Cenário mais provável para a ocupação das camas em cuidados intensivos “é o mais benigno”

Número de doentes graves em cuidados intensivos pode ficar abaixo do limiar crítico ou ultrapassar muito as linhas vermelhas. “Só há mais ou menos uma semana” é que se começou a “observar o aumento da incidência na população com 65 ou mais anos”, avisa Baltazar Nunes. Mas, para já, tudo aponta para o cenário “mais benigno”, com um máximo de 187 doentes graves.

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O relatório da DGS dava conta de 143 pessoas internadas em Unidades de Cuidados Intensivos Manuel Roberto

Deixemos de olhar para os números de novos casos de infecção na população em geral. O que é preciso, na fase actual da pandemia, marcada pela escalada sem paralelo da incidência devido à variante Ómicron, é monitorizar os indicadores de doença grave, de mortalidade e a evolução da infecção nos mais idosos. Com as projecções a apontarem para a possibilidade de o pico de infecções desta onda de covid-19 ser atingido na próxima semana, será o impacto nos internamentos em unidades de cuidados intensivos (UCI), algumas semanas mais tarde, que poderá justificar uma mudança de rumo.

Para já, essa hipótese não se põe. As projecções apresentadas esta quarta-feira no Infarmed por Baltazar Nunes, o epidemiologista que lidera a equipa do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (Insa), apontam para três cenários, do menos gravoso ao mais pessimista, com uma amplitude enorme nos impactos calculados. A simulação dos cenários varia, tendo em conta vários pressupostos, nomeadamente os dados sobre a eficácia da vacina e o resultado da semana de contenção na redução de contactos.

Na fase actual, “o cenário mais provável” para a ocupação das camas em UCI “é o mais benigno”, que aponta para um máximo de 187 doentes internados em UCI no início de Fevereiro, bem abaixo do limiar crítico definido nas linhas vermelhas (255), afirma ao PÚBLICO Baltazar Nunes. Mas o cenário mais pessimista – em que se admite chegar a um máximo de 453 camas ocupadas em UCI é uma hipótese “que não podemos descartar e precisamos de manter em cima da mesa”, enfatiza.

Porquê? Porque os dados do Insa e da Direcção-Geral da Saúde (DGS) mostram que “a onda de Ómicron começou nas pessoas com idade entre os 20 e os 29 anos”, mas está a progredir para outros grupos etários e “só há mais ou menos uma semana” é que se começou a “observar o aumento da incidência na população com 65 ou mais anos”.

“Este mesmo fenómeno ocorreu na Dinamarca e na Inglaterra”, onde a propagação da Ómicron está mais avançada, e são estes dois países que estão a servir de farol para se perceber como evolui a pandemia. Para já esta progressão não está a ter um impacto expressivo nos internamentos de doentes em estado crítico, mas é preciso aguardar um pouco mais. “Como é na população mais frágil (com 65 ou mais anos) que o risco de doença grave é maior, e uma vez que há um atraso entre o aumento da incidência nos mais frágeis e a evolução das hospitalizações, teremos de ser prudentes e esperar mais tempo para observar esta evolução”, defende o epidemiologista.

Ainda assim, mesmo no pior cenário, Baltazar Nunes faz notar que para os internamentos em UCI e mortalidade, os indicadores mais importantes, o que se antevê é um impacto “moderado”, quando se compara com o que aconteceu há um ano, antes da vacinação, e em que, num dia, chegámos a ter mais de 900 doentes internados em cuidados intensivos e mais de 300 óbitos. Neste momento, para “as hospitalizações gerais [em enfermarias] é que se projecta um impacto “elevado a moderado”, sublinha, em três cenários que vão de um máximo de 1300 a 3700 internados, na última semana de Janeiro ou primeira de Fevereiro.

“A razão para esta diferença deve-se ao que estamos a observar na Dinamarca, Inglaterra e Portugal (para já) – aumento das hospitalizações gerais e estabilização das camas ocupadas em UCI. Por isso, nesta fase o cenário mais provável para as UCI é o mais benigno”, repete. Mas insiste que, como esta situação pode mudar, é determinante manter “a monitorização dos indicadores de doença grave que nos pode levar a mudar de expectativas”.

Baltazar Nunes avançou também, naturalmente, projecções para a incidência. E estas indicam que, na próxima semana, Portugal pode chegar a números diários de novos casos de infecção que oscilam, de novo com grande amplitude, entre os 42 mil e os 130 mil. Será o pico desta onda, pressupondo-se que as medidas de contenção chegaram para reduzir o índice de transmissibilidade a menos de um. Se não, o pico será atirado “potencialmente” para o final de Janeiro, diz.

A equipa que lidera não fez projecções para óbitos, porque “o modelo matemático foi construído para medir o impacto nas hospitalizações, ou seja, usa os dados históricos das hospitalizações para a calibração, o que leva a que as projecções da mortalidade sejam pouco credíveis”, explica. Além disso, diz, “estes cenários servem para o planeamento da resposta dos serviços de saúde e da sociedade” e foi por isso que desta vez também se olhou para outro indicador a percentagem de pessoas “potencialmente” em isolamento, quarentena ou absentismo – e que poderá oscilar entre 4% e 12% da população. Um mar de gente.

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