Lukashenko volta a ameaçar cortar o fornecimento de gás russo à Europa

Presidente da Bielorrússia dá entrevista a agência de Moscovo em que se oferece para receber armas nucleares russas, se a NATO mudar armas da Alemanha para o Leste da Europa.

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Aleksander Lukashenko a ser entrevistado pelo director-geral da agência russa Rossiya Segodnya, Dmitry Kiselyov, em Minsk Reuters/BELTA

O Presidente da Bielorrússia, Aleksandr Lukashenko, disse esta terça-feira estar disposto a cortar o fornecimento de gás russo à Europa, numa entrevista com uma agência de notícias estatal da Rússia. 

O Kremlin reagiu dizendo que esta era uma ideia de Lukashenko não concertada com Moscovo e que a Rússia esperava que não viesse a concretizar-se. O porta-voz do Kremlin Dmitri Peskov​ disse que Putin tinha expressado “compreensão” em relação a Lukashenko, que está “sob uma pressão sem precedentes e sem justificação”. Mas, “por outro lado, o Presidente está a contar que isto não resulte em qualquer incumprimento das nossas obrigações em relação aos compradores de gás na Europa, especialmente numa altura tão difícil para os europeus”.

Esta já é a segunda vez que Lukashenko ameaça com um potencial corte: a última foi feita há cerca de três semanas e fez subir os preços do gás, que desceram após declarações do Presidente russo, Vladimir Putin, afirmando que a acção não traria “nada de bom” e que falaria a Lukashenko sobre a questão.

O chefe de Estado bielorrusso voltou, no entanto, à questão, dizendo que se a Polónia “levar a cabo mais acções contra a Bielorrússia”, incluindo “fechar a fronteira”, a consequência será o fecho do gasoduto que transporta o gás desde a Rússia para a Europa. “Acham que vou manter os contratos? Vá lá”, declarou, citado pela agência bielorrussa BelTA. A entrevista foi feita em Minsk pelo director-geral da agência russa Rossiya Segodnya, Dmitri Kiseliov.

A Ucrânia, afirmou ainda Lukashenko, não é uma opção para fazer chegar bens europeus à Rússia, e não há hipótese através dos Bálticos. “Só têm a Bielorrússia. Por isso, antes de fazerem declarações, deviam pensar bem primeiro. Se a Polónia fecha a fronteira, quem é que vão prejudicar? A si próprios”, declarou Lukashenko. “Se fecharem [a fronteira], vão ter de pensar como é que vão comprar gás à Rússia.”

Depois de Lukashenko ter ameaçado cortar o gás russo para a Europa, Putin respondeu publicamente que se o fizesse, arriscaria a relação de Minsk com Moscovo. Na altura, Putin disse que falara com o Presidente da Bielorrússia e que este “não tinha mencionado” qualquer corte, “nem dado qualquer sinal” de estar a considerar esta medida. “Claro que, em teoria, Lukashenko poderia, como Presidente de um país de passagem, ordenar um corte do fornecimento [de gás russo] à Europa. Mas isso seria uma quebra do nosso contrato e espero que isto não aconteça.”

A Polónia decretou, entretanto, diz a agência Reuters, novas regras que limitam o acesso à fronteira com a Bielorrússia, onde centenas de refugiados e migrantes têm tentado passar, encorajados ou mesmo levados pelas autoridades bielorrussas, que por vezes lhes dão ferramentas para cortar o arame farpado. A União Europeia acusa a Bielorrússia de estar a levar a cabo “um ataque híbrido”, levando centenas de pessoas a tentar atravessar a fronteira de modo irregular, e mais de dez pessoas morreram em consequência, por várias causas, incluindo o frio.

Bruxelas não reconheceu a vitória de Lukashenko em eleições que declarou fraudulentas e tem imposto várias rondas de sanções ao seu regime.

Oferta para albergar armas nucleares

Por outro lado, Lukashenko, cujo maior apoio vem de Moscovo, reconheceu a importante ligação do seu país à Rússia e disse que “se a Rússia sofrer uma agressão da Ucrânia”, o seu regime “apoiará a Rússia de modo legal, económico e político. Legal é a palavra mais importante aqui”.

O Presidente bielorrusso também declarou pela primeira vez que considera a Crimeia ocupada como parte da Rússia, segundo a notícia da RFL (Rádio Europa Livre, financiada pelo Governo dos EUA) sobre a entrevista de Lukashenko.

Lukashenko disponibilizou ainda à Rússia a possibilidade de voltar a ter armas nucleares em território bielorrusso.

Questionado sobre uma declaração do secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, que falava na possibilidade de deslocação de armas nucleares da Alemanha para a Europa de Leste (caso o novo Governo alemão decida que não quer ter armas nucleares no seu território), Lukashenko respondeu que nesse caso “sugeria que Putin voltasse a ter armas nucleares na Bielorrússia”, dizendo que “o país está pronto para isso”. “Como um senhorio previdente, não destruí nada [da infra-estrutura de armas nucleares soviéticas], todos os depósitos se mantêm”, declarou.

A RFL comenta que Rússia e Bielorrússia sempre tiveram um acordo que prevê uma ligação próxima em termos políticos, económicos e militares, mas durante anos Lukashenko não as aprofundou embora dependesse da energia barata e dos empréstimos de Moscovo. Agora, vários analistas dizem que o Kremlin está a explorar a vulnerabilidade de Lukashenko, depois das manifestações e de uma onda de contestação popular ao resultado das eleições de Agosto, vistas como fraudulentas, e a tentar obter mais concessões da Bielorrússia.

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