e que havia uma quebra de confiança, uma quebra na relação. Não era especificamente o episódio Pizzi, mas a tomada de posição de toda a equipa”.

A composição da SAD

Há um accionista minoritário [José António dos Santos] que quer meter na SAD um administrador [Pires de Andrade], o que é a primeira vez que acontece. E baralhou-nos as contas, porque não era isso que inicialmente tínhamos pensado quando comecei a constituir o novo Conselho de Administração, inclusive com a entrada de duas mulheres. Temos até dia 24 para estudar e apresentar a solução para se cumprir essa representatividade feminina que também é muito importante para mim. Nada contra as pessoas, mas se até aqui nunca tinha havido essa necessidade [de ter um administrador na SAD], porque é que agora há?”.

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O investimento externo

Temos tido conversas com John Textor, ainda esta semana os dois vices encarregues do pelouro estiveram com ele, e o que estamos a analisar é se é oportuno ou não para o Benfica um investidor, seja John Textor ou outro, se aportar valor financeiro e desportivo. Não há uma resposta final, repito, está em análise, mas sempre com a premissa de que o clube nunca perderá a maioria do capital da SAD. Enquanto eu aqui estiver, será assim”.

A auditoria

“A auditoria forense foi entregue à empresa Ernst & Young, que apresentou os resultados a mim, ao vice-presidente da área jurídica e aos nossos advogados, a 22 de Dezembro. Essa primeira auditoria forense foi feita a reboque do que estava a ser feito pelo Ministério Público, ou seja, começámos com os três primeiros contratos que levaram para investigação. Nesses três contratos não foi encontrado nada que deixasse claro que o Benfica teria sido lesado nas operações, pelo que foi decidido, também pelos nossos advogados, que o Benfica não se iria constituir como assistente no processo uma vez que não justificava, para já, essa posição (...) Todos concordámos estender esta auditoria aos restantes contratos, os 55, que a Judiciária e o Ministério Público têm hoje em seu poder. Se quisesse esconder algo ficávamo-nos por aqueles três contratos e lavava as mãos. Mas queremos levar este processo até ao fim”.

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