A narrativa política de uma curta campanha eleitoral

A falta de tempo de Paulo Rangel para se afirmar, caso venha a ganhar a disputa interna a Rui Rio, pode revelar-se uma falsa questão, na medida em que tem a matéria estudada. Para já impõe-se pôr em marcha o próprio PSD, saído de um período de longa letargia, sob a condução zombie de Rio.

A crise política desencadeada pelo chumbo do Orçamento de Estado e pela decisão do Presidente da República de dissolver a Assembleia da República e convocar eleições para 30 de janeiro de 2022 apresenta características invulgares, quer pela sua génese (o colapso da “geringonça”, ao cabo de seis anos de governação), quer sobretudo pelas péssimas condições em que foram apanhados os principais partidos do centro e da direita.

A verdade é que, não obstante o momento ser muito desfavorável a uma campanha, bem programada e executada com o tempo necessário ao esclarecimento público, em que se possa afirmar uma clara alternativa à atual situação, a solução democrática (e ousada) escolhida pelo PSD, ao não recusar o processo de eleição do presidente do partido e dos seus órgãos dirigentes, ainda que à custa do estreitamento do período que terá para conduzir a campanha eleitoral, afigura-se francamente superior à do CDS, que, a manter-se, levará a um partido dirigido por quem já perdeu a legitimidade para o conduzir e será objeto de forte contestação interna ao longo dos próximos tempos.

Na realidade, face a um PS, com a casa temporariamente arrumada, o PSD optou e bem por se submeter a um processo eleitoral interno. Revelou maturidade e confiança ao fazê-lo, contra a opinião de Rui Rio. Da disputa interna poderão sair um conjunto de ideias bem maturadas sobre o futuro da sociedade portuguesa, muito estruturadas em torno dos princípios da igualdade de oportunidades e do elevador social.

A análise da situação portuguesa impõe uma postura capaz de seduzir as classes médias e o eleitorado popular, de captar o voto jovem (que tão maltratado tem sido) e de reunir as elites intelectuais e culturais. As questões relativas à identidade nacional e europeia, à segurança (no duplo sentido de segurança pública e de segurança económica), à melhoria drástica do sistema de saúde e ao ambiente devem aparecer na campanha, em conjunto com o anúncio de medidas ousadas no plano social.

Ora a questão da falta de tempo de Paulo Rangel para se afirmar, caso venha a ganhar a disputa interna a Rui Rio, pode revelar-se uma falsa questão, na medida em que tem a matéria estudada e pode afirmar-se muito rapidamente. Para já impõe-se pôr em marcha o próprio PSD, saído de um período de longa letargia, sob a condução zombie de Rio (apesar da vontade que este tem recentemente mostrado de sair desse estado). Depois uma campanha rápida não é incompatível com uma ascensão rápida das intenções de voto no PSD, porque a opinião pública, fatigada de “geringonça” e de falsas soluções quotidianamente debitadas pelo Governo e os seus aliados de extrema-esquerda, está à espera de soluções que rompam o ciclo de empobrecimento relativo do país, que estimulem a criação de riqueza e de emprego qualificado e não apenas o facilitismo do puro lançamento do dinheiro (dos contribuintes) sobre os problemas reais do país.

As sondagens, hoje favoráveis ao Partido Socialista, com a sua formidável máquina de propaganda, vão variar em função das perceções e modificações da realidade ao longo da curta campanha para as legislativas. A dinâmica eleitoral e a força do programa apresentado aos eleitores podem revelar um efeito de lassitude da população face ao marasmo vivido e dar lugar a uma reação do corpo coletivo, o eleitorado português.

Paradoxalmente, grande parte dos créditos da solução “geringonça” passaram largamente pela política de taxas de juro negativas e de compra de quantidades imensas de dívida soberana pelo Banco Central Europeu (que estranho o BCE não ter iniciado esta política uns anos mais cedo!), que permitiu folga orçamental desde 2015 e também, paradoxalmente, pela crise da covid-19, com o seu cortejo de dramas e de (in)decisões, que terá favorecido o Governo, deixando a sociedade transitoriamente bloqueada e anestesiada, trazendo atrás de si o tão propalado Plano de Recuperação e Resiliência (em boa hora) concebido pela Comissão Europeia.

Se excluirmos uma minoria intolerante e absolutamente inflexível que alimenta os partidos radicais, com uma afirmação ideológica muito forte, dos dois lados do espectro político, os portugueses gostam de ver governar ao centro e apreciam a estabilidade, quando esta cria também prosperidade e justiça social.

Mobilizar essa esperança, junto de eleitores de esquerda e de direita, e torná-la motor de um verdadeiro e efetivo desenvolvimento económico e social sustentável, é a tarefa urgente do PSD.

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