Costa fala em comportamentos “inaceitáveis” de militares da GNR e Marcelo pede justiça “com rapidez”

O Presidente da República pede justiça com celeridade no caso dos elementos da GNR acusados de torturarem imigrantes. Já António Costa classifica de “absolutamente inaceitáveis” os comportamentos dos militares da GNR envolvidos no caso.

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Marcelo lembra que o "respeito pelos direitos fundamentais" é devido "a todos, sejam ou não cidadãos nacionais” Rui Gaudencio

O primeiro-ministro e o Presidente da República abordaram esta sexta-feira o caso relacionado com a acusação a militares da GNR por humilharem e torturarem imigrantes na região de Odemira. António Costa qualificou de “absolutamente inaceitáveis” os comportamentos dos militares da GNR, sublinhando que as autoridades judiciárias e a Inspecção-geral da Administração Interna actuaram, enquanto Marcelo Rebelo de Sousa pediu celeridade à actuação da justiça.

“Felizmente, elas [as imagens] já foram vistas em bom tempo pelas autoridades judiciárias. São imagens que têm já mais de dois anos e há mais de dois anos que esta investigação criminal está a ser desenvolvida pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público. Mostra que ninguém, obviamente, está acima da lei, e comportamentos daquela natureza são absolutamente inaceitáveis, sejam nas forças de segurança, sejam por qualquer pessoa”, defendeu António Costa.

O chefe do Governo falava em declarações à RTP e Antena 1, sublinhando que “não é possível aceitar esse tipo de comportamento”. “Sei também que alguns desses agentes já foram punidos, um deles até com a pena de expulsão da Guarda Nacional Republicana. Portanto, a Inspecção-geral da Administração Interna também actuou e também tomou medidas”, sustentou também o primeiro-ministro.

Para António Costa, que não viu as imagens, que lhe foram descritas, “ninguém que tenha visto essas imagens pode ter outro sentimento” que não seja de repugnância.

Por seu turno, o Presidente da República afirmou esta sexta-feira confiar que será feita justiça, com rapidez, em relação às acusações de “inaceitáveis violações de liberdades, direitos e garantias” por parte de elementos da GNR a imigrantes. “O Presidente da República confia que Justiça será feita, com rapidez, em relação às acusações de inaceitáveis violações de liberdades, direitos e garantias”, refere uma nota publicada no site da Presidência da República.

Marcelo Rebelo de Sousa lembrou, por um lado, que “as forças e serviços de segurança, e o Estado em geral, são particularmente responsáveis pelo seu respeito e cumprimento” e que, por outro, “os crimes ou infracções cometidos por elementos de uma força não podem ser confundidos com a missão, a dedicação e a competência da generalidade dos seus membros”.

O Presidente da República assinalou que no sábado se comemora o Dia Internacional das Migrações e sublinhou que “tais garantias e respeito pelos direitos fundamentais são devidos a todos, sejam ou não cidadãos nacionais”.

O chefe de Estado sublinhou ainda que, “como nação de emigração”, existe uma “particular responsabilidade na qualidade do acolhimento dos imigrantes que nos procuram e aqui encontram uma nova vida, contribuindo para o desenvolvimento e bem-estar” do país.

Sete elementos da GNR estão acusados de um total de 33 crimes, por humilharem e torturarem imigrantes em Odemira, Beja, em 2019, actos que os próprios filmaram, noticiou a CNN/TVI.

Na quinta-feira, a GNR esclareceu que dois dos sete militares encontram-se a cumprir pena de suspensão decretada pelo Ministério da Administração Interna, enquanto os outros aguardam medidas sancionatórias.

De acordo com a GNR, três dos agentes do Destacamento Territorial de Odemira são reincidentes, depois de terem estado “envolvidos em agressões a indivíduos indostânicos”, em 2018.

O esclarecimento surge após uma investigação CNN/TVI que deu conta da acusação de sete elementos da GNR de um total de 33 crimes, por humilharem e torturarem imigrantes em Odemira.

Num despacho de acusação de 10 de Novembro e ao qual a CNN Portugal e TVI tiveram acesso, o Ministério Público refere que os militares cometiam os actos de tortura “em manifesto uso excessivo de poder de autoridade” e que “todos os arguidos agiram com satisfação e desprezo pelos indivíduos”.

MP diz que militares da GNR agiram com “ódio"

O Ministério Público (MP) considera que todos os militares envolvidos num processo de sequestro e agressão de imigrantes no concelho de Odemira agiram por “caprichos torpes”, com “desprezo” e “em manifesto ódio” pelas nacionalidades das vítimas.

Na acusação, à qual a agência Lusa teve hoje acesso, o MP refere que os sete militares arguidos, “em cada um dos actos que cada um praticou, agiram em manifesto ódio” pelas vítimas. Um ódio “claramente dirigido” às suas nacionalidades da região do Indostão e “apenas por tal facto, e por saberem que, por tal circunstância, eram alvos fáceis”.

Segundo o MP, todos os arguidos agiram, “em cada um dos actos que praticaram ou contribuíram para que fosse praticado, em evidente prejuízo” das vítimas, “subjugando-os às condutas que por caprichos torpes lhes impuseram”.

“Todos os arguidos agiram com satisfação e desprezo” pelas vítimas que “subjugaram”, obrigando-as “a suportar” os seus comportamentos, “atenta a qualidade” de autoridade policial que ostentavam, “não havendo um que tivesse tomado uma qualquer medida para terminar com tais condutas”.

BE responsabiliza hierarquia e tutela

A coordenadora do BE disse que as imagens das agressões de sete agentes da GNR a imigrantes em Odemira são “chocantes”, mas “não surpreendentes” e responsabilizou a hierarquia e a tutela pela manutenção dos reincidentes no terreno.

“É responsabilidade da hierarquia e da tutela seguramente. Quando nós sabemos que há casos reincidentes e as pessoas não são afastadas, significa que a hierarquia e a tutela não estão a fazer o que devem para proteger os cidadãos e as próprias forças de segurança”, afirmou Catarina Martins quando questionada pelos jornalistas, no Porto, à margem da entrega das listas de deputados às eleições legislativas de 20 Janeiro.

Salientando que as imagens em causa são “absolutamente chocantes”, a bloquista disse, no entanto, considerar “que não são surpreendentes” em face dos casos de violência racista em Portugal, que têm vindo a ser denunciados pelas organizações internacionais e pelo próprio Bloco de Esquerda (BE).

“Nós podemos fechar os olhos ao problema ou encará-lo de frente. Muitas vezes quando chamamos a atenção para o problema dizem-nos que estamos a atacar as forças de segurança, muito pelo contrário. Defender as forças de segurança, é defender que quem veste a farda está à altura das suas responsabilidades, em que não há impunidade”, defendeu, acrescentando que “quem tem comportamento destes não pode vestir a farda”.

Para Catarina Martins é a “cultura de impunidade” que cria casos como o de Odemira, onde um grupo de jovens agentes se uniram em grupo para um ato de violência racista xenófoba. “Estamos a falar de jovens agentes que se unem em grupo para agredir imigrantes e isto é um de uma brutalidade, de uma gravidade enorme e é verdade que há uma atmosfera de impunidade porque há casos de reincidentes que continuam ao serviço das forças de segurança”, declarou.

Sem pôr em causa o direito de defesa dos acusados, a também cabeça de lista pelo círculo do Porto para as legislativas de Janeiro, considera que neste caso e perante a conclusão de que os agentes tiveram uma “atitude destas”, a hierarquia e a tutela deveria ter, no “mínimo” procedido à sua suspensão. “Não pode continuar no terreno, parece-me óbvio. Nós temos de confiar nas forças de segurança”, rematou.

Também a porta-voz do PAN, Inês Sousa Real, repudiou o caso dos sete militares da GNR suspeitos de agredir e sequestrar imigrantes em Odemira e defendeu que “todas as responsabilidades terão de ser apuradas”. “Repudiamos profundamente este caso de Odemira. Os crimes de ódio não podem ter lugar num estado de direito! O abuso de poder por parte de qualquer autoridade é sempre condenável”, escreveu a líder do PAN na sua página oficial na rede social Facebook.

Inês Sousa Real defendeu que “Portugal tem de ser um país de pleno respeito pelos direitos humanos, onde todas as pessoas se sintam seguras” e refere que “não se compreende também como é que este caso só agora veio a público, após um ano, ainda para mais quando o Ministério da Administração Interna já tinha sido confrontado o caso de Ihor Homeniuk”.

“Agora todas as responsabilidades terão de ser apuradas”, salientou na mesma publicação, indicando que o PAN “vai desde já questionar o Ministério da Administração Interna, para que sejam prestados os devidos esclarecimentos”.

PCP pede “punição exemplar” de militares da GNR

Já o PCP considerou esta sexta-feira “inaceitável” que os militares da GNR envolvidos em acusações de tortura a imigrantes em Odemira (Beja) continuem em funções, e defendeu “punição exemplar” e reflexão sobre a selecção destes profissionais.

“O PCP considera que tais comportamentos, que dizem respeito a elementos concretos que não à instituição no seu todo, requerem punição exemplar, mas requerem também que as instituições reflictam sobre a selecção, formação e acompanhamento ao longo do tempo dos profissionais que nelas prestam serviço”, refere o PCP em comunicado.

Os comunistas condenaram “veementemente” estes crimes e consideraram “inaceitável que os envolvidos se mantenham em funções”.

Também o Livre considerou esta sexta-feira que o caso de militares da GNR que torturaram imigrantes em Odemira (Beja) é “chocante e inaceitável” e que o próximo governo deve priorizar a tolerância zero ao racismo pelas forças de segurança.

Numa nota enviada à imprensa, o partido da papoila defende que “o caso de agressões e tortura em Odemira, por parte de militares da GNR, a imigrantes é chocante e inaceitável”.

“A existência de racismo e de xenofobia nas forças policiais portuguesas tem vindo a ser constantemente denunciada. A ONU pediu explicitamente acção sistémica contra o racismo e fim da impunidade da violência policial, no Relatório das Nações Unidas que investigou violações do Direito Internacional dos Direitos Humanos pela polícia, ainda este ano”, lê-se na nota.

Chega condena actuação de militares da GNR

O presidente do Chega também condenou os episódios de tortura praticados por militares da GNR, mas considerou que há “dois critérios diferentes” no país para com as forças de segurança.

Questionado pelos jornalistas sobre as suspeitas de tortura que recaem sobre sete militares da GNR, André Ventura disse que é necessário “exigir responsabilidade e condenar todos os actos” de quem utiliza um uniforme policial para “abusar da autoridade, humilhar ou diminuir outros seres humanos”.

“A condenação é evidente, é inequívoca”, completou. No entanto, Ventura considerou que “o país está a viver dois critérios” no que diz respeito às forças de segurança. “Gostava de ver a mesma indignação do país quando as forças de segurança são atacadas e humilhadas”, sustentou.

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