Dentro de uma semana a Ómicron deverá ser dominante em Portugal

Estima-se que na semana do Natal – a próxima semana – a prevalência da variante Ómicron aumente para 50% e que passe para 80% na semana do final do ano.

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Representação do coronavírus SARS-CoV-2 NIAID

A variante Ómicron já representa 20% das novas infecções do SARS-CoV-2 em Portugal. Mas estima-se que na semana do Natal – a próxima semana – esta prevalência aumente para 50% e que passe para 80% na semana do final do ano, anunciou a ministra da Saúde Marta Temido, numa conferência de imprensa na manhã desta sexta-feira. Na próxima semana, poderá ser assim a variante dominante em Portugal.

“Temos uma nova dificuldade e precisamos de a enfrentar em conjunto. Esta nova dificuldade é a variante Ómicron”, introduziu Marta Temido na conferência. A ministra relembrou que um dos primeiros casos associado a esta variante foi identificado a 28 de Novembro. Agora, através das estimativas baseadas na monitorização em tempo real de uma falha de detecção de um gene do coronavírus (concretamente o gene S), conseguiu-se estimar que a prevalência da variante ronda já os 20% em Portugal – ou seja, representa 20% das novas infecções com o coronavírus.

E adiantou quais os cenários para as próximas semanas: “[A Ómicron] poderá ter uma prevalência de 50% na semana do Natal – a próxima semana – e uma prevalência de 80% na semana do final do ano.”

Complementando a informação referida pela ministra da Saúde, João Paulo Gomes (coordenador do estudo sobre diversidade genética do SARS-CoV-2) diferenciou que os cerca de 70 casos da Ómicron confirmados em laboratório através da sequenciação genómica “nada têm que ver com a realidade”, esclareceu o investigador do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (Insa).

Essa “realidade” é a monitorização em tempo real referida por Marta Temido e feita através da detecção de amostras positivas com “falha” do gene S, que é observado em alguns kits de diagnóstico de testes de PCR. Os testes de PCR detectam três regiões do vírus e este teste não o consegue fazer numa das regiões da Ómicron. “[Esta variante] tem uma mutação que faz com uma dessas regiões não seja detectada”, explicou. “Tem um valor preditivo muito elevado de que é a Ómicron.”

Com base nessa monitorização em tempo real, esta terça-feira, o Insa tinha anunciado que a prevalência da Ómicron em Portugal rondaria os 10%, referindo que a tendência de crescimento da prevalência observada nos últimos dias era “fortemente indicadora da existência de circulação comunitária da variante Ómicron” no país. Actualmente, já ronda os 20%.

“As projecções apontam para que dentro de uma semana a variante Ómicron já seja a variante dominante no país”, assinalou o investigador do Insa, reforçando que se está a atravessar um processo de substituição da variante Delta (que é a variante dominante em Portugal) para a Ómicron. “Também estimamos, com uma margem de erro relativamente pequena, que no fim do ano mais de 90% dos casos de covid-19 no país sejam causados pela variante Ómicorn. Estamos a falar de uma estimativa a 15 dias.”

Sobre essas estimativas, afirmou que são semelhantes às efectuadas no Reino Unido e na Dinamarca e que as amostragens e dados cedidos pelos laboratórios que colaboram neste estudo têm representatividade geográfica. “Estão espalhados pelo país inteiro. Pensamos que esta estimativa esteja bastante correcta.” Os dados são provenientes da Unilabs, da Cruz Vermelha Portuguesa e do Algarve Biomedical Center, laboratórios que usam o teste de diagnóstico que permite esta análise, segundo o último relatório do Insa sobre a diversidade genética do SARS-CoV-2.

João Paulo Gomes disse ainda que não há qualquer indicação de que qualquer teste existente no mercado – seja um autoteste, de antigénio ou de PCR – tenha uma menor eficácia contra a Ómicron do que contra outras.

O que sabemos sobre esta variante?

Marta Temido fez questão ainda de realçar que “sabemos ainda pouco sobre esta nova variante”. O que sabemos afinal? “Sabemos que a variante é mais transmissível do que a variante Delta, que é a variante predominante até à data”, afirmou sobre a transmissibilidade da Ómicron. Há ainda informações sobre a duplicação de casos causada pela variante. Se na África do Sul os casos duplicam de um a dois dias, isso acontece entre dois e três dias na Dinamarca e no Reino Unido. Em Portugal, o Insa estima que os casos dupliquem a cada dois dias.

Por sua vez, João Paulo Gomes destacou que, tendo em conta dados epidemiológicos (da doença ou do número de infectados que a Ómicron causa em comparação com outras variantes), “esta variante é muito mais transmissível do que outra variante que tenha circulado em Portugal e no resto do mundo”.

Respondendo a uma pergunta dos jornalistas sobre o processo de transmissão, o investigador do Insa realçou que “é exactamente o mesmo” do de outras variantes. “Estamos a falar de um SARS-CoV-2, não é um outro vírus. Transmite-se através das partículas aéreas [como através da tosse, da respiração ou da fala]”, indicou. Mesmo assim, mencionou que a maior transmissibilidade da Ómicron deve-se sobretudo a dois factores: o tipo de mutações que tem, nomeadamente as que estão na zona do vírus que se liga às nossas células (a proteína da espícula); e porque algumas dessas mutações “aparentemente” afectam a ligação aos nossos anticorpos. “Em teoria, por isso, infectará melhor pessoas que [até] já tenham algum grau de imunidade também.”

Baltazar Nunes, também investigador do Insa, frisou que “o sinal de predomínio da Ómicron será na sua maior transmissibilidade”. Por agora, “deduzimos que seja mais transmissível porque está a substituir a variante Delta, ou seja, tem vantagens de transmissão relativamente à Delta”, indicou. Esclareceu que há dois mecanismos para se observar essa vantagem: um maior [número] R, ou seja, cada indivíduo infectado com a Ómicron infecta um maior número de indivíduos; e as reinfecções, em que pessoas com anticorpos para outras variantes (porque já foram infectadas ou vacinadas) não consigam “responder” quando se encontram com a Ómicron e fiquem de novo infectadas.

“O primeiro sinal que vamos observar para esta semana, e que será o sinal de que efectivamente estamos perante uma situação em que a Ómicron é mais transmissível, é o aumento da incidência e do número de reprodução efectiva (RT)”, apontou Baltazar Nunes. “A nossa expectativa é que, quando atingirmos uma maioria do número de casos da variante Ómicron, o R – que está neste momento a descer – comece a crescer. Esse será o sinal de que efectivamente ela estará a conseguir aumentar a incidência.” A partir daí, começará a haver dados suficientes para se fazerem projecções da velocidade a que está a crescer em Portugal. “Nessa fase, ainda é pouco provável que já comecemos a ver um impacto das hospitalizações e na mortalidade significativo sem que comecemos a ver a incidência a crescer. A partir desse momento, começaremos a ter dados para ter acesso a essas projecções da velocidade a que está a crescer.”

Precisamente sobre a severidade que uma infecção com esta variante possa causar, Marta Temido notou ainda que “há uma aparente menor gravidade da doença e da consequente letalidade”. Além disso, sobre a protecção dada pelas vacinas, referiu: “Sabemos ainda que há uma aparente diminuição da efectividade vacinal após o esquema primário vacinal contra a infecção causada pela Ómicron”. Contudo, acrescentou que a efectividade vacinal (a tal protecção dada pelas vacinas no mundo real) contra a infecção assintomática após a administração da dose de reforço das vacinas ainda se estima que esteja entre os 70 e os 75%. “As vacinas ainda a fazerem o seu efeito protector”, sublinhou.

Identificada inicialmente em países da África austral, a Ómicron já foi detectada em vários países pelo mundo. Desde cedo que esta variante suscitou interesse e preocupação devido ao grande número de mutações que possui – entre 26 e 32 na proteína da espícula, que é responsável pela entrada do vírus nas células. No final, de Novembro foi classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como variante de preocupação e denominada então de Ómicron.

Esta semana, a OMS alertou que a percentagem de casos globais da Delta do está a cair pela primeira vez desde Abril, enquanto a Ómicron continua a crescer e já está presente em surtos de transmissão comunitária. Já na sua avaliação de risco, o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC) também considerou que a Ómicron representa um risco “muito elevado” e exige medidas “urgentes e fortes”, de modo a proteger os sistemas de saúde. Apontou ainda que a Ómicron deverá suceder à Delta como a variante dominante na União Europeia no início de 2022, até porque já se assiste a transmissão comunitária dentro da Europa.

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