Ministros da UE dão pontapé de saída na directiva para um salário mínimo adequado

Para a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, a aprovação da posição comum dos 27 é “um momento histórico” e “uma vitória da Cimeira Social do Porto”.

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EPA/STEPHANIE LECOCQ

Os ministros do Trabalho dos 27 acertaram a sua posição comum e aprovaram o mandato do Conselho da UE para o arranque das negociações inter-institucionais da proposta para uma directiva de enquadramento com vista a um salário mínimo justo e adequado, que foi avançada pelo executivo comunitário há mais de um ano e esteve em destaque durante a Cimeira Social do Porto organizada pela presidência portuguesa, em Maio.

“Este é um resultado concreto do plano de acção [para a implementação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais] que aprovámos no Porto, e um importante primeiro passo para garantir que todos os trabalhadores na UE passam a ter direito a um salário mínimo, seja por via legal, seja por negociação colectiva”, congratulou-se a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, esta segunda-feira, em Bruxelas.

Na sua posição comum, os ministros concordam com o estabelecimento de um quadro regulatório e mecanismos jurídicos com critérios comuns, que asseguram que em todos os Estados-membros os trabalhadores têm direito ao salário mínimo, quer este seja um valor definido por lei, como é o caso em Portugal, ou um patamar fixado através de convenções colectivas, como é a tradição nos países do Norte da Europa.

“Tinha algumas dúvidas que conseguiríamos chegar a este resultado e por isso estou muito satisfeito”, comentou o comissário europeu com a pasta do Emprego e Direitos Sociais, Nicolas Schmit, que além de agradecer os esforços da presidência eslovena, fez questão de destacar o trabalho realizado pelos “amigos portugueses”, que “construíram a base” do compromisso alcançado esta segunda-feira.

Ainda assim, nem todos os Estados-membros ficaram convencidos: a Hungria e a Dinamarca “furaram” a unanimidade, votando contra o início das negociações; a Áustria absteve-se porque queria mais tempo de reflexão, e a Alemanha também, por se encontrar num período de transição entre governos. “Havia várias resistências e ainda temos algumas divergências. Mas existe também uma grande convergência e unidade entre os Estados-membros”, destacou o comissário.

“Os trílogos não vão ser fáceis”, reconheceu Nicolas Schmit, que acredita que será possível “reconciliar os diferentes pontos de vista” dos Estados-membros, e com o forte apoio do Parlamento Europeu, ter a legislação aprovada “num futuro não muito longínquo”. “Desde que tomou posse, a Comissão enunciou este princípio que queremos ver consagrado: precisamos de ter salários justos, porque a Europa não pode ser um lugar onde as pessoas que trabalham vivam na pobreza e sem ter asseguradas as condições de vida mínimas”, vincou o comissário.

A ministra do Trabalho lembrou que o processo legislativo para a aprovação desta “directiva marcante do ponto de vista da afirmação dos direitos sociais na Europa” tem decorrido em tempo recorde e “com um grande dinamismo”, e assinalou o compromisso já manifestado pela França, que assume a presidência do Conselho da UE a 1 de Janeiro de 2022, de concluir rapidamente as negociações para a sua aprovação. “Há interesse em acelerar o processo e boas perspectivas”, disse.

Como apontou Ana Mendes Godinho, o regime em vigor em Portugal cumpre actualmente com os requisitos previstos na proposta em discussão, nomeadamente em termos dos indicadores de referência para a sua fixação, de 50% da média dos salários de cada país ou 60% do salário mediano. A actualização do salário mínimo português para 705 euros em 2022, promulgada esta segunda-feira, “está dentro destes padrões e cumpre estes dois indicadores”, confirmou a governante.

Quando divulgou a sua proposta de directiva, no final de Setembro de 2020, o executivo comunitário justificou a necessidade da acção legislativa para garantir que os princípios relativos ao trabalho e aos salários que tinham sido subscritos pelos 27 no âmbito do Pilar Europeu para os Direitos Sociais eram efectivamente respeitados.

Bruxelas avançou ainda duas outras razões para “intervir” numa matéria que os Estados-membros mantêm sob a sua competência exclusiva. A primeira partiu da constatação de várias lacunas nos sistemas nacionais para a fixação do salário mínimo, independentemente de serem através da convenção colectiva ou da regulamentação jurídica dos governos — por exemplo, a cobertura, os mecanismos de actualização e controlo ou as disparidades entre homens e mulheres, que serão requisitos a ter em conta após a aprovação da proposta.

A segunda tem a ver com o valor do salário mínimo na UE, que segundo os estudos disponíveis não cresceu na mesma proporção do nível de prosperidade ou da taxa de produtividade na maior parte dos Estados membros, e tem vindo a deteriorar-se em relação ao salário médio. À data da apresentação da proposta da Comissão, a remuneração auferida por um em cada seis trabalhadores na UE era considerada baixa. Mas como insistiu Nicolas Schmit, a economia europeia não pode competir na base dos baixos salários. A expectativa de Bruxelas é que o valor do salário mínimo possa subir por efeito da entrada em vigor da directiva.

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